Rio Grande do Sul

GAMBÁS DA REDENÇÃO

Após denúncia de coletivo, secretaria informa que notificou empresa a retirar gaiolas

Coletivo Preserva Redenção identificou armadilhas para capturar animais silvestres junto ao Refúgio do Lago, na Redenção

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Grupo realizou manifestação, na noite desta quinta-feira (9), contra a captura irregular em curso junto a espaço concedido pela Prefeitura - Fotos: Divulgação Coletivo Preserva Redenção

O Coletivo Preserva Redenção realizou uma manifestação, na noite desta quinta-feira (9), para denunciar a captura de animais silvestres no Parque da Redenção, em Porto Alegre. Membros do grupo identificaram armadilhas para gambás e mãos peladas instaladas próximas ao Complexo Refúgio do Lago, espaço gastronômico concedido pela Prefeitura em 2022. Após a denúncia, a Secretaria do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade de Porto Alegre (Smamus) notificou a empresa a retirar as armadilhas. 

Moradora do bairro e integrante do coletivo, Lacyta Trizotto Maia participou da manifestação. Ela conta que o grupo identificou as gaiolas na manhã da quinta-feira e então se reuniu para ir até o local, com faixas e cartazes. “Nós fomos lá dentro onde tinha uma das gaiolas, logo duas foram recolhidas e a gente conversou com o gerente para ver o que estava ocorrendo. Lembrando que o espaço é ambiente dos animais”, relata.

Lacyta afirma que o grupo indagou se havia um laudo, e não havia nenhuma documentação. Segundo ela, o coletivo cobra pela fiscalização às concessões que ocorrem dentro da Redenção. “Retirar um animal silvestre do parque não é bem assim. Cachorro e gato é uma situação, gambás é outra. Gambá é um predador de escorpião, é imprescindível que eles estejam na natureza.”

Segundo a ativista, após a conversa, as gaiolas foram retiradas. O coletivo também acionou a Smamus e agora estuda quais providências serão tomadas. “É necessário apurar os fatos. Essa ação foi de livre e espontânea vontade decisão do local? Tem autorização para fazer isso? Porque é crime ambiental e, se é crime ambiental, é nível federal”, assinala.


"Retirar um animal silvestre do parque não é bem assim. Gambá é um predador de escorpião, é imprescindível que eles estejam na natureza", ressalta a ativista / Foto: Divulgação Coletivo Preserva Redenção

Mais cedo, durante o dia, membros do coletivo constataram que a captura estava sob responsabilidade de uma empresa de dedetização e que os animais seriam levados para outra localidade. Para a bióloga e Mestre em Biologia Animal pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Hosana Piccardi, tal situação jamais deveria ocorrer. Segundo ela, é necessária a presença de um biólogo responsável e, de forma alguma, os animais podem ser destinados à soltura um lugar qualquer. 

“Os locais de soltura cadastrados no município, que é a esfera da Redenção, é a toca dos bichos. Eles não podem ficar manejando, circulando com os animais silvestres. Tem que ter uma autorização, inclusive de transporte”, enfatiza a bióloga que tem experiência tanto quando solicitante de autorização quanto no poder público, enquanto ex-funcionária da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do RS (Sema).

Smamus notificou empresa

A reportagem do Brasil de Fato RS contatou a Smamus, na manhã desta sexta-feira (10), a fim de saber quais providências seriam tomadas. Como resposta, a secretaria informa que notificou o Complexo Refúgio do Lago quanto à colocação de gaiolas para captura de animais silvestres. Segundo o órgão, o estabelecimento prontamente se prontificou a retirar os equipamentos. 

A Smamus afirma ainda que orientou para que os restaurantes mantenham bem fechadas as lixeiras para que os animais não se aproximem em busca de comida. Também reforça a importância e a necessidade de preservação da fauna e flora das áreas verdes de Capital, como forma de garantir o equilíbrio dos ecossistemas locais. 

“Quanto aos animais silvestres, os gambás têm hábitos noturnos, vivem em árvores e têm ampla variação nas escolhas alimentares. Eles comem frutas, folhas, raízes, insetos, larvas, ovos e até pequenos roedores e mamíferos”, diz a nota. "O manejo de animais silvestres é proibido, conforme Art. 29 da Lei 9605/98", complementa.

O que diz o Refúgio do Lago

A reportagem do Brasil de Fato RS tentou contato com a empresa que venceu a concessão do espaço no Parque da Redenção, antes do fechamento desta matéria. No domingo  (12), após estabelecido o contato, Pedro Santarem, um dos sócios do Refúgio do Lago, disse que o estabelecimento recebeu o coletivo e de pronto retirou as gaiolas e buscou mais conhecimento. Conta que os animais estavam entrando nas operações do espaço e "por um erro e ingenuidade" contrataram uma empresa para remover os animais da parte interna.

"A medida de deslocamento dos animais silvestres se deu através de uma boa intenção de não haver contato com as operações, com crianças e pets, que frequentam aquela área do parque. Mas assim que fomos notificados, buscamos mais orientações e conhecimento sobre o caso, junto a prefeitura. Pedimos desculpas pelo transtorno, mas nunca capturamos, tivemos contato ou tivemos a intenção de fazer mal a qualquer tipo de vida animal", afirma.


Foto: Divulgação Coletivo Preserva Redenção

"Um verdadeiro crime contra a cidade"

Vereador de Porto Alegre pelo Partido dos Trabalhadores, Jonas Reis disse que após receber a denúncia foi até o local averiguar. “Perguntamos aos comerciantes das imediações, concessionários da nova região de comércio do lago e, para nossa surpresa não foi apresentado nenhum documento autorizando a colocar gaiolas”, conta.

Reis considera o fato “um verdadeiro crime contra a cidade” e avalia que “outro crime é o governo de Sebastião Melo negligenciar”, criticando a falta de fiscalização sobre empresas que ganham as concessões públicas. “Como um parque do tamanho da Redenção, que tem a administração da Secretaria do Meio Ambiente, não faz vistoria, averiguação de como os concessionários estão se comportando dentro do parque?”, questiona o parlamentar. 

Jonas diz que a situação o deixou preocupado pois um restaurante em Santa Catarina havia sido autuado por vender carne de gambá. De acordo com ele, o episódio denunciado na Capital fez ele se perguntar se não seria a mesma situação do estado vizinho. “Ninguém falou o que fariam com os animais se eles fossem capturados. Pior de tudo, nós ficamos preocupados que pudesse existir veneno no processo de tentativa de captura.” 

Enfatiza que os gambás na região urbana ajudam a combater insetos peçonhentos, como escorpião. “É um desrespeito enorme com o meio ambiente. Não vamos nos calar, já acionamos algumas autoridades, vamos acionar via Ministério Público para que os gestores sejam responsabilizados”, afirma. 
 
Além do vereador Jonas, o deputado estadual Leonel Radde (PT) também se manifestou sobre a captura irregular, através de suas redes sociais. “Avança a privatização da Redenção em Porto Alegre e seguem os ataques ao meio ambiente e aos animais! Estabelecimento comercial, instalado onde antes era um orquidário (!!!), agora coloca armadilhas para gambás! Mais um atentado à natureza!”, escreveu.

Sobre os animais silvestres

O Parque da Redenção é lar de gambás, animais que não são considerados perigosos, mas que quando se sentem ameaçados podem rosnar, emitir um odor ou usar a técnica de tanatose (se fingir de morto). São animais silvestres, mamíferos, com dieta onívora (consomem qualquer tipo de alimento) e tem um importante papel ecológico, como por exemplo, dispersão de sementes e controle da população de outros animais: insetos, escorpiões, cobras, carrapatos. São protegidos por lei e qualquer pessoa que infrinja a legislação pode ser responsabilizada.


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Edição: Katia Marko