Paraná

Economia Solidária

Madalena dos Santos e a marcha incansável por outro mundo

Liderança faxinalense leva consigo, em todos os passos, a luta por uma forma de vida mais livre

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
“Tem coisas que já vêm dentro da gente. Quem é de verdade, veste a camisa”
“Tem coisas que já vêm dentro da gente. Quem é de verdade, veste a camisa” - Franciele Petry Schramm

- Você não conhece a Mada? É a de camisa vermelha – aponta um conhecido. – Ela é famosa por aqui.

Madalena dos Santos está sentada em meio a uma ampla roda na sede do Centro Comunitário e de Produção Alimentar Padre Miguel (Cecopam). A conversa coletiva gira em torno da economia solidária, ali praticada por meio do Clubão de Trocas, iniciativa de que Madalena faz parte e na qual acredita como força de transformação social. O clube busca promover uma atividade econômica alternativa à das grandes empresas, praticando valores como a solidariedade, a cooperação e a inteligência coletiva.

É fim de tarde no bairro Xaxim e frestas de sol aquecem e iluminam o salão. Madalena se levanta e abre um largo sorriso antes de perguntar às pessoas em volta: “Qual foi o maior presente que a gente ganhou hoje?”. Alguns participantes arriscam uma resposta e ela as complementa com sua opinião: “O dia. Fez sol, nossas crianças brincaram e nós estivemos juntos. Foi um dia maravilhoso”.

Comunidades faxinalenses

Aos poucos, o motivo da fama de Madalena fica mais claro: é notória entre os movimentos sociais sua incansável luta pela economia solidária e por formas de existência independentes do grande sistema do capital. Moradora de uma comunidade faxinalense próxima de Mandirituba, na região metropolitana de Curitiba, leva como missão de vida a tarefa de ajudar a quem precisa.

Os faxinais são formas de vida típicas do Paraná que se caracterizam pela criação solta de animais, por menos cercas entre os vizinhos e mais preservação na natureza. A única delimitação permitida circula o perímetro das residências individuais e os chamados mata-burros, ou seja, estrados feitos de madeira espaçada sobre valas, que impedem a passagem dos animais. A ideia é evitar que o gado e os cavalos fujam da propriedade ou caminhem até muito longe.

Madalena comenta, com indignação, um dos maiores problemas enfrentados pela comunidade: pessoas de fora que compram terrenos nas proximidades e não respeitam a tradição desses povos. Os faxinalenses acertam acordos comunitários para delimitar a extensão da terra que será cercada, dentro de uma ideologia mais coletiva da existência. “Se, por exemplo, definimos que só 40% do território pode ser cercado, isso se torna um contrato coletivo”, explica. “Mas os poderosos da região não aceitam que temos nossa cultura, compram suas chácaras para se divertir no fim de semana e cravam cercas onde não é permitido, e isso interfere em nosso modo de vida”.

Por algum tempo, Madalena chegou a articular um grupo chamado “vento da meia noite”, que derrubava as cercas na madrugada. “Mas comprei briga pela comunidade e me envolvi em confusão das sérias. Tivemos que parar”, lamenta.

Quando a causa é a própria vida

Entre os faxinalenses, já foi Agente de Desenvolvimento Brasil Local, quando recebia uma ajuda de custo para liderar iniciativas para a população da comunidade. Também exerceu a tarefa de educadora popular, influenciada por Paulo Freire. “No clubão de trocas, por exemplo, a comunidade foge um pouco dessa coisa do dinheiro”, cita. Pela criação de animais, os faxinalenses dispõem de produtos como ovos, torresmo e banha de porco, que trocam por roupas, utensílios e outros artigos de que necessitam.

Durante a semana, a Mada comercializa suas produções artesanais em uma feira em Curitiba. “Tive contato com muitas comunidades tradicionais e aprendi a fazer artesanato com povos indígenas, com benzedeiras, com cipozeiras, com a umbanda. Hoje, o que eu faço é resultado de toda essa mistura”, orgulha-se. Nas mãos, carrega um anel de tucum de fabricação própria. No peito, carrega o sonho de transformar a nossa forma de vida por meio da economia solidária. “Não faço isso nada pra me engrandecer. Tem coisas que já vêm dentro da gente. Quem é de verdade, veste a camisa”, defende.

Edição: Ednubia Ghisi