Sabatina

Na Câmara, ministro da Educação diz que Brasil "gasta demais" com ensino

Convocado para tratar do corte orçamentário nas universidades, Abraham Weintraub é alvo de críticas de diferentes lados

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Deputados de oposição protestam com cartazes durante fala de ministro da Educação no plenário da Câmara
Deputados de oposição protestam com cartazes durante fala de ministro da Educação no plenário da Câmara - FotoLuis Macedo/Câmara dos Deputados

Foi sob alta tensão que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, prestou esclarecimentos, nesta quarta-feira (15), no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), a respeito do corte orçamentário de 30% na verba das universidades e dos institutos federais.

Em meio à crise política que circunda a gestão da pasta, o ministro foi fortemente criticado por parlamentares de diferentes partidos, como PT, Psol, PDT, PP, PCdoB, PSB, entre outros. Em um dos momentos mais polêmicos da sabatina, ele afirmou que o Brasil "gasta demais" com a educação.

Weintraub é o centro dos debates de uma comissão geral, espécie de grande audiência pública, que ocorre desde as 15 horas. Em seu discurso inicial, ele repetiu o roteiro apresentado no último dia 7 na Comissão de Educação do Senado, quando foi convidado para falar sobre diretrizes e programas prioritários da pasta.   

O ministro destacou, mais uma vez, que o governo teria como prioridade os ensinos básico, fundamental e técnico. "Não estou querendo diminuir o ensino superior. O que a gente propõe? Cumprir o plano de governo que foi apresentado. Prioridade é ensino básico, fundamental, técnico", afirmou.   

Apesar das críticas feitas nas últimas semanas ao ensino superior, ele disse que esse é um segmento em que o país "está, entre aspas, bem”.

A deputada Margarida Salomão (PT-MG) disse que o governo “comete um erro” ao criar um “antagonismo” entre educação superior e os demais níveis educacionais.

“O Brasil conta com uma legislação que trata a educação como política de Estado. Desde a Constituição Federal de 1988, a LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional], o PNE [Plano Nacional de educação] tratam a educação de uma forma integrada, e o senhor, na verdade, não privilegia ninguém no seu corte”, criticou a petista, acrescentando que a tesoura do governo atingiu também a educação infantil e os demais segmentos.  

A deputada contrapôs ainda a afirmação de que o país gastaria excessivamente com educação: “O Brasil estaria gastando 7% [do PIB] se estivesse cumprindo o PNE, o que hoje é impossível por causa da Emenda 95 [Teto dos Gastos]. Estamos gastando 5,5%”, rebateu.  

Weintraub também enalteceu a Política Nacional de Alfabetização (PNA), instituída por meio de um decreto assinado por Bolsonaro em abril deste ano, afirmando que o governo federal pretende auxiliar estados e municípios no desenvolvimento da área. “A gente quer dar as orientações, os recursos e o acompanhamento”, disse.  

“Esta sessão não tem como objetivo conhecer o plano de governo apresentado pelo candidato a presidente da República. Esta sessão não tem como objetivo conhecer o PNE, suas metas e a sua evolução como período”, rebateu o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), acrescentando que o ministro não teria conseguido justificar o corte de verbas nas universidades.

Ensino privado

Economista de formação e com trajetória profissional voltada para o mercado financeiro, Abraham Weintraub voltou a enaltecer o ensino privado. Novamente, negou a expansão no ensino público superior na história recente do país e disse que o crescimento nas instituições de ensino superior (IES) teria se dado por conta das faculdades particulares. “O sonho das pessoas é colocar os filhos na educação privada, não na pública”, completou adiante.   

Ainda segundo ele, o “insucesso escolar ao final do ciclo de alfabetização” seria um problema concentrado na rede pública de ensino. Ele disse que a escola privada “tem muito mais sucesso”.  

Com uma postura defensiva, Weintraub afirmou também que o governo não seria responsável pelo atual bloqueio de verbas, que ele creditou às políticas de ajuste fiscal dos governos Dilma (2011-2016) e Temer (2016-2018), e voltou a negar o corte orçamentário, afirmando que a gestão estaria “obedecendo à lei”. O discurso foi endossado também por membros do PSL e outros apoiadores, como o deputado Darcísio Perondi (MDB-RS), que defendeu a política de arrocho sobre a educação e disse que seria somente uma “suspensão de despesa”. 

Ofensiva

Outro destaque da participação do ministro foi a afirmação de que o governo busca uma “rede federal de ensino sem ideologias”. Na sequência, ele voltou a dizer que a produção científica brasileira seria concentrada “em áreas que não geram produção científica”, o que foi, mais uma vez, interpretado como parte da ofensiva governista contra os cursos da área de Humanas.

O líder da bancada do PSB na Câmara, Tadeu Alencar (PSB-PE), afirmou que o governo patrocina uma “cruzada humana contra a filosofia e as ciências sociais” e que a gestão Bolsonaro representa “um conjunto de trapalhadas e equívocos monumentais”.

Outro ponto de tensão se deu quando o ministro foi provocado por Orlando Silva a respeito do posicionamento em defesa da presença de policiais militares nas universidades federais. “Universidade não é lugar de polícia, e sim de liberdade, de pensamento crítico”, exclamou o parlamentar.  

Weintraub fez esse tipo de manifestação em diferentes momentos, como na terça-feira (14), durante um café com a imprensa. Nesta quarta, na Câmara, ele voltou a sustentar o posicionamento: “Autonomia universitária não é soberania. As universidades têm que respeitar as leis e, se preciso, [a polícia] tem que entrar, sim, nas universidades”, disse, sob a reprovação dos opositores.   

“Muito fraco”

O líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), classificou o desempenho de Weintraub na audiência como “muito fraco”.

“Evidentemente, ele não tem preparo, não tem formação pra responder às questões da área. Não é uma pessoa que entenda de educação, portanto, foi alocado ali porque foi a pessoa que o presidente da República achou mais fácil, mas que está longe de atingir os requisitos mínimos pra um ministro da Educação”, avaliou.

O líder também considera que a conduta de Weintraub na comissão geral tende a agravar a situação política do Planalto.

“Ele vai sair daqui mais fraco do que entrou. A própria convocação dele já foi uma demonstração de fraqueza, de fragilidade do governo, e esse desempenho vai contribuir pra uma piora”, acredita o pessebista.

Convocação

Abraham Weintraub foi convocado para comparecer à Casa após a aprovação de um requerimento, na terça (14), cujo placar terminou com 307 votos a favor e 82 contra, em mais uma derrota do governo no parlamento. Somente o PSL – partido de Bolsonaro – e o Novo orientaram os deputados da base a rejeitarem o pedido.

Na ocasião, com receio de um desgaste ainda maior na pasta, o líder do governo na Casa, Major Vitor Hugo (PSL-GO), argumentou que Weintraub já tinha agenda na Comissão de Educação da Câmara nesta quarta pela manhã e por isso a convocação seria desnecessária.  O posicionamento, no entanto, foi vencido pelas demais legendas.       

Esta é a primeira vez que um ministro do governo Bolsonaro é convocado para ir ao Congresso e também ao plenário, e não para comissões legislativas. Nesse caso, o não comparecimento caracterizaria crime de responsabilidade por parte do gestor. As demais vindas registradas até o momento haviam se dado por meio de convite. Por conta disso, a aprovação do requerimento de convocação é interpretada como um sinal de fragilidade do governo no Legislativo.

Apoiado fortemente pela oposição, o pedido se alinha à paralisação nacional e aos protestos que ocorrem nesta quarta no país em defesa da educação pública e contra o bloqueio de verbas.  

Do ponto de vista político, a aprovação do requerimento tem como pano de fundo também o jogo de forças entre deputados do chamado “centrão”, grupo que aglutina diferentes partidos da tradicional direita liberal, e o governo.  

Com dificuldades orgânicas de articulação política e sem conseguir compor uma base oficial de apoiadores no Congresso, o Planalto ainda escorrega na relação com lideranças da Câmara e é alvo de insatisfação de siglas do centrão, que tentam, nos bastidores, acordos por meio de liberação de emendas e cargos para aliados no Poder Executivo.

 

Edição: Rodrigo Chagas