Coronavírus

Calamidade pública é aceita pela Câmara; oposição pede devolução de R$ 21 bi ao SUS

Medida foi aprovada na quarta-feira (18) na Câmara e terá execução acompanhada por deputados e senadores

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Parlamentares de oposição durante negociação com governistas na votação do PDL 88/2020 - Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Diante da aprovação pelo plenário da Câmara dos Deputados do projeto que reconhece estado de calamidade pública no país por conta do coronavírus, parlamentares de oposição reforçaram o coro pela canalização de recursos expressivos para o Sistema Único de Saúde (SUS). O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), por exemplo, defende que o governo priorize a atenção às políticas públicas voltadas à rede de atendimento e aos seus profissionais.  

“Defendemos que se coloquem R$ 21 bilhões no SUS pra contratação das equipes de Saúde na Família, pro fortalecimento do Mais Médicos, pra testagem da população, pra organização de leitos de UTI, pra compra de máscaras, gel, álcool, enfim, pra garantir que o SUS, público, que é um privilégio deste país, possa dar conta dessa epidemia”, afirmou, durante a votação da medida, na quarta-feira (18).

Tecnicamente, o texto aprovado pelos parlamentares é o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 88/2020, que reconhece oficialmente o estado de calamidade descrito na Mensagem Presidencial 93/2020, enviada por Jair Bolsonaro (sem partido) ao Legislativo na mesma data.

A mensagem desobriga o governo de atingir os resultados fiscais previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e também de seguir à risca os limites determinados pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que impõe controle de gastos para os entes federativos.

Alternativas às metas fiscais

Relator da proposta, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) destacou que o objetivo é garantir que, diante da crise, o governo “tenha alternativas às metas fiscais”. Além da política de arrocho fiscal que vem sendo implementada pela gestão Bolsonaro por meio da agenda neoliberal dele e do ministro da Economia, Paulo Guedes, o país está hoje sob a batuta do Teto de Gastos, aprovado no governo Temer (2016-2018). A medida prevê uma rígida limitação de despesas para as áreas sociais até o ano de 2037 e ajuda a dificultar o contexto da crise agravada pelo coronavírus.

“Com o decreto, ele [o governo] vai poder ter condições orçamentárias e financeiras para fortalecer o SUS, que é o principal instrumento para combater a expansão da epidemia, e adotar medidas no campo econômico pra garantir uma renda mínima universal para a população brasileira, de modo a permitir o confinamento e as outras medidas orientadas pelo Ministério da Saúde para impedir a propagação sem controle desse vírus”, afirmou o relator.

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O texto foi aprovado após acordo com a oposição e também com o vice-presidente do Senado, Antonio Anastasia (PSDB-MG), onde a medida será avaliada agora. De acordo com Orlando Silva, a costura entre atores políticos de diferentes tendências ideológicas se deu por conta da gravidade do problema causado pelo coronavírus e da necessidade de uma rápida aprovação da proposta, que será votada pelo plenário do Senado por meio de uma sessão remota nesta sexta-feira (20).

No processo de negociação, o relator acatou uma sugestão feita pelo líder da bancada do PSB, Alessandro Molon (PSB-RJ), que pediu alteração de um trecho do PDL que estaria com uma lacuna jurídica. O deputado apontou que o texto não deixava claro que a calamidade pública a que se refere o projeto não se tratava da mesma “calamidade natural”, prevista no artigo 136 da Constituição Federal.

Esta última possibilita ao chefe do Executivo decretar, por exemplo, “estado de defesa” sem necessidade de autorização legislativa. Em casos assim, o presidente da República pode baixar medidas de exceção quando considerar que é preciso “preservar ou prontamente restabelecer a ordem pública ou a paz social”.

No acordo costurado entre os deputados, o relator incluiu o termo “exclusivamente” no trecho que se referia à necessidade do estado de calamidade pública.

“Infelizmente, sabendo o presidente que temos, com suas tendências autoritárias, ficamos com a preocupação de que, posteriormente, ele pudesse tentar interpretar essa decretação de calamidade para fins fiscais como aquela do artigo 136 e, portanto, baixar medidas autoritárias”, disse Molon ao Brasil de Fato.

Infelizmente, sabendo o presidente que temos, com suas tendências autoritárias, ficamos com a preocupação de que, posteriormente, ele pudesse tentar interpretar essa decretação de calamidade para fins fiscais como aquela do artigo 136 e, portanto, baixar medidas autoritárias.

Comissão

Com a aprovação, será criada uma comissão mista, composta por seis deputados e seis senadores, para acompanhar o andamento da situação fiscal e a execução das verbas manobradas pelo governo. Como de costume no Legislativo, o colegiado também contará com suplentes na mesma quantidade.

“Interessa-nos que a sociedade brasileira, que a população brasileira possa acompanhar com a máxima transparência cada centavo que vai ser disponibilizado para o investimento em medidas de combate ao coronavírus. Fazendo uma alegoria, não se trata de um cheque em branco, mas de um crédito sem limites que o governo terá para adotar todas as medidas necessárias para nós vencermos a guerra contra o coronavírus”, afirma o relator, Orlando Silva.

Não se trata de um cheque em branco, mas de um crédito sem limites que o governo terá para adotar todas as medidas necessárias para nós vencermos a guerra contra o coronavírus.

Edição: Rodrigo Chagas