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Consórcio Nordeste

Governos do Nordeste reagem a pronunciamento de Bolsonaro

Em rede nacional, nesta terça (24), presidente atacou governos estaduais e pediu retorno à "normalidade"

Brasil de Fato | Recife (PE) |
consórcio do nordeste
Consórcio é formado por governadores de Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe - Agência Nordeste

Após o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro em rede nacional de rádio e televisão, na noite desta terça-feira (24), sem anunciar novas medidas sanitárias, econômicas ou políticas para lidar com a crise, mas unicamente atacando medidas dos governos estaduais e pedindo retorno às atividades, os secretários de saúde dos nove estados da região Nordeste publicaram carta criticando a postura do presidente. Governadores também divulgaram carta e usaram as redes sociais para reagir.

Na carta divulgada pelos secretários de saúde do Nordeste, publicada já próximo à meia-noite da terça (24), poucas horas após o pronunciamento, eles se dizem "estarrecidos" com o pronunciamento do presidente e avaliam que este "desfaz todo o esforço e nega as recomendações para o combate à pandemia". A carta, por outro lado, busca reduzir o impacto na relação com o ministro Luiz Henrique Mandetta, afirmando que as declarações de Bolsonaro não condizem com as orientações do próprio Ministério da Saúde. "Esta fala atrapalha não só o ministro, mas todos nós", diz.

Os secretários não reduzem a importância de se pensar medidas que reduzam impactos econômicos desta crise. "Sabemos que iremos enfrentar  uma grave recessão econômica, mas o que nos cabe lidar diretamente é a grave crise sanitária", afirma o documento. "Vamos seguir tocando nossas vidas com decisões baseadas em evidências científicas, seguindo exemplos bem sucedidos ao redor do mundo", conclui, reforçando um pedido para que as pessoas fiquem em casa.

Nesta quarta-feira (25) uma nova carta foi divulgada pelo Consórcio Nordeste, desta vez assinada pelos nove governadores. O documento reafirma que os estados nordestinos continuarão adotando medidas preventivas e baseadas no que afirma a ciência e pede medidas econômicas para atenuar o impacto da crise na vida dos mais pobres.. "A decisão prioritária é a de cuidar da vida das pessoas. (...) Entendemos que cabe ao Governo Federal ação urgente voltada aos trabalhadores informais e autônomos". A carta também coloca como "urgente" que haja uma "coordenação e cooperação nacional para proteger os empregos e a sobrevivência dos mais pobres".

Mas a postura de Bolsonaro na noite da terça (24) não foi ignorada no documento. Muitos trechos fazem referência ao pronunciamento. "Acirramentos só farão prejudicar a gestão da crise", diz um trecho. "Agressões e brigas não salvarão o país. O Brasil precisa de responsabilidade e serenidade para encontrar soluções equilibradas", pontua noutro momento, em claro rechaço ao presidente. A carta é finalizada com nova crítica. "Ficamos frustrados com o posicionamento agressivo da Presidência da República, que deveria exercer o seu papel de liderança e coalizão em nome do Brasil", encerra.

Antes, os governadores já haviam usado suas redes sociais para rebater Bolsonaro. O pernambucano Paulo Câmara (PSB) afirmou que o discurso "lamentavelmente comprova que o Brasil está sem comando num dos momentos mais desafiadores de sua história". A chefe do Executivo do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), classificou o pronunciamento como "equívoco". "A pandemia acontece em nível mundial e é impossível ser ignorada. (...) Vamos continuar seguindo todas as medidas". O cearense Camilo Santana (PT) declarou que "este não é um momento para ataques e provocações, mas de cooperação e união de todos. (...) A vida de vocês está em primeiro lugar".

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), criticou diretamente Bolsonaro. "O pronunciamento mostra que há poucas esperanças de que Bolsonaro possa exercer com responsabilidade e eficiência a Presidência da República", disse. Rui Costa (PT), governador da Bahia, declarou "compromisso com o povo do meu estado de não baixar a guarda" e se disse solidário a todos os estados do Nordeste e do Brasil, "que Deus nos dê equilíbrio e força". O piauiense Wellington Dias (PT), mencionou as pessoas que têm passado semanas internadas em UTIs e que isso não se dá por "gripezinha". "Sei que haverá prejuízos de bens materiais, prejuízos de negócios e na renda, mas em primeiro lugar deve estar a vida. No Piauí a vida humana tem valor. Vamos seguir com a ciência", afirmou Dias.

O paraibano João Azevedo (CD) afirmou que "todas as medidas visando a proteção da população do nosso estado continuarão sendo implantadas". Renan Filho (MDB), de Alagoas, disse que "apesar do pronunciamento do presidente, manteremos com firmeza e serenidade nossas ações" e completou que "a vida de cada alagoano é e sempre será o bem mais precioso". O governador sergipano Belivaldo Chagas (PSD) não se pronunciou publicamente sobre o tema.

Coronavírus, Bolsonaro e o Nordeste
Desde o início de seu governo, em 2019, Bolsonaro não fez questão de esconder a antipatia pelos governadores dos estados nordestinos. A região, além de dar ampla votação (em torno de 70%) para o presidenciável Fernando Haddad (PT), também elegeu nove governadores de oposição ao bolsonarismo. Os ataques - verbais e governamentais - por parte de Bolsonaro não foram raros. E em meio à crise do covid-19 não seria diferente.

Em meio à crise econômica e sanitária atravessada pelo país, Jair Bolsonaro decidiu cortar benefícios de 158 mil famílias cadastradas no programa Bolsa Família - que paga de R$55 a R$220 mensais para famílias em situação de extrema pobreza (vivem com até R$89 per capita mensais). Das famílias excluídas por Bolsonaro, 61% (ou 96 mil) são da região Nordeste.

Os governos estaduais do Nordeste pediram ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão dos cortes na região, pedido acatado (temporariamente) pelo ministro do STF Marco Aurélio Melo, nesta segunda (23). Por outro lado, na mesma segunda, Bolsonaro se reuniu por videoconferência com os governadores e aprovou uma ajuda de R$8 bilhões a serem divididos entre os sistemas de saúde dos estados brasileiros, dos quais 77% são destinados ao Norte e Nordeste.

Edição: Marcos Barbosa