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Artigo | Vidas negras importam! Para quem?

Foi preciso morrer um homem negro nos EUA para que brasileiro desse atenção aos dados do mapa da violência

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
"Não haverá ambiente para a conquista da justiça social, enquanto o racismo não for definitivamente vencido" - Mídia Ninja

O brasileiro tem uma forma bastante peculiar para discutir a questão do racismo. Para muitos, essa descoberta aconteceu em alguns momentos deste 2020, uma delas foi por meio do Big Brother, e recentemente precisou morrer um homem negro lá nos Estados Unidos.  Na percepção de uma pessoa com a mente sã, tudo isso parece bastante bizarro, se tratando de um país em que 56% da população é formada por pretos e pardos. Esse é o percentual de pessoas que se declaram negras no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do IBGE.

Para tratar deste problema na base, o espaço ideal para discutir o racismo, seus desdobramentos e formas de superação deveria ser o ambiente escolar. Existe até legislação para isso, basta apenas ser cumprida. A Lei 10.639, que completou 17 anos em janeiro, entrou em vigor com o objetivo de promover uma importante mudança de perspectiva na educação do país, por meio da obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileira e africana.

Se a discussão sobre o racismo não é feita em casa e nem nas escolas, o que resta são os veículos de comunicação de massa, onde a maioria da população tem acesso, isso explica o papel didático do Big Brother. Mesmo assim, um problema sério a ser tratado no Brasil, diz respeito à comoção seletiva. Por que foi preciso morrer um homem negro nos Estados Unidos, para que brasileiro fosse dar atenção aos dados do mapa da violência? Os dados publicados em 2017, demonstram que a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado. De cada 100 pessoas assassinadas, 71 são negras no Brasil.

Sem dúvida o Brasil está entre os países mais racistas do mundo. A negação do racismo, faz adiar ainda mais o entendimento sobre a necessidade de aprofundar as discussões sobre este fato. Durante décadas, vende-se o discurso de democracia racial, a miscigenação que é resultado do estupro de mulheres negras e indígenas, é romantizada o tempo todo.

A falta do debate racial causa enormes confusões, como citar o movimento negro no singular, como uma corrente de negras e negros com uma única linha de pensamento e de ação. Os movimentos são vários, as pautas e formas de luta são diversificadas.

O fato de ser o país mais miscigenado do mundo, traz ainda como agravante a questão da identidade. Temos um problema sério de afirmação da identidade, que precisa ser resolvido. O racismo não pode ser tratado como uma pauta exclusiva dos movimentos sociais negros, é uma pauta de responsabilidade do conjunto da sociedade brasileira.

Não haverá ambiente para a conquista da justiça social, enquanto o racismo não for definitivamente vencido.

Rafael Aquino é cientista político.

Edição: Elis Almeida