Rio Grande do Sul

RESPIRE

Poesia | Não nos percamos

"Lute como um guerreira! Encarne as mandingas! Banhe-se de patuá! E permita que seus ancestrais falem aos seu poros..."

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"Tanto quanto grande é a opressão tanto quanto grande é minha voz e a minha pulsação!" - Ilustração e design: @carlosandrebp

Me pediram um poema ontem...
Logo eu?
Que preciso buscar letras soltas no mundo em quarentena...
Elas soltas pra que dancem juntas entre si e comigo em quarentena.
E por sorte e fé busco-as dentro de mim também.
CALADA.
E em sentimento de gestação, de gestação as vejo brotarem no meu útero fértil da vida sagrada...
Preciso fazer esse poema e entregar urgente.
Queria tanto fazê-lo...
Nem que fosse pra eu não ler...
Nem me importo desde que nasça...
Desde que saia do meu ventre ou de um lugar + profundo, inominável.
INOMINÁVEL.
Queria tanto fazer um poema pra vc ler.
SIM pra vc ler todos os dias, poemas novos meus...
Uma Ode à vida!
Ler-te-ei como fazem os povos originários sejam daqui ou os povos Roni ou os Bereberes...
Naquela vasta imensidão do deserto, quão árido, tanto quanto amor e poético sem quarentena.
Livre de tudo e todxs.
Somos todos da mesma natureza intrínseca...
Não consigo tocar vc, beijar vc, abraçar vc.
Vida não posso + vê-la tão sensível assim dentro de mim, fora de mim, dentro de ti, fora de ti... FRÁGIL.
Por isso queria tanto fazer um poema pra vc ler que o amor existe
E mesmo triste...
Hei de continuar até morrer...
Vou respirar.
Preciso respirar.
Da linhagem das Geledés
Candaces
Mahins
Malês
Zulus
Odomode
Odara
África negra
Não ocidentalizada!
Não ocidentalizada!
Não colonizadora!
Não genocida!
Não misógina!
Não machista!
Não racista!
Queria fazer poemas pra Yemoja Ogunte!
Me abraçar no mar.
Escrever-te-ei em Suarile pra vc traduzir e assim comigo ficar + tempo!
São tantos povos, tantas gentes e tantas outras emoções...
Tanto quanto grande é a opressão tanto quanto grande é minha voz e a minha pulsação!
Bate
Bate
Bate
Coração
Eoooo
Eoooo
Eu vou parir todos os dias letras nem que sejam amiúdes...
Saibam todos que quando nascem minhas minha poesias não são + minha...
São do mundo.
Minha poesia é fruto contido da humanidade outrora dentro de mim...
Que em formas de letras catadas aqui, ali e acolá
Se transformam em algo legível para que a humanidade me leia.
Quero que a humanidade me leia.
Rasga minha alma
E em lágrimas
Em lágrimas
Somente eu sei quantos rios eu já pari e desaguei...
E em lágrimas
Em lágrimas expressam muitos mais do que um canto, uma música, uma dança...
Expressam muito +
Até a bailarina precisa da poesia para fazer o Orfeu Negro.
Todo mundo tem só a bailarina que não tem
Basquiat usou da poesia para grafitar os muros franceses e ser visto internacionalmente... Reconhecido foi e depois de tudo, de tudo também precisou da poesia pra se suicidar...
Eu não irei me suicidar!
Posso me afogar no alfabeto mas não me mato...
A poesia me salva de mim mesma...
Sem ela eu já teria partido...
Ela me dá a dimensão do brilho da vida e da sombra da morte.
Eu preciso passar pela poesia...
Dançar e enamorar-me...
De mim para mim.
Ela é meu anticorpo...
Com ela novamente respiro melhor e deveras vejo a vida com outros olhares...
Com olhos que riem e saltitam a procura de reconexão sem corre-DOR.
É um casamento necessário urgente e sem protocolo.
Ela me ama porque precisa de mim...
Eu preciso dela por isso a amo tanto.
Amo-a incondicionalmente.
É um tórrido amor...
Uma relação simbiótica ...
Quando ela não vem eu sofre muito +
Faço amor de todas as formas, jeitos e maneiras...
Com ela apenas faça amor...
Muito amor!
Amanha, hj e ontem.
O tempo não nos trairá +, JA +.
Então, aos trocadilhos dos tempos e das resposta do que que busco numa ânsia, que se pretende e que sou, lhe profetizo:
Seus prazeres, sussurros, gozos e orgasmos poéticos acontecerão ontem pq somente assim o tempo não será capaz de nos trair.
E hj vc terá seus Amanhãs...
E Amanhã será ontem mais uma vez hoje...
Amanhã se tornará passado...
P.A.S.S.A.D.O com a construção radical da nova humanidade.
Amanha então será lembrado com gratidão...
GRATIDÃO
Porque a nova humanidade está a se refazer no susto da pandemia, nas inseguranças das mortes que assolam as terra mão gentil...
Do medo do estágio do contágio.
Amanhã terás alegrias pelo que viver hoje...
Que seus amanhas, sejam vividos com extrema intensidade hoje.... por sorte e felicidade se tornarão os ontens que poderá relembrar a cada novo amanhecer!
Relembrar a cada novo amanhecer!
Que seu amanhã a cada novo amanhecer seja florido com a beleza do outono.
A cada novo amanhecer.
E somente assim teremos como fazer uma Ode a vida!
Dance comigo como bailarina!
Lute como uma guerreira!
Encarne as mandingas!
Banhe-se de patuá!
E permita que seus ancestrais falem aos seu poros...
Se descolonize!
Não se suicide!
Não se omita!
SE CUIDE
SOBREVIVA
RESPIRE
INSPIRE
TRANSPIRE
RESPIRE
NÃO PIRE!
Não nos percamos
E se eu não fizer poesia o meu peito explode de agonia...
RESPIRE!

 

* Eloá Kátia Coelho é mestranda e Graduanda em Saúde Coletiva UFRGS, cientista Social pela PUC/RS, especialista em Direitos Humanos pela UNIFESP, especialista em Saúde Pública USP. Compõe o Comitê Científico Contra Coronavírus (C4), o Comitê Popular em Defesa do Povo Contra o Coronavírus

 

Edição: Marcelo Ferreira