Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | O Brasil de volta ao Mapa da Fome

A FAO alerta para perspectiva dramática se as políticas sociais e o apoio à agricultura familiar não forem retomados

Brasil de Fato | Porto Alegre |
O estudo foi realizado antes da pandemia, evidenciando que o empobrecimento acelerado da população decorre do modelo econômico adotado nos últimos anos e não dos efeitos da covid-19 - Leonardo de França

O relatório da FAO, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, recentemente divulgado, confirma que o Brasil retorna ao mapa da fome, do qual havia saído em 2014. Os dados fazem parte do informe "O Estado da Segurança Alimentar e Nutricional no Mundo". O mapa da fome inclui os países com mais de 5% da população em pobreza extrema. É importante lembrar que em 2003, a taxa de desnutrição alcançava 10,7% e foi caindo gradativamente até chegar a menos de 5%, dez anos depois. Segundo o escritório do Programa Mundial de Alimentos (PMA), esse percentual chegará a 7% no final do ano, com tendência ao agravamento.

É importante salientar que o estudo da FAO foi realizado antes da pandemia, evidenciando que o empobrecimento acelerado da população decorre do modelo econômico adotado nos últimos anos e não dos efeitos da covid-19. Inclusive, o escritório do PMA ressalta que as consequências do ajuste fiscal e do desmonte da área social ainda não se fizeram sentir em toda a sua extensão.

O levantamento da FAO aponta que, entre 2001 e 2012, a pobreza no Brasil foi reduzida de 24,3% para 8,4%, enquanto a pobreza extrema diminuiu de 14% para 3,5%. Estes dados, que apontavam para um futuro de maior dignidade para os brasileiros, sofrem agora uma drástica reversão. Entre 2014 e 2016, 37 milhões de pessoas viviam em situação de insegurança alimentar moderada. Entre 2017 e 2019, este número aumentou para 43 milhões de pessoas, fruto da redução das políticas públicas e diminuição significativa dos investimentos sociais.

A FAO faz um alerta: se as políticas sociais continuarem a ser deixadas de lado e os programas de apoio à agricultura familiar, responsável pela produção de 70% dos alimentos consumidos no país, não forem retomados, a perspectiva para os próximos anos é dramática.

O que faz o governo atual diante deste quadro? Além da extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário, acabou com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutrição, organismo fundamental para a formulação de políticas públicas para o setor, com participação da sociedade civil. Também o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), pelo qual a alimentação das escolas públicas era adquirida diretamente da agricultura familiar, sofreu redução orçamentária, de uma média de R$ 1,2 bilhão até 2016 para R$ 285 milhões em 2019. Além disso, o governo anuncia uma Medida Provisória que inclui a participação no agronegócio nas vendas em detrimento dos pequenos agricultores.

A indiferença do atual governo em relação ao drama alimentar conduz o Brasil de volta ao mapa da fome, derrubando importantes conquistas sociais obtidas nos últimos 20 anos, e configura a faceta mais perversa do projeto em vigor. Esse será mais um dos componentes maléficos do legado do governo Bolsonaro, o que torna cada vez mais urgente o seu afastamento do cargo e o fim de seu plano econômico que concentra renda, aumenta a pobreza e joga o país no abismo da irresponsabilidade.

* Henrique Fontana é deputado federal (PT-RS)

Edição: Marcelo Ferreira