Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | Um Dia do Estudante como nenhum outro

Em meio à pandemia, os estudantes, que historicamente pautam importantes lutas no Brasil, resistem com solidariedade

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Neste 11 de Agosto, Dia do Estudante, comemora-se o aniversário de 83 anos da União Nacional dos Estudantes - Divulgação

Me gustan los estudiantes
Porque son la levadura
Del pan que saldrá del horno
Con toda su sabrosura

Mercedes Sosa - Qué Vivan Los Estudiantes

 

Desde 1937, ano de fundação da União Nacional dos Estudantes, a UNE, estudantes de todo o Brasil constroem uma organização que não se restringe às pautas corporativas da categoria estudantil (mensalidades, assistência e permanência, investimento na educação, democracia interna para as Instituições de Ensino Superior - IES, etc.), mas compreende a responsabilidade que é cursar o ensino superior em um país que sempre condenou a maioria de seus filhos à pobreza e à falta de oportunidade, à fome e ao analfabetismo.

Nós, estudantes, pautamos a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial para combater a ameaça fascista, conduzimos a campanha “O Petróleo é Nosso” que resultou na fundação da Petrobras, fundamos os Centros Populares de Cultura (CPC’s) e resistimos, mesmo que submetidos a todo tipo de violência, à Ditadura Militar de 1964. Nos anos de chumbo a UNE foi fechada e na sua refundação, em 1979, pautamos a reabertura democrática e a anistia para os presos e exilados políticos. Dissemos “eu quero votar para presidente” em 1984 nas “Diretas Já!”, enfrentamos o neoliberalismo de Collor e FHC. Nos governos petistas construímos o programa nacional de cotas, a reformulação do ENEM, o ProUni e o ReUni, Ciência sem Fronteiras, pautamos os royalties do Pré-Sal para a educação, o Plano Nacional de Educação - PNE, que destinava 10% do PIB para investimentos nesse setor. No último período ocupamos as ruas contra o golpe de Temer, ocupamos escolas e universidades contra a PEC 55 (que hoje nos atinge diretamente com o contingenciamento de recursos para a saúde), fomos uma só voz nas ruas gritando MARIELLE VIVE e ELE NÃO e colocamos a UNE na sua verdadeira casa, a rua, construindo os gigantes Tsunamis da Educação!

No ano de 2020, nos deparamos com uma situação sem precedentes: a pandemia da covid-19, que atinge o mundo desde o ano passado e chegou com força no Brasil em março, expõe as entranhas de uma estrutura social quase inalterada desde o tempo do império, regida por um projeto muito delimitado de subserviência da classe dominante brasileira às europeias e norte-americana e do nosso povo a essa classe dominante doméstica. No Brasil de hoje, esse projeto é representado pelo presidente Jair Bolsonaro que, em meio à maior crise sanitária de nossa época, conduz o país ao caos. São 100 mil brasileiros mortos pela irresponsabilidade de Bolsonaro que, desde maio, deixou o Ministério da Saúde sob comando de um militar que segue suas ordens anticientíficas.

Desde o início do governo, o presidente se colocou ativamente contra o desenvolvimento científico de nosso país, cortando bolsas de pesquisa da CAPES e CNPq e promovendo o contingenciamento de verbas das universidades federais. No entanto, é justamente a ciência que pode encontrar uma solução para esta crise sanitária. As universidades federais são linha de frente na pesquisa científica no combate ao coronavírus. Aqui no estado, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) coordena a maior pesquisa brasileira sobre a prevalência de covid-19 no país; enquanto o Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) é o local de referência no Rio Grande do Sul para o tratamento do coronavírus, a universidade também produz equipamentos de proteção e álcool gel para distribuir aos locais de atendimento.

Ao mesmo tempo, o movimento estudantil tem esse grande desafio de desprender-se das estruturas da universidade para enfrentar as diversas crises que assolam nosso país ao lado do povo. Devemos superar esse abismo que existe já na formação das universidades brasileiras entre as demandas das classes populares e a produção e intervenção universitária. Em diversos processos de transformação social na América Latina, fomos nós, estudantes, que se voltaram às comunidades e periferias para auxiliar na defesa da vida e na discussão desse novo projeto de sociedade que vamos construir. Em meio à crítica situação que o Brasil enfrenta, milhares de estudantes mobilizaram-se para construir ações de solidariedade em dezenas de comunidades por todo país: ajudamos no cadastro para o recebimento do Auxílio Emergencial de milhares de pessoas, distribuímos máscaras nas longas filas que se formaram para o recebimento desse auxílio e doamos, junto com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, o MST, mais de mil toneladas de alimento saudável e orgânico, contribuindo para que milhares de famílias pudessem se manter em casa, em segurança, com dignidade.

Nesse 11 de Agosto, aniversário de 83 anos da UNE, estamos construindo um dia dos e das estudantes como nenhum outro, com uma gigante mobilização virtual, pelo canal do YouTube da UNE! A categoria estudantil precisa compreender seu papel de fermentar a massa, como definiu Mercedes Sosa de forma sublime, que precisa crescer para enfrentar esse momento. É fundamental que os estudantes estejam em luta ao lado de seu povo, cultivando os frutos de uma sociedade democrática, que só faz sentido quando traduzida em valores de igualdade, justiça, dignidade e solidariedade.

* Gabriel Argenton é estudante de Educação no Campo na UFFS e diretor de Direitos Humanos na União Estadual de Estudantes do Rio Grande do Sul (UEE-RS)

* Laura Barreras é estudante de Administração Pública e Social na UFRGS e Diretora de Políticas Públicas para a Juventude da UEE-RS

* Vítor Martinez é estudante de Direito na UFRGS e Diretor de Movimentos Sociais da UEE-RS

Edição: Marcelo Ferreira