Ceará

Homofobia

Em Quixeramobim (CE), pastor propaga discurso homofóbico por motivação política

No início desta semana, vazaram áudios na internet onde mostram o pastor Gustavo Monteiro proferindo discurso homofóbico

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
A Lei Municipal 2.815/2016 define o dia 24 de outubro como o Dia da Diversidade Sexual no Município de Quixeramobim. - Foto: GOV-CE

A corrida eleitoral do município de Quixeramobim, no Sertão Central do Ceará, ganhou destaque nas redes sociais no início dessa semana. O motivo? O vazamento de áudios do pastor Gustavo Monteiro, presidente da Conversão Batista Cearense e Pastor da Igreja Batista de Quixeramobim, onde o religioso critica a postura de candidatos à prefeitura do município, que possuem propostas voltadas ao público LGBTQIA+. Em um dos áudios, o pastor fala “Eu só não quero que o Clébio Pavone e o Dr. Pedro ganhem. Deus me defenda, porque todos dois são comprometidos com essa causa gay. Nós temos que orar a Deus e fazer a nossa parte, não deixar isso acontecer”.

O candidato Clébio Pavone (PP), citado no áudio, publicou em sua rede social mensagem onde diz: “Não é com ódio que se chega no seu objetivo. Precisamos semear  a paz, o amor e acima de tudo o respeito. Como manda os mandamentos de nosso Senhor Jesus Cristo! Amai-vos uns aos outros assim como eu vos amei”. Já o candidato Pedro Coelho (PT), também citado no áudio, em vídeo divulgado nas redes sociais disse. “Já tá saindo aí áudio, já tá saindo aí algumas postagens trazendo ódio para a campanha de Quixeramobim. Nós não vamos entrar nessa. Eles que engulam o ódio deles, que nós vamos continuar com a nossa campanha do bem, da felicidade e do amor”.

Em outro áudio o pastor fala. “Essa derrota quer ‘aviadar’ a nossa cidade todinha, mas há poder no sangue de Jesus, então, por favor, passe para todos os contatos crentes que você tem esse vídeo, ajude a gente a não deixar essa derrota assumir a nossa prefeitura”. Vale lembrar que em Quixeramobim, a Lei Municipal 2.815/2016 define o dia 24 de outubro como o Dia da Diversidade Sexual no Município de Quixeramobim. Franciscana Souza, travesti,  e assessora dos Processos Internos no Instituto Terramar é uma das organizadoras das ações que estão denunciando o caso. Ela afirma que além da organização popular e produção da carta de repúdio, está sendo movida uma ação junto ao Ministério Público (MP) por meio de um ofício e uma carta de repúdio como uma ação conjunta do coletivo LGBTQIA+ de Quixeramobim e a sociedade civil organizada. “Enviamos também um ofício e carta ao Conselho Estadual de Direitos Humanos do Ceará. O coletivo está se movimentando para execução de ações, parcerias e órgãos responsáveis para criminalizar o ato desse ‘líder’ religioso”. 

Para ela, o crime de LGBTfobia, verbalizado e propagado nas redes como uma promoção e incentivo ao discurso de ódio, silenciamento e negação da existência da população LGBTQIA+ de Quixeramobim representa um retrocesso aos direitos sociais e sexuais desse movimento social tanto no município como a nível nacional.  “O Ministério Público já está sendo acionado por meio de um advogado. Iremos protocolar um ofício, uma carta de repúdio, assinaturas (movimento social e sociedade civil organizada) e provas para que as devidas providências jurídicas e constitucionais sejam tomadas. O objetivo é criminalizar esse ato como LGBTfobia e enquadrá-lo na lei 7.716/89”, afirma Franciscana.


Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero passasse a ser considerada crime. / Foto: GOV-MS

Homofobia é crime

Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero passasse a ser considerada crime. Na ocasião, por 8 votos a 3, os ministros determinaram que a conduta passe a ser punida pela Lei de Racismo (7.716/89).

Carta de Repúdio

Diante o caso de homofobia, movimentos populares do município se reuniram em apoio e juntos escreveram carta de repúdio ao caso. Um dos trechos diz. “O movimento LGBTQIA+ de Quixeramobim e a sociedade civil organizada vem por meio desta nota se pronunciar contra e tornar público a fala de um líder religioso que ecoa como promoção ao discurso de ódio e justifica a LGBTfobia, negando assim a participação deste segmento como pauta nas eleições municipais. Os áudios que estão circulando na internet são carregados de preconceito e se trata de um crime perante a lei (Nº 7.716/1989), referindo-se a uma “causa gay” de forma pejorativa e demonstrando uma total falta de conhecimento da história e da luta da população LGBTQIA+ em Quixeramobim e no Brasil”.

Retratação

Entramos em contato com o pastor Gustavo Monteiro. Ele respondeu à nossa equipe sobre o fato ocorrido. Confira abaixo sua resposta na integra:
 
"Quero me dirigir aos meus irmãos de fé, aos meus conterrâneos e a todos os que ouviram a um áudio privado que foi vazado para nossa sociedade quixeramobinense.
 
Nessa conversa particular, infelizmente eu usei, expressões infelizes, que só as usei pelo calor do debate naquele momento, mas que não condizem com minhas crenças sobre questões religiosas e políticas.
 
Reconheço que me excedi e falei como não deveria e poderia, mas quero me desculpar não apenas com os candidatos, mas também com toda nossa população, que é composta por pessoas do bem e da paz, logo não mereciam tamanha decepção comigo, então como sei de sua influência e conhecimento sobre mim, gostaria de humildemente lhe pedir para que ao ouvir qualquer comentário sobre este áudio, esclareça, que ali não foi o Pastor Gustavo que falou, por ser calmo, pacífico e respeitador, ali foi um falho ser humano que na hora da raiva, proferiu o que não deveria.
 
Afinal, o erro faz parte da caminhada do homem em busca de se tornar um ser humano mais evoluído, e podem ter certeza que tal episódio impar servirá de lição para o resto de minha vida.  
 
Lamento profundamente tal episódio, pois não gostaria jamais de ser visto como intolerante ou preconceituoso, até porque tenho vários amigos homoafetivos e os respeito, bem como convivo diariamente.
 
Defendo o livre arbítrio, a democracia e a paz entre todas as classes, mas reconheço que no momento do debate, me descontrolei e me pronunciei de forma infeliz.
 
Quero me desculpar pela maneira infeliz de minhas expressões, pois no meu dia a dia, quem me conhece de perto sabe do quanto eu respeito as pessoas que pensam diferentes de mim, afinal a vida em sociedade é feita de dialética e respeito mútuos entre as opiniões.
 
Peço desculpas a todas as pessoas a quem ofendi reconhecendo o inalienável direito de escolha religiosa, política, ou, de qualquer outra natureza e certamente buscarei mais prudência em meus pronunciamentos a fim de evitar qualquer dissabor sobre mim, minhas convicções, práticas e ensinos, especialmente de respeito ao próximo.

A todos, mais uma vez minhas sinceras desculpas.

Paz a Todos!"

Edição: Monyse Ravena