Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | A morte não pode ser naturalizada

"Os mortos são pessoas, gente de carne e osso, com histórias de vida, que deixam parentes, amores, entes queridos"

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Após um 1 ano e 16 dias de covid-19, é como tivessem sumidos 174 municípios de nosso país (sendo que 57 municípios seriam do RS) - Marcio James / Semcom

A pandemia atual está mais longa e se mostrando mais cruel que “uma gripezinha”. Se não me engano, no dia 12 de março último passado fez um ano da primeira morte.

Com dados de domingo (28), são 312.299 mortos no Brasil, acontecidos em 371 dias, o dá uma média de 842 mortos por dia. Se colocássemos 42 pessoas num ônibus, daria 20 ônibus (daria 840), por dia, a cada dia dos 371, rumo ao cemitério.

Se fosse num só lugar, veríamos esta carreata macabra diariamente. E entre eles, alguns conhecidos e, provavelmente, algum parente. Parece que dói mais quando os mortos deixam de ser números por haver alguma relação afetiva.

Mesmo assim, muitos preferem fechar os olhos e não ver.

Estes dias dei-me conta de que no Brasil, dos 5.568 municípios (seriam 5.570 se incluímos Brasília e Fernando de Noronha, que são respectivamente distrito federal e distrito estadual), há 442 onde moram neles menos de 3 mil habitantes (conforme o IBGE, em 2018).

O menor é Serra da Saudade, em Minas Gerais, com 782 habitantes, e o 442º é Damolândia, em Goiás. Mas o que me chamou atenção é que entre os 442 municípios com menos de 3 mil habitantes, 115 estão no Rio Grande do Sul (se não deixei passar nenhum na contagem).

A soma total de habitantes dos 442 municípios é de 1.001.866 pessoas. Número menor que Porto Alegre, que tem 1,4 milhão de habitantes, e a soma de quase duas Caxias (517 mil x 2 = 1,034 milhão), o segundo maior município do Rio Grande do Sul.

Mas o que me chamou atenção é que 312.299 mortos é maior que a soma dos 174 municípios menores do Brasil, que é de 312.044 pessoas. É como se em um ano e 16 dias tivessem sumidos estes 174 municípios de nosso país (sendo que 57 municípios seriam do RS).

É muito número. Mas os mortos são pessoas, gente de carne e osso, com histórias de vida, que deixam parentes, amores, entes queridos. Alguns inclusive levaram com eles a aposentadoria, diminuindo assim a parca renda da família. Cresce a saudade e a fome, na esperança de que um dia chegue a vacina (pois só chegou para 7% dos habitantes do Brasil a primeira dose).

E a quem está vivo, com saúde e alguma renda, há a possibilidade da indignação e da solidariedade com os mais lascados. Mas a solidariedade só fermenta se ajudar os que necessitam a se organizarem, a lutarem por uma auxilio emergencial, pelos SUS, pelos direitos do povo brasileiro, enfim pelo impedimento.

* Ir. Paulo Ricardo Cerioli, osfs, é da congregação religiosa Oblatos de São Francisco de Sales

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.


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Edição: Marcelo Ferreira