Paraná

Entrevista

“A condição dos trabalhadores formais já não era boa antes da pandemia”

Economista aponta impactos da pandemia na condição de trabalho e negociação salarial

Curitiba (PR) |
Desde o segundo semestre de 2020, vemos uma piora significava das negociações para garantir a manutenção do poder de compra dos trabalhadores - Joka Madruga

De acordo com estudo recente do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em 2019, apenas 1,2% das negociações salariais faziam menção ao home office, número que, com a pandemia, cresceu para 13,7%. Na indústria, o percentual foi menor (9,7%). Em um contexto de precarização e subemprego, Sandro Silva, economista e supervisor técnico do Dieese-PR, afirma que a pandemia acentua dificuldades como o aumento da jornada de trabalho e a ausência de limite para o uso do celular como instrumento de trabalho. Ambos os setores, informal e formal, sofrem dificuldades.

Brasil de Fato Paraná. Hoje, o trabalho remoto e a consequente proteção contra a pandemia acaba sendo possível a apenas uma parcela da classe trabalhadora?

Sandro Silva. O home office na pandemia acaba atingindo uma parcela pequena dos trabalhadores, principalmente os trabalhadores formais dos setores de serviços e comércio, que executam atividades que permite este tipo de trabalho.

No trabalho remoto, em algumas profissões, como fica a garantia de estrutura? Internet, luz, telefone e mobiliário.

Infelizmente, grande parte das negociações que analisamos sobre o tema não garantem a estrutura, as que avançam não preveem de forma concreta esta garantia, ficaram mais focadas em autorizar o home office e usar as políticas criadas pelo governo (redução da jornada de trabalho e suspensão do contrato de trabalho), sendo que algumas preveem o fim do pagamento de alguns benefícios, como vale transporte e auxílio-alimentação.

Como fica a jornada de trabalho em tempos de trabalho flexível, em casa, com o trabalhador conectado a todo momento via celular? O trabalho aumentou?

Antes mesmo do aumento do home office com a pandemia, já estava difícil para alguns trabalhadores limitar a jornada de trabalho em virtude do uso do celular como instrumento de trabalho, com a pandemia isto ficou ainda mais difícil, aumentando a jornada, e também a intensidade do trabalho, gerando problemas no convívio familiar e prejudicando a saúde dos trabalhadores.

Neste momento de crise, o Dieese afirma que 70% das unidades de negociação sindical não repuseram a inflação. A crise piora também as condições dos trabalhadores formais?

Infelizmente piora e muito a condição dos trabalhadores formais, que já não era boa antes da pandemia, consequência do baixo crescimento econômico, que pressiona os trabalhadores em função do medo da perda do emprego, e a reforma trabalhista aprovada em 2017, que diminuiu o poder de atuação das entidades sindicais e precarizou as relações de trabalho. Analisando as negociações coletivas, observamos que no início da pandemia elas focaram em garantir os empregos e adotar medidas de proteção a saúde e segurança dos trabalhadores, deixando a questão econômica de lado. Desde o segundo semestre de 2020, vemos uma piora significava das negociações para garantir a manutenção do poder de compra dos trabalhadores, consequência da forte aceleração da inflação, o acumulado em 12 meses do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) chegou a ser de apenas 2,05% em junho de 2020, em março de 2021 já está em 6,94%, e com tendência de alta. Esta alta é ocasionada principalmente pelos aumentos da alimentação, do gás de cozinha e dos combustíveis, consequência da desvalorização do real, do aumento das exportações, da política de preço da Petrobras e ausências de políticas públicas. Além disso, observamos o agravamento das crises sanitárias e econômica, fazendo com que a maioria das negociações não consigam repor sequer a inflação.

Edição: Lia Bianchini