Paraná

Denúncia

Moradores da Caximba criticam Cohab e exigem nova forma de cadastramento

Datado de 2017, o projeto não daria conta da situação de ampliação do local, vendas de lotes e chegada de novas famílias

Curitiba (PR) |
Porém, em certa medida, a pressão de moradores aponta um resultado e faz a companhia sinalizar novas formas de negociação - Pedro Carrano

Há duas semanas, moradores estão em movimentação e crítica contra a forma como a Companhia de Habitação de Curitiba (Cohab) gerencia o cadastramento das famílias ocupantes das áreas Abraão e Vila 29 de Outubro, localizadas no bairro Caximba, periferia extrema de Curitiba. No local está previsto o projeto Bairro Novo Caximba, uma parceria com a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), com previsão de 47,6 milhões de Euros de financiamento, de acordo com a Cohab.

A imagem de tratores destruindo onze casas, em pleno período de pandemia, algumas sendo usadas por pessoas, é sempre chocante. O fato repercutiu entre as entidades de direitos humanos, uma vez que orientação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e tribunais estaduais não recomenda despejos forçados no período grave da pandemia e da atual crise social.

A área de ocupação é extensa, existe há mais de uma década e no projeto, coordenado pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) junto à prefeitura, a Cohab tem cadastradas 1.693 famílias, deste número 546 para regularização e 1.147 para realocação.

Os moradores, porém, acusam o cadastramento da Cohab de estar defasado, como informou reportagem do Brasil de Fato Paraná, datado de 15 de abril.

A forma como a gestão lida com os moradores também é objeto de críticas. "A máquina vai resolver" foi uma das respostas do funcionário da prefeitura quando questionado sobre a ação de despejo no dia 15 de abril - apontam relatos locais coletados pela reportagem do Brasil de Fato Paraná.

Moradores acusam ainda a falta de informação oficial, canais de diálogo com as famílias e critério na derrubada das casas que de fato não estão inscritas na lista da Cohab. Tudo isso, somado, gera insegurança.

Conflito previsível

Datado de 2017, o projeto não daria conta da situação de ampliação do local, vendas de lotes e chegada de novas famílias.

Nesse sentido, lideranças avaliam que o cadastramento poderia ser online e a prefeitura deveria centralizar as negociações e controle do cadastro com um grupo amplo e representativo das famílias, para evitar arbitrariedades na derrubada dos barracos e na gestão do espaço – além de permitir moradia a quem de fato necessita.

“Não aceitamos que eles derrubem casas que eles não construíram. Quem comprou, comprou de alguém, a Cohab não tem direito de derrubar casa pronta para vender de novo para os moradores. Não fazemos nada de errado e nada escondido”, afirma uma das principais lideranças da comunidade, a mestrando de capoeira Gaivotta.

Um abaixo-assinado já recolheu mais de duas mil assinaturas. Mobilizações com a presença de movimentos populares e grupos de apoio estão ocorrendo. Foi feita também uma caminhada com lenços brancos pelo bairro, colocando faixas e cartazes ao lado das placas da prefeitura. A demanda segue sendo negociação coletiva, cadastro online e participação comunal no controle deste cadastro.

“Como não tem um controle, um cadastro online, estão fazendo o que querem com os números da Cohab, é injusto o que estão fazendo”, defende Gaivotta.

Neste ponto, a resposta da Cohab (veja completa abaixo) reafirma que a única forma de controle é o remanejamento ou a retirada dos barracos. Gaivotta já havia sugerido a construção de cercas de contenção, mas os canais de comunicação entre prefeitura e moradores parecem estreitos.

“Ações para evitar o aumento da área, bem como para conter o desmatamento do bosque, também vêm sendo realizadas, como o remanejamento de famílias da parte final da ocupação, realizada em 2018, e a demolição de casas não habitadas, ocorrida em março deste ano”, expressa a Companhia.

Porém, em certa medida, a pressão de moradores aponta um resultado e faz a companhia sinalizar novas formas de negociação. “Também está prevista a eleição de uma Comissão de Representantes da comunidade, para a qual todos os interessados poderão candidatar-se, e que funcionará como mediadora entre a comunidade e órgãos responsáveis”, completa a assessoria de imprensa da Cohab.

A visão da Cohab

A reportagem do Brasil de Fato Paraná não teve resposta em contato com a regional do Tatuquara. Apenas a resposta da assessoria de imprensa da Cohab, que segue abaixo:

O Projeto Gestão de Risco Climático Bairro Novo da Caximba é uma intervenção socioambiental promovida pela Prefeitura Municipal de Curitiba que já foi integralmente aprovada pela Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), que financiará o projeto.

Em agosto de 2020, a Prefeitura de Curitiba e a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) formalizaram o financiamento para o Projeto Gestão de Risco Climático Bairro Novo do Caximba. Serão € 47,6 milhões (Euros) em investimentos, dos quais € 38,1 milhões da AFD e € 9,5 milhões em contrapartidas do município.

No projeto e na execução de obras, este empreendimento público deverá gerar 14 mil empregos em Curitiba, entre diretos (4.380), indiretos (2.336) e induzidos (7.300).

Iniciada há quatro anos, a intervenção socioambiental vai ordenar e regulamentar a ocupação existente, com foco na Vila 29 de Outubro, bem como minimizar o impacto ambiental para garantir a recuperação e preservação ambiental e a qualidade de vida da população.

Para possibilitar a elaboração do Projeto foi necessário mapear e cadastrar as famílias moradoras, a fim de delimitar o número de beneficiados, o que foi realizado em 2017, quando foram identificadas 1.693 famílias. Os recursos disponibilizados e o projeto elaborado levaram em conta este número. Por isto, foi feito o chamado “congelamento” da área: as famílias que se instalaram após o cadastramento não podem ser incluídas no projeto. Isto é uma determinação da Agência Francesa, agente financiador da intervenção.

Desde 2018 o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) e a Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab Curitiba) estão próximos da comunidade, com a realização de visitas domiciliares, reuniões de apresentação do projeto, consulta pública, atendimentos e plantões, com objetivo de manter a população local bem informada sobre o andamento do projeto.

Dada a importância da participação e envolvimento da comunidade nas ações, todos os moradores e lideranças da Vila 29 de Outubro foram convidados para as reuniões realizadas, nas quais puderam opinar e sanar dúvidas referentes à intervenção. A eficácia para atingir os objetivos do projeto, depende da participação ativa e plena das famílias beneficiárias.

Ações para evitar o aumento da área, bem como para conter o desmatamento do bosque, também vêm sendo realizadas, como o remanejamento de famílias da parte final da ocupação, realizada em 2018, e a demolição de casas não habitadas, ocorrida em março deste ano.

Ainda em 2018, a Prefeitura, por intermédio da Cohab, promoveu duas grandes ações de remanejamento de famílias que estavam em situação precária. Em maio daquele ano foram transferidas 70 famílias e em dezembro do mesmo ano outras 20. Foram para moradias provisórias, porém longe do risco de enchentes e alagamentos.

A área de beira de rio que foi desocupada após a transferência das famílias recebeu, em outubro de 2018, o plantio de 120 mudas de árvores para a recuperação ambiental. Em agosto de 2019, técnica ambiental da Cohab mobilizou os moradores para avaliação clínica de cães e gatos por meio da Rede de Proteção Animal.

Para ampliar o canal direto de comunicação com a comunidade, que já vinha sendo permanente, a Prefeitura vai abrir em maio o Escritório Local (ELO). Em um imóvel de 260 metros quadrados localizado na Rua Delegado Bruno de Almeida, 8080, serão realizados os plantões sociais, rodas de conversas, reuniões informativas, cursos, capacitações e outras ações do Cronograma previsto no Plano de Reassentamento. O ELO contará com equipe técnica multidisciplinar permanente capacitada para atuação exclusiva no Projeto.

Além disso, como parte das ações do Trabalho Social do Projeto, será realizada a atualização dos cadastros das famílias moradoras e levantamento das famílias que excedam o quantitativo inicial. Também está prevista a eleição de uma Comissão de Representantes da comunidade, para a qual todos os interessados poderão candidatar-se, e que funcionará como mediadora entre a comunidade e órgãos responsáveis.

Edição: Lia Bianchini