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Grândola Vila Morena   

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Em 25 de abril de 1974, a Revolução dos Cravos foi o movimento que derrubou o regime salazarista em Portugal - Arte: Renato Aroeira
Quem sabe se acordando deste pesadelo não faremos aqui algo ainda melhor?

Nesta semana em que foi instaurada a CPI da Covid, também se “comemorou” aniversário do genocídio em Guernica e do ecocídio nuclear de Chernobyl.

O bombardeio da cidade basca (26 de abril de 1937) foi eternizado na obra de Pablo Picasso. Ali morreram 1.645 pessoas. As bombas eram alemãs, mas a “vitória” foi dos fascistas liderados por Francisco Franco. Crítica muito realista da obra de Picasso afirma que em Guernica ele retratou a “imagem do fim do mundo”... “Um clarão ofuscante de chamas, em seguida a sensação do caos definitivo. Mulheres e crianças gritando, um touro, um cavalo, uma visão de choque e trauma que representa todo o nosso pavor à beira do abismo”.

Já na explosão da Usina Nuclear de Chernobyl (26 de abril de 1986), tivemos rara combinação de arrogância, falhas humanas, ausência de transparência, ocultação de riscos, e muito azar de quem vivia por ali. As estimativas, incluindo os casos tardios, de câncer, apontam perto de 100 mil vitimas. O agravante maior, naquele inferno, pode ser ilustrado pela afirmativa de que “humanos não poderão viver na região de forma segura por pelo menos 24 mil anos”.

E chegamos na nossa CPI da Covid. Em alguns anos, será possível associar os três eventos, como “destaques históricos da terceira semana de abril”? Ou nosso caso é irrelevante? Vejamos: quase 400 mil mortos, e tendência de alta; um povo que suspira aliviado quando a TV anuncia menos de 2.000 óbitos ao dia.

Com o país transformado numa espécie de “celeiro”, ou “caldeirão de mutações”, já contabilizamos, segundo alguns, a circulação de 60 a 100 novas variantes, para onde iremos?

A estupidez é elogiada na televisão, a negação da ciência é ostentada com orgulho, as recomendações de medicamentos inúteis prosseguem, assim como a desmobilização do SUS e o avanço da miséria e do desemprego... Voltamos ao mapa da fome e o super-Guedes diz que a vida dos pobres melhorou... “o preço do arroz está subindo porque eles estão comprando mais – está todo mundo comprando mais”.

Outros membros da corte, inclusive ministros sob comando da família real, tratam de se vacinar às escondidas, ou tentam furar as filas onde os idosos e outros grupos prioritários se acotovelam, disputando doses insuficientes para todos.

Será que tudo isso estará ameaçado pela CPI da covid?

Veremos. O governo parece não ter grandes receios.

E para nós, os “comuns”, parece ser especialmente relevante um fato: esta CPI contribuirá para o lento despertar de todos. Algo novo, que a apuração de responsabilidades, neste caso, tende a assegurar.

De forma otimista é possível pensar que estamos diante de uma boa possibilidade para reconstrução da democracia e da dignidade nacionais.

O que acontecerá se e quando restarem evidenciadas tramoias unindo o ex-juiz de Curitiba e seus procuradores de estimação a parlamentares beneficiados pela chamada “orgia das emendas”, e outros atores comprometidos com a ascensão e a sustentação deste governo, com as mortes causadas pela falta de máscaras, vacinas, oxigênio, campanhas de esclarecimento, orientações e outras medidas incompatíveis com o exercício responsável de cargos públicos?

Todos somos responsáveis, em alguma medida, é verdade. Mas há uma graduação, e afinal isso pode ficar para depois, até porque não interessa, neste momento. Agora, o crucial está em unir forças para interromper a calamidade. Primeiro, precisamos acordar e reunir nossos grupos.

É bem lembrar que os erros típicos de governos fascistas e totalitaristas, associados a desastres como os de Guernica e Chernobyl, cá em nosso país ainda estão incompletos. Podem ser interrompidos.

E a CPI da covid pode ajudar muito, neste sentido, desde que nos mobilizemos para apoiar e empurrar os parlamentares democratas, comprometidos com a contenção do movimento fascista.

Vejam Portugal. A pressão popular, com apoio de militares nacionalistas, arrancou a democracia de dentro do salazarismo e levou aquele país a avançar a passos largos, rumo ao socialismo.

Quem sabe se acordando deste pesadelo não faremos aqui algo ainda melhor?

Que a música que os animou, nos inspire!

 

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko