Rio Grande do Sul

Educação

Eduardo Leite decide vetar projeto que autoriza homeschooling no RS

Autor do projeto, deputado Fábio Ostermann (Novo) anunciou que irá trabalhar pela derrubada do veto

Sul 21 |
Deputados aprovaram “homeschooling” no dia 8 de junho - Imagem de Steven Weirather por Pixabay

O deputado estadual Fábio Ostermann (Novo) anunciou que recebeu nesta quinta-feira (1º) uma ligação do governador Eduardo Leite (PSDB) em que ele informou que vetaria o Projeto de Lei do Homeschooling (PL 170/19), que autorizava pais ou responsáveis a adotarem a metodologia da educação domiciliar, também conhecida como homeschooling, para seus filhos no Rio Grande do Sul. De autoria do deputado Ostermann, o projeto foi aprovado pela Assembleia Legislativa no dia 8 de junho, por 28 votos a favor e 21 contrários.

Em nota divulgada à imprensa, o deputado afirma que o governador justificou o veto com o argumento de que a pauta estaria “contaminada pelo bolsonarismo”. Ostermann diz que lamenta a decisão e que, com ela, Leite demonstrou estar preocupado com suas “aspirações políticas e em antagonizar com Bolsonaro”.

O deputado afirmou que vai trabalhar agora para que o veto seja derrubado e o projeto se torne lei. Para derrubar qualquer veto do governador, são necessários ao menos 28 votos.

“Trata-se, na prática, de um gesto de desrespeito e insensibilidade com pais e mães que dedicam suas vidas à educação dos seus filhos. Eduardo Leite não se dispôs a ouvir os argumentos de famílias educadoras ou especialistas na área favoráveis ao tema. Optou pelo caminho do confronto e da sinalização ideológica, aliando-se aos grupos de esquerda que se opõem a toda e qualquer inovação na educação”, diz Ostermann.

De acordo com o texto do projeto, a educação domiciliar passaria a ser admitida “sob o encargo dos pais ou dos responsáveis pelos estudantes, observadas a articulação, supervisão e avaliação periódica da aprendizagem pelos órgãos próprios dos sistemas de ensino, nos termos das diretrizes gerais estabelecidas por esta lei”.

Atualmente, o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) consideram crime os pais deixaram um filho de 6 a 14 anos fora da escola, prevendo que podem responder por “abandono intelectual” caso não tomem iniciativas de matricular a criança ou adolescente na escola e garantir sua frequência. A pena prevista é de detenção de 15 dia a um mês ou multa.

Em entrevista ao Sul21 na noite desta quinta, o secretário-chefe da Casa Civil, Arthur Lemos, confirmou que o projeto será vetado e afirmou que o governador não entrou no mérito da questão ao tomar a decisão, que será publicado no Diário Oficial do Estado nesta sexta-feira (2), mas que levou em consideração apenas a preocupação com a segurança jurídica em razão da interpretação do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 888815, que reservou ao Congresso Nacional a autonomia para regulamentar o ensino domiciliar. “Nada contra ao mérito e ao aprofundamento [da pauta]”, diz o secretário.

Lemos afirmou que ficou claro no voto do ministro do Luís Roberto Barroso que a jurisprudência consolidada no STF é de que normas estaduais são inconstitucionais quando conflitam com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). “Se o veto for derrubado, essa é uma decisão soberana do parlamento, mas a nossa preocupação é com a segurança jurídica e com não trazer falsas expectativas para a sociedade”, disse.

O secretário ainda negou que o governador tenha vetado o projeto por preocupação sobre a relação da pauta com o “bolsonarismo”. “Eu não sei o teor da conversa, mas em absoluto que a tomada de decisão tenha versado sobre uma questão dessas. A manifestação no veto traz elementos estritamente legais e constitucionais. Traz um ponto também importante de que existe lei federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que no artigo 55 diz que os pais e responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos na rede regular de ensino. Quer dizer, eu tenho lei federal que me obriga, mas eu vou ter lei federal que me autoriza? Aí está gerada a insegurança jurídica. O que eu acredito que possa ter sido mencionado é que é uma discussão que temos que ter, mas não no campo ideológico. Eu acredito que essa foi a real intenção de colocação e possa ter sido mal interpretada pelo deputado”, afirmou.

Especialistas em educação ouvidos pelo Sul21 em reportagem recente sobre a pauta apontam uma série de problemas relacionados à liberação da prática no Brasil.

Marcele Frossard, assessora de políticas sociais da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, afirmou que principal crítica da entidade contra projetos que autorizam a educação familiar é que a metodologia retira das crianças e adolescentes a dimensão do convívio social que só é possível na escola.

“Os defensores dessa modalidade de ensino sempre se baseiam em questões acadêmicas, sempre defendem que as crianças que estudam em casa têm melhores resultados em avaliações, que elas sabem mais que as crianças que estudam nas escolas, só que existe outra dimensão da escola que não é só o aprendizado de conteúdos. A escola é muito mais do que o ensino de conteúdos. A escola é uma vivência, uma experiência, é conviver com a diversidade, com pessoas diferentes do que convive dentro da sua casa. É você conviver longe do olhar do seu pai e da sua mãe para desenvolver a sua própria personalidade, gostos e interesses. Tem também um desenvolvimento da autonomia dos sujeitos que começa desde a infância. Então, tem todo um desprezo por uma pedagogia, por uma ciência pedagógica, por uma técnica, por um conhecimento da educação que é muito mais do que o ensino em si, a prática de ensinar um conteúdo”, disse.

Edição: Sul 21