Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | Escândalos, diversionismos, CPI e o diretor da CIA vem ao Brasil

A “guerra fria” do século XXI não é a ideológica, é do tipo colonial, onde a comunicação tem um peso extraordinário

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"Há mais de seis mil militares em cargos civis no governo Bolsonaro" - Foto: Sérgio Lima/AFP

O Brasil passa por períodos muito difíceis, desde quando as finanças internacionais aplicaram um golpe sub-reptício, traiçoeiro, na sucessão do presidente Ernesto Geisel. A nosso ver, começa naquele momento a queda do Brasil Potência, do país que agia pelos seus próprios interesses e se desenvolvia, e passa a ser colônia dos capitais apátridas, residentes em paraísos fiscais, e atinge, com a pandemia do covid 19, ápices de miséria.

No dia 1º de julho último, às 19h30, em Brasília, no Setor de Habitações Individuais Sul, QI 5, número 46, o presidente da República, Jair Bolsonaro, com o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), General Augusto Heleno, e o chefe da Casa Civil, General Luiz Eduardo Ramos, estiveram, fora da agenda presidencial, com o novo diretor da Agência Central de Inteligência (CIA, em inglês), dos Estados Unidos da América (EUA), William J. Burns, nomeado pelo Presidente Joe Biden. Mister Burns procedia de Bogotá (Colômbia) que sofre verdadeira guerra civil, com mais de 60 mortos e mil pessoas feridas em luta contra as medidas do presidente Iván Duque.

Há turbulências, revoltas e mudanças de governo na América do Sul - Chile, Peru, Equador, antes na Bolívia e na Argentina - o que explica a viagem do “homem da CIA”, e os aparentes desencontros entre os governistas e os oposicionistas no Brasil.

Longe de pretender ser dono da verdade, mas seguindo a máxima que levou o presidente Richard Nixon à renúncia, em agosto de 1974, vou “seguir o dinheiro” (follow the money), como recomendou, no filme sobre Watergate (Todos os Homens do Presidente), o ex-diretor-assistente do FBI, W. Mark Felt.

O neoliberalismo está sendo derrotado pela realidade do cotidiano das classes médias europeias, estadunidense, sul-americanas, e a Ásia, a África e o Oriente Médio se aproximam, cada vez mais, da República Popular da China e da Federação Russa. Disto resulta a fúria do “homem da guerra”, Joe Biden, do establishment estadunidense, do inglês, e dos capitais especuladores à China e à Rússia, com sanções econômicas e ameaças militares.

A “guerra fria” do século XXI não é mais a guerra ideológica do século XX. É uma guerra do tipo colonial, onde a comunicação tem um peso extraordinário. O esclarecido leitor sabe bem da influência das “fake news”, das “redes sociais”, dos “facebook”, “instagram” e outros “whatsApp”, das ações das “Cambridge Analytica” e sua sucessora britânica Emerdata Limited.

Tudo isso traz a denominação de guerra híbrida e das cismogêneses. Figuras como Biden lembram-me certos pastores neopentecostais que se aproximam com citações da bíblia, tremendamente evangélicos, e que me obrigam a colocar, preventivamente, a mão no bolso.

Parte destas disputas se dá no âmbito parlamentar e a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), no Senado Federal, para investigar “supostas omissões e irregularidades nas ações do governo federal durante a pandemia de COVID-19 no Brasil”, oficialmente instalada em 27 de abril de 2021, ganhou a mais ampla repercussão nas mídias. E por que?

Porque logo se constatou pelas mentiras e contradições dos depoentes que se estava diante de mais um episódio de corrupção, no governo que divulga ser um exemplo de probidade.

“De alguma maneira, maioria das CPIs realizadas no Brasil têm como motivação o tema da corrupção. A CPI dá ao Legislativo a oportunidade para controlar a corrupção dos outros poderes e, também, a própria corrupção. John Thompson (O escândalo político. Poder e visibilidade na era da mídia, Vozes, Petrópolis, 2002) apontou que, nas democracias contemporâneas, há a presença da lógica do escândalo como processo permanente na opinião pública, em que a corrupção é um tema típico da cobertura da mídia, que se esforça por denunciar as delinquências do homem público e de agentes privados, com relação à administração pública” (Francisco Filgueiras, “Comissões Parlamentares de Inquérito”, in L. Avritzer, N. Bignotto, J. Guimarães e H.M. Murgel Starling (organizadores), Corrupção - Ensaios e Críticas, Editora UFMG, Belo Horizonte, 2008).

A grande corrupção, aquela que açambarca a metade, ou ainda mais, dos orçamentos públicos, é promovida pelos subornos e negociatas das finanças, de resto nunca auditadas deste o Estado Novo de Getúlio Vargas. Mas sendo o verdadeiro poder no Estado neoliberal brasileiro, não se imagina uma CPI do Banco Central nem do Sistema Financeiro Nacional.

Artigo da jornalista Cláudia Motta, de 18/05/2021, para a Rede Brasil Atual, nos informa do estudo do cientista político William Nozaki, A Militarização da Administração Pública no Brasil: Projeto de Nação ou Projeto de Poder?, onde ficamos sabendo que há mais de seis mil militares em cargos civis no governo Bolsonaro.


Militares no governo Bolsonaro / Reprodução

Como é óbvio, em um Ministério até há pouco tempo administrado por um general, o caso de suspeita de corrupção na compra de vacinas, quando mais de 530 mil brasileiros já faleceram vítimas da covid-19, provoca reações emocionais. O que dizer então das oportunisticamente políticas.

Mas havia muito mais temas incomodando o governo, que nem pode ser atribuídos à cismogênica oposição. E a questão sobre o que Mister Burns tratou, fora da agenda, com dois ministros militares ladeando o presidente, é uma que não quer calar. Estariam, mais uma vez, os EUA impondo uma guerra do Brasil contra a Venezuela, que nossos militares, conhecendo a inferioridade bélica e o preparo insuficiente dos soldados brasileiros, já sabem de antemão que seremos derrotados? Ou querem, com mais pressão sobre um governo fraco, instalar bases militares estadunidenses no Brasil, a partir do já entregue Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), a 32 km de São Luís (Maranhão)?

Por isso, o jornalista Ricardo Noblat escreve em sua coluna de 08/07/2021, no Metrópoles: “Sob a supervisão direta de um general de divisão de nome Eduardo Pazuello, de triste memória, e com o apoio do alto, uma gangue de civis e militares tomou de assalto o Ministério da Saúde sob a alegação de combater o que não passaria de um resfriadinho”.

“Braga Neto era o chefe da Casa Civil quando o país foi quase soterrado por gigantescos volumes de drogas ineficazes contra o vírus produzidas pelo Exército. Parte das verbas destinadas ao SUS durante a pandemia foi usada para pagar despesas militares.”

“Se há uma banda podre no mundo civil, por que não haveria no meio militar? Onde está escrito que militar é mais honesto e patriota do que civil? É dentro dos quartéis que veladamente isso é ensinado, mas está longe de corresponder à verdade.”

Em 23/12/2019, Romulus Maya, editor do Duplo Expresso, redigiu, para um artigo meu, a seguinte chamada: “que Estado podemos imaginar, dominado pela especulação, pela corrupção, pelas drogas, contrabandos e uma religião que divulga e pratica a teologia do enriquecimento, sem qualquer restrição ética ou moral?”.

Penso que as Forças Armadas ainda não acordaram para o país que se tornou o Brasil, sob o domínio neoliberal, das finanças e da teologia da prosperidade. E, enquanto os dossiês que comprometem as famílias no governo não caem no domínio público, os Correios vão fazer companhia às grandes empresas brasileiras, Petrobras, Eletrobras, Telebras, Embratel, Embraer, Vale do Rio doce e muitas outras que passaram às mãos dos gestores de ativos, a denominação com que as finanças apátridas se apresentam neste século.

* Pedro Augusto Pinho é administrador aposentado. Publicado no Portal Pátria Latina em 09/07/2021.

** Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira