Rio Grande do Sul

Coluna

O Encontro com nossa Identidade Cultural através do canto de Mônica Salmaso

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A entrevista com Mônica Salmaso vai ao ar no próximo domingo (18) às 20 horas - Foto: Dani Gurgel
O Brasil nos deu Mônica Salmaso e Mônica nos deu o Brasil com seu canto

O povo brasileiro vive uma busca, aparentemente interminável de uma identidade nacional. Assim vem acontecendo com o passar dos tempos e períodos históricos, sempre buscando afirmações e reafirmações. Palavras como resgate, ancestralidade e contemporaneidade são usadas constantemente para refletir a insatisfação e busca da população que vivencia de tempos em tempos grandes ciclos culturais, políticos, sociais e econômicos.

Nesta perspectiva, surgem agentes culturais como atores e atrizes, bailarinos e bailarinas, cineastas, artistas de diversos segmentos que através de sua expressão e discurso, formatado a partir das relações e processos sócio culturais estabelecidos no centro do povo brasileiro, trazem à tona a reflexão de que temos uma identidade e precisamos defendê-la e valorizá-la.

É indiscutível que nossos hábitos, nossos costumes, nossa relação com a natureza, nosso acolhimento, nosso calor humano e nossos ritmos contagiantes, são apreciados e lembrados em qualquer parte do mundo que se aborde o tema Cultura. Nossa gastronomia é valorizada em todos os cantos do planeta, assim como nossos (as) atletas e nossas festas populares, como o carnaval.

Com seus ritmos, batidas, harmonias e melodias, nossa música é consumida em muitos países nos diversos continentes, rompendo fronteira territoriais e fazendo morada nos gostos e corações daqueles (as) que se encontram distantes fisicamente do Brasil com suas formas, jeito e idiomas bem diferentes do que aqui se encontra. A música brasileira é capaz de despertar sentidos e acessar lugares desconhecidos, mesmo naqueles com maiores friezas emocionais e sentimentais.

E nossa música é uma obra de arte que faz ecoar a história de um povo, sua formação, sua diversidade cultural e sua autenticidade, cantada por diversos (as) cantores (as) e intérpretes que vão se tornando co-autores (as) das canções por terem a capacidade de, através de sua voz e seu canto deixarem explícita sua digital, gerando naqueles (as) que a escutam a sensação de autoria da obra. É o caso de Elis Regina em suas diversas leituras como na canção O Bêbado e o Equilibrista de Aldir Blanc e João Bosco, onde o público em diversos momentos acredita ser a música de autoria da cantora.

Nos tempos atuais podemos identificar o mesmo processo em algumas cantoras dotadas dessa capacidade como é o caso de Mônica Salmaso que, além de ser dona de uma técnica vocal impecável e um timbre inconfundível, traz em seu canto não apenas uma característica própria, mas toda a história de um povo, apontando um caminho na incansável busca por uma identidade formada a partir das misturas culturais que abrange, desde as formas ancestrais de nossa terra à uma contemporaneidade construída a partir de nossa herança cultural.

Isso é perceptível em todas as canções que a cantora interpretou, mergulhando em seus contextos e, muitas vezes (re) significando sua simbologia, trazendo as obras para a atualidade criando a partir do domínio e capacidade de ler através das melodias entoadas, uma forma eficiente de comunicação com o público, gerando em todos (as) nós sensações como se tivéssemos vivido toda a criação, o ambiente e o cada palavras dita através de sua arte de cantar.

Em vários momentos de sua carreira, Mônica nos traz a possibilidade de sentirmos e entendermos essa questão, como por exemplo na canção Menina Amanhã de Manhã composta pelo Tropicalista Tom Zé em 1972 com um determinado significado e, r(e) significada em outro tempo pelo canto e interpretação da cantora.

Como explicou o próprio autor da canção em show realizado no Sesc Pompéia no dia 18 de abril de 2010:

“...Essa música Menina Amanhã de Manhã, agora, já que a música é bonitinha também não precisa ter nenhuma referência a ditadura quase, era só a beleza que Mônica Salmaso é capaz. Então, apesar de eu cantar como Mônica Salmaso, eu vou fazer a Mônica e Jarbas vai fazer a Salmaso, vocês vão subentender o que tem aí de cuidado pra ditadura não compreender que a gente tá falando dela…”

O cuidado com a ditadura era a ginástica cultural que muitos artistas no Brasil tiveram que fazer no período em que o país vivenciou uma ditadura militar entre os anos de 1964 e 1985, para que não fossem pegos pela censura. Já a beleza de Mônica Salmaso é a referência que Tom Zé faz a bela interpretação que a cantora fez de sua canção. O que a gente não imaginava é que essa música voltaria a fazer tanto sentido, ou melhor, um sentido parecido com sua proposta inicial dita pelo autor em pleno ano de 2021.

Mônica em sua gravação, trouxe-nos um tom que nos remete ao cheiro da terra, a cultura popular e a singeleza e suavidade do despertar e da felicidade e leveza que nos faz sentir ao ouvir sua interpretação da canção que, apesar de “bonitinha” é carregada de uma asperidade e crítica social a um regime violento e opressor.

Nos dias de hoje, no pós golpe parlamentar e nas diversas ameaças e tentativas de novos golpes de Estado, com o povo brasileiro sofrendo perdas de entes queridos por uma pandemia que se alastrou e fica cada vez mais incontrolável por conta de um governo genocida, assassino e irresponsável com características autoritárias e com diversas referências à página infeliz da nossa história, Menina Amanhã de Manhã se torna sinônimo de fé e esperança quando escutada na voz de Mônica Salmaso.

O Brasil nos deu Mônica Salmaso e Mônica nos deu o Brasil com seu canto. E, com a esperança de mudança, com a beleza da música (que durante a pandemia vem sendo capaz de anestesiar um pouco o sofrimento de muitos brasileiros) e com fé em nosso povo e em nossa democracia é que poderemos acompanhar do dia 17 até 30 de julho no youtube da cantora, sua apresentação. A cantora será acompanhada por músicos e parceiros de estrada e composta de um repertório que fez parte de sua trajetória.

É dessa forma que vamos vivendo esse momento tão trágico e infeliz da nossa história como nação, entendendo que só a partir de uma consciência, de um despertar do povo brasileiro que já se mostrou forte e unido nas lutas por uma sociedade mais justa e igual, é que conseguiremos seguir adiante e virar mais uma triste página. E o canto de Mônica Salmaso nos traz essa esperança, esse orgulho e a certeza de que podemos e somos capazes de reconstruir o Brasil a partir de um canto de liberdade.

Para saber mais, acompanhe a entrevista com Mônica Salmaso que vai ao ar no próximo domingo (18), às 20 horas.

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* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. 

Edição: Katia Marko