Rio Grande do Sul

Privatização

Presidente da CCJ pedirá retirada da urgência dos PLs da privatização da Corsan

Parlamentares, especialistas e prefeitos apresentaram discordâncias com propostas do governo e pedem mais tempo

A empresa pública atende dois terços da população do RS - Foto: Divulgação Corsan

Audiência pública na Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa do RS (ALRS) na manhã desta segunda-feira, 16, tratou sobre alternativas de capitalização no processo de privatização da Corsan. O deputado estadual Tiago Simon (MDB), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), anunciou que pedirá a retirada do regime de urgência dos Projetos de Lei (PLs) 210/2021 e 211/2021, que viabilizam a privatização da Corsan. Caso não sejam retirados do regime de urgência os PLs entram na pauta de votação em plenário em 15 dias.

O procurador Maurício Trevisan, do Ministério Público de Estadual, fez seu relato inicial destacando que, do ponto de vista jurídico, o MP está debruçado do novo Marco do Saneamento desde foi sancionado. Já sobre os PLs, que tratam da regionalização e alienação da empresa, o procurador repetiu o que afirmou nas reuniões da Feferação dos Municípios (Famurs).

“Nos traz certa angústia os projetos estarem na pauta da ALRS em regime de urgência. Nos parece que a compreensão adequada das consequências do que está sendo proposto se torna dificultada pelo prazo reduzido para o debate ”, desabafa o procurador.

Condução antidemocrática

No encontro virtual, o vice-presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, deputado estadual Jeferson Fernandes – que tem trabalhado nos bastidores e junto a vereadores e prefeitos e lideranças contra a privatização – voltou a criticar a falta de representantes do governo do Estado na audiência.

“O governo tem feito reuniões próprias e fiz questão de acompanhá-las, mas esta é a primeira audiência oficial do Parlamento. Porém, quando há contraponto, o governo não aparece”, protestou.

O parlamentar classificou de “antidemocrática” a condução do processo de privatização da Corsan pelo governo. Ele também afirmou que a “complexidade” do assunto teria sido usada pelo governador para colocar fim à obrigatoriedade do plebiscito para a venda da Companhia.

Governo driblou plebiscito

Jeferson Fernandes também criticou o fato de os projetos, que tratam da aglutinação de 307 municípios em um novo modelo de gestão do saneamento básico, e autorizam o governador a vender a Corsan, tramitarem em regime de urgência.

“A contar de hoje, temos só mais 15 dias para votar os PLs, mas sequer conseguimos que os governistas venham a público defendê-los”, sublinhou o petista.

O deputado lamentou que o curto prazo do período de urgência sequer permite que os parlamentares verifiquem se as propostas, de fato, estão em consonância com o novo Marco Regulatório do Saneamento, cujas exigências de metas de serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário foram um dos principais argumentos do governo Leite para justificar “a suposta necessidade de privatização da Corsan”.

“Certamente, teremos ações judiciais por conta de inconformidades entre o que está sendo proposto e o que exige o Marco. Mas o regime de urgência nos impede de exercer o nosso papel fiscalizador”, alertou.

Jeferson provocou os gestores municipais sobre a perda do poder decisório em relação ao saneamento local que, pelo projeto de universalização, passa a ser exercido 50% pelo Estado. “Desconfio que o governo queira na verdade transferir aos municípios os custos atinentes ao cumprimento das normas do Marco Regulatório, sem ao menos consultar as Câmaras”, apostou.

Prefeitos se mostram contrários

Sobre isso, o prefeito de São Sepé, João Luiz Vargas (PDT), afirmou que não fará nenhum movimento relativo ao saneamento sem aprovação da Câmara de Vereadores. Também revelou ser contrário à privatização da Corsan.

O prefeito de Porto Alegre Sebastião Mello (PMDB), mesmo a capital não fazendo parte do grupo de 307 municípios atendidos pela Corsan e abrangidos por uma das propostas, disse que não aceitará que Porto Alegre seja incluída na regional definida pelo PL 234/2021.

“Transformar um bloco de 307 municípios em dois blocos sem critério de bacias hidrográficas? Não dá para levar um tema destes a toque de caixa. Estamos falando de 30, 40 anos de vida nas prefeituras. Este modelo, a mim, não convenceu ainda”, revelou Mello.

Minas Gerais fez amplo debate e estudos
Já Flávio Ferreira Presser, ex-presidente da Corsan, fez um relato sobre o processo de universalização do saneamento em Minas Gerais, que teria prezado estudos técnicos, observação do comprometimento da renda, tarifa e simulações para que a transição entre os modelos se desse da forma tranquila.

“Tudo isso levou ao PL final que foi apresentado com antecedência aos prefeitos antes de ser enviado à Assembleia Legislativa mineira. O importante é que houve estudos e esses foram consensuados com os prefeitos”, disse Presser.

Empresa saudável

O prefeito de Palmeira das Missões, Evandro Massing (PT) contou que, durante uma das primeiras reuniões realizadas pelo governo com a região sobre o tema, a Companhia apresentou Plano Plurianual com vigência até 2025, que prevê R$ 1 bilhão/ano em investimentos já a partir deste ano, cuja fonte geradora de caixa é a própria Companhia.

“A Corsan é uma empresa saudável, com capacidade de geração de caixa e de investimentos. Então a necessidade de aportar R$ 1 bi por ano segundo o novo Marco Regulatório, a Companhia mostra que tem meios para fazer”, resumiu.

Técnicos  não foram ouvidos

O deputado Jeferson Fernandes alertou também para o fato de que os técnicos da Corsan não terem sido ouvidos quanto à capacidade da Corsan de cumprir as determinações do novo Marco do Saneamento.

Ele mencionou estudo da consultoria privada GO Associados, publicado no jornal Valor Econômico no dia 7 de junho, que atesta o potencial da Companhia para atender à nova legislação.

De acordo com o estudo apresentado, a Corsan está entre as 10 companhias que cumprem as quatro principais exigências econômico-financeiras estabelecidas pelo novo Marco Regulatório, tendo sido aprovada no teste dos índices de margem líquida, grau de endividamento, retorno sobre patrimônio líquido e suficiência de caixa.

“O estudo comprova: a Corsan é uma empresa pública superavitária, capaz de realizar os investimentos para cumprir as metas de universalização do saneamento no RS”, destaca Fernandes.

Eduardo Carvalho, especialista da Associação de Engenheiros da Corsan, mostrou exemplos de empresas de capital aberto com controle público como contra-argumento ao governo que alega necessidade de “tirar amarras” que impediriam busca de resultados previstos no Marco de Saneamento.

Segundo o especialista, a privatização Corsan, sendo ela superavitária, não é necessária para buscar patamares mais elevados de saneamento e que os técnicos da empresa têm se esforçado em fornecer informações neste sentido.

Lucro de R$ 300 milhões/ano

Ela teve nos últimos cinco anos um lucro líquido médio de R$ 300 milhões/ano. Mas o governador e sua base não querem que as pessoas saibam disso”, concluiu Jeferson, que propôs à Comissão de Assuntos Municipais encaminhamento de documento ao governador reivindicando a retirada do caráter de urgência dos projetos, considerando que houve unanimidade na rejeição ao exíguo tempo de debate do tema.

Ao final da audiência, como encaminhamento principal, foi criado um comitê técnico, dentro da Comissão de Assuntos Municipais, que irá elaborar um documento para os 55 parlamentares sobre o quanto a Corsan é viável.

Edição: Extra Classe