Rio Grande do Sul

PATRIMÔNIO IMATERIAL

Com segundo andar ainda fechado, Mercado Público é tema de reunião em busca de alternativas

Comissão da Assembleia gaúcha reuniu permissionários, consumidores e gestores públicos para propor ação à prefeitura

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Com 152 anos de história, Mercado Público quase foi parar na mão da iniciativa privada em 2020 - Foto: Cesar Lopes / PMPA

Cartão-postal da capital gaúcha e fonte de história, cultura e sustento para muita gente, o Mercado Público de Porto Alegre completou 152 anos no dia 3 de outubro. Com o segundo piso ainda fechado ao público, após incêndio em 2013, o local por pouco não teve sua administração entregue à iniciativa privada, não fosse a luta da sociedade e dos mercadeiros.

Em 2020, o então prefeito Nelson Marchezan (PSDB) lançou edital de concessão de 25 anos, que foi suspenso na Justiça, até ser revogado no dia 11 de junho deste ano. Nesse meio tempo, a Associação do Comércio do Mercado Público Central (Ascomepc), que representa os permissionários, defendeu um projeto de gestão pelos próprios mercadeiros.

Em janeiro deste ano, apresentou uma proposta de gestão do espaço ao prefeito Sebastião Melo (MDB). O levantamento da associação indicava a necessidade de R$ 30 milhões em melhorias estruturais, enquanto o edital revogado previa aportes de até R$ 80 milhões. A Ascomepc entende que essa diferença seria paga pelos mercadeiros, o que levaria a uma alteração no caráter popular dos negócios.

Nesta quinta-feira, a Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa reuniu em audiência pública permissionários, consumidores e gestores públicos para discutir a situação do Mercado Público Central de Porto Alegre. O debate foi uma iniciativa da deputada Sofia Cavedon (PT), que sugeriu, ao final, a sua continuidade por meio de uma comissão ou grupo de trabalho a fim de encaminhar uma proposta mais consolidada de ação à prefeitura.

Presidenta da Ascomepc, Adriana Kauer fez um retrospecto do imbróglio existente entre o poder público e os mercadeiros. Ela lembrou que, até 2005, mantinham uma parceria para a administração do local, quando a prefeitura rompeu sem realizar os últimos aportes que lhe cabiam, o que teria resultado em dívidas trabalhistas com os funcionários.

Segundo Adriana, após a rescisão do contrato, a associação teria ficado malvista por conta das dívidas, as quais, no entanto já teriam sido reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal como sendo da prefeitura. “Isso já faz cair por terra a ideia de que o Mercado não poderia ser gerado pelos mercadeiros”, disse.

Após o incêndio de 2013, e antes da decisão do Supremo, os mercadeiros se comprometeram com o Ministério Público a realizar o Plano de Prevenção e Proteção contra Incêndios (PPCI), a fim de manter o local aberto, uma vez que a administração municipal anterior havia descumprido o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) existente sobre o tema.

Patrimônio histórico e cultural

A coordenadora do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, Ilya Vera Soares, disse que refletia o sentimento e a preocupação das quase 20 mil "casas de tradição" existentes em Porto Alegre com o Mercado Público. "O Mercado Público é a extensão das nossas identidades", disse. "Não é as suas quatro paredes, é o centro da capital”, continuou ressaltando o aspecto imaterial do espaço.

A coordenadora do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Histórico Brasileiro/RS, Jacqueline Custódio, trouxe mais elementos para caracterizar o espaço como marco histórico e cultural da cidade. “É o espírito do lugar que dá vida a ele”, considerou, explicando que por “espírito do lugar” entendia-se um conjunto de elementos tangíveis e intangíveis.

Representando a Secretaria de Desenvolvimento de Porto Alegre, o coordenador do Mercado Público, Ronaldo Pinto Gomes, resgatou um pouco da história do prédio, “o segundo mais antigo do Brasil, construído ainda no tempo do Império”, observou. “Nós até podemos construir um atrativo turístico como uma roda gigante ou um restaurante giratório no alto de uma torre, mas não temos como construir um patrimônio histórico”, disse.

O presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, Rafael Passos, defendeu a necessidade de construir caminhos para solucionar o impasse do Mercado, pela simbologia do local, por sua diversidade cultural e seu caráter público e democrático. “Não precisamos de mais shopping centers”, apontou.

Abertura do segundo piso e financiamentos

O secretário-adjunto da Secretaria de Parcerias de Porto Alegre, Jorge Murgas, disse que a abertura do segundo piso era uma prioridade do prefeito Sebastião Melo, bem como a recuperação da parte elétrica do espaço. A intenção era que isso se desse até o aniversário de 250 anos da cidade, em março do ano que vem. Disse ainda que havia sido feito um chamamento público para doação de tintas e materiais para restauro e recuperação da fachada externa e que licitação prévia havia restado deserta.

A promotora de Justiça Annelise Steigleder disse que o tema do Mercado Central dizia respeito ao Ministério Público por diversos aspectos e que a sua promotoria especificamente vinha trabalhando com o registro de bens materiais e imateriais. Contou que haviam constituído um grupo de trabalho com a intenção de elaborar um termo de cooperação para o registro dos bens e que, como o assunto era relativamente novo, vinham reunindo experiências na área.

Agora, segundo ela, vinham buscando identificar os custos para a realização dos registros, o que iria envolver estudos arquitetônicos, entrevistas, e parcerias com universidades e formas de financiamento, uma vez que os recursos para a Cultura eram bastante limitados. Pediu o apoio e a união de todos para a arrecadação de recursos que, segundo ela, resultariam em um projeto transformador para a cidade.

O arquiteto e diretor do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE), Renato Savoldi, corroborou a fala anterior ao registrar que o Rio Grande do Sul possuía uma legislação de patrimônio imaterial. Segundo ele, no último dia 10 de agosto havia sido publicada normativa para apresentação e recebimento de demandas para o registro de patrimônio imaterial.

A assessora de Gabinete do Procurador-Geral do Ministério Público de Contas, Simone Backes, também ressaltou a relevância do tema e disse que o órgão havia proposto uma representação para que fossem averiguados e fiscalizados os recursos disponíveis ao Mercado Público, de 2013 a 2020, tanto referentes ao repasse de verbas federais, como à existência do termo de ajustamento de conduta (TAC) que não teria sido cumprido pelo município, apesar do indicativo de que havia recursos para tal.

* Com informações da Agência de Notícias da ALRS


:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato RS no seu Whatsapp ::

SEJA UM AMIGO DO BRASIL DE FATO RS

Você já percebeu que o Brasil de Fato RS disponibiliza todas as notícias gratuitamente? Não cobramos nenhum tipo de assinatura de nossos leitores, pois compreendemos que a democratização dos meios de comunicação é fundamental para uma sociedade mais justa.

Precisamos do seu apoio para seguir adiante com o debate de ideias, clique aqui e contribua.

Edição: Marcelo Ferreira