Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | Sobre as raízes do nazismo

"O nazismo segue sendo um tema atual, assim como todas as formas de racismo"

"Uma das raízes do nazismo foi o conflito do cristianismo contra os judeus, por estes não aceitarem Jesus Cristo como messias" - Reprodução

Sigmund Freud, no final de sua vida, escreve “Moisés e a Religião Monoteísta” para explicar o antissemitismo. Freud nem sempre acertou, ainda bem, mas revela no livro sua paixão por Moisés em busca por saber o que é um pai. Sempre acreditou na sua invenção em “Totem e Tabu”, no qual um assassinato do pai onipotente pelos filhos teria mudado a história da humanidade. O “Moisés” de Freud foi escrito entre 1934 e 1938 na ascensão do nazismo. Hoje ainda se pergunta sobre a atualidade desse movimento de extrema direita que gerou o antissemitismo redentor.

O nazismo segue sendo um tema atual, assim como todas as formas de racismo. Aliás, alguns buscam definir os seguidores de Hitler como socialistas, como fizeram aqui um ex-ministro do Exterior e o próprio presidente. Historiadores de Israel e Alemanha escreveram o que todo mundo sabe: o nazismo foi e é de extrema-direita. Aliás, as ditaduras e o autoritarismo usam e abusam das mentiras, e assim o ódio obscurece a razão de boa parte da população.

Uma das raízes do nazismo foi o conflito do cristianismo contra os judeus, por estes não aceitarem Jesus Cristo como messias. Foram séculos de tensões, perseguições como nas Cruzadas, e na longa Inquisição. No caso da Alemanha, tudo piorou quando se publica o livro “Sobre os judeus e suas mentiras”, de Martinho Lutero. Este incomodado porque os judeus não se uniram a ele no combate ao Vaticano, passa a defender a perseguição aos judeus, destruição dos seus bens religiosos, confisco de seu dinheiro. Para Hitler havia três grandes personagens da história alemã: Lutero, Frederico, o grande, e Richard Wagner, como escreveu em seu “Mein Kampf”.

Para conhecer as raízes do nazismo indico a leitura “Os Alemães”, livro que Zygmunt Bauman considera a obra-prima de Norbert Elias. Analisa o comportamento prussiano e depois alemão a partir do “habitus”, que é um saber social incorporado, em especial nos séculos XIX e XX. O “habitus” é a herança cultural adquirida como o hábito da bebida, do duelo, da educação severa nos séculos. Em um filme psicológico, de alta tensão, “Fita Branca”, do diretor austríaco Michael Haneke, esse revela a educação repressiva que antecedeu o regime nazista.

Importante também foi à vingança pela derrota a crise capitalista de 1929, conhecida como a grande depressão, a quinta-feira negra – dia 24 de outubro –, que mudou o mundo. O nazismo foi o beneficiário direto dessa crise, pois nas eleições de 1928 tiveram 2% dos votos, em 1930, 15%, e em 1932, 31,2%. Os votos vieram dos desempregados, da classe média assustada pela insegurança econômica.

Em junho de 1934, o ministro da Justiça do Reich, Franz Gürtner, expôs as medidas legais dos Estados Unidos para lidar com os grupos marginais, e proteger os cidadãos brancos. Desejavam institucionalizar o racismo no Terceiro Reich e para isso recorreram nazismo seguiu a extrema direita na lógica da guerra de castas, os humanos e os sub-humanos. Essa paixão racista na Alemanha contra os judeus, ou o racismo estrutural dos Estados Unidos e Brasil revelam o sistema de casta. Desafiar as castas pode ser inglório, mas resignar-se é ser cúmplice da pior das crueldades.

Theodor Adorno escreveu em 1946 sobre os nazistas algo que pode estar presente hoje: “Se excitam com a ideia da ruína inevitável, sem sequer diferenciar claramente entre a destruição de seus inimigos e a de si mesmos”. (Publicado no Facebook do autor, em 15/10/2021)

* Abrao Slavutzky é psicanalista, autor de vários livros, entre eles: "Psicanálise e cultura", "Para início de conversa", com Cyro Martins, "Quem pensas tu que eu sou", "Humor é coisa séria", entre outros.

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Terapia Política