Paraná

Preconceito

Imigrante negro relata dificuldades e racismo em Curitiba

Conseguir documentos, emprego e moradia são alguns dos desafios de quem chega à capital do Paraná, sobretudo haitianos

Curitiba (PR) |
Wilnar Rosier veio do Haiti, tem 34 anos, é formado em Turismo e está desde 2011 no Brasil - Foto: Giorgia Prates

De acordo com dados do Ministério da Economia e do Trabalho, nos últimos dez anos, o número de imigrantes em Curitiba praticamente triplicou. Desse número, quase 40% são formados por haitianos, com também a presença de argentinos, paraguaios, portugueses, chilenos e venezuelanos, que vêm para a cidade em busca de uma vida melhor.

Esse é o caso de Wilnar Rosier, 34 anos, formado em Turismo, e que está desde 2011 no Brasil. Haitiano, oriundo da cidade de Gonaives, quarta maior cidade do país, entrou em solo brasileiro via fronteira do Acre, como muitos de seu país que vieram para cá em busca de oportunidades e para fugir das dificuldades de um Haiti assolado por pobreza generalizada e catástrofes naturais como terremotos que assolaram a capital, Porto Príncipe.

Wilnar conta que. quando veio para o Brasil, instalou-se primeiramente em Porto Alegre e, depois, em Curitiba, onde está há oito anos, mas que já viajou por outras partes do Brasil. “Passei pelo Rio de Janeiro, Foz do Iguaçu, Salvador, muitos lugares antes de chegar aqui.” Rosier mora em uma ocupação urbana, na Vila União, no Tatuquara, em Curitiba. “Se não fosse por Deus e essa ocupação, estaria morando na rua, está muito difícil para conseguir emprego”, diz.

O turismólogo sofre do mesmo problema de diversos imigrantes que chegaram ao Brasil, mas precisam renovar seus documentos e enfrentam atrasos na Polícia Federal para os agendamentos. “Sem os documentos, não consigo trabalhar, e com a pandemia minha situação financeira piorou”, relata.

Wilnar tem uma filha de 11 anos, que deixou no Haiti, e, mesmo formado em Turismo, está buscando fazer outra faculdade. “Já faz um bom tempo que não consigo enviar dinheiro para minha filha por conta das dificuldades que estamos passando”, revela. O haitiano está desde março tentado renovar sua documentação, mas não consegue resposta por parte da Polícia Federal, em Curitiba.

Para a secretária regional da Cáritas, confederação de 165 organizações humanitárias da Igreja Católica que atua em mais de 200 países, Márcia Ponce, com a pandemia as dificuldades para vários imigrantes conseguirem renovar seus documentos pioraram. “As dificuldades aumentaram sobretudo no Paraná, temos relatos de agendamentos para junho do ano que vem. Estamos lidando com número muito reduzido de atendimentos”, diz.

Além da dificuldade burocrática, vários imigrantes também esbarram na empregabilidade. Wilnar revela que já passou por situações de constrangimento em algumas empresas. “Já fui impedido de me candidatar em uma vaga por ser haitiano, a empresa disse que não era racismo da parte deles, mas dos clientes que eles atendem”, conta.

Seu caso não é isolado. Márcia Ponce conta que a Cáritas vem recebendo diversos relatos parecidos com o de Wilnar, uma situação que, segundo ela, tem a ver com o aumento de grupos de ódio no Brasil e em Curitiba. “Isso é resultado desse movimento que temos no mundo, e mais especificamente no Brasil, fascista de ódio, e quem tem se intensificado”, afirma.

Ela ainda lembra que, como Wilnar, muitos chegam ao Brasil com qualificação, mas acabam tendo diversas dificuldades para revalidar seu diploma. “Tem pessoas extremamente capacitadas que chegam aqui e o Brasil não investe um centavo. Temos uma dificuldade enorme para revalidar os diplomas no país. Estamos fazendo um processo de sensibilização com as empresas e o MPT [Ministério Público do Trabalho] para mostrar para as empresas a importância de se abrirem para a questão da diversidade”, explica Márcia.

A reportagem do Brasil de Fato Paraná entrou em contato com a Polícia Federal para entender se existe algum problema específico nos processos de documentação de imigrantes. Até o fechamento desta reportagem, não obteve resposta.

Edição: Frédi Vasconcelos e Lia Bianchini