Rio Grande do Sul

Políticas Culturais

Conselho Estadual de Cultura pede retirada de regime de urgência do PL que tira sua autonomia

Comunidade cultural do estado só tomou conhecimento do PL que altera o Conselho quando do recebimento na Assembleia

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Entidades culturais do estado pedem que o governo retire regime de urgência do PL 418/2021 antes que este seja apreciado no plenário da ALRS - Foto: Joel Vargas (ALRS)

O Conselho Estadual de Cultura (CEC), junto de 18 ex-presidentes e 21 entidades culturais, pede que o governador Eduardo Leite (PSDB) retire o regime de urgência do Projeto de Lei 418/2021, conhecido como PL do CEC, que muda a estrutura do Conselho.

A comunidade cultural do estado afirma que não teve acesso ao PL nem a oportunidade de debatê-lo, nem mesmo os integrantes do próprio CEC, a ponto de só tomar conhecimento de sua existência no momento em que o PL foi enviado à Assembleia Legislativa do RS.

Segundo afirmam os membros do Conselho, a iniciativa da Secretaria Estadual da Cultura em alterar a lei do CEC veio em um momento inoportuno, já que os artistas estão ainda abalados pela pandemia e lutando para sobreviver. Afirmam também que o texto não foi discutido com os 12 colegiados setoriais, nem mesmo com o Conselho Estadual de Cultura, e que o regime de urgência impede que a nova lei seja debatida com a comunidade cultural.

Reforçam que entre os muitos problemas da nova lei está a interferência do governo na eleição dos conselheiros que representam a sociedade civil no colegiado, algo que afirmam ser incompatível com o artigo 225 da Constituição do RS, que criou o CEC e lhe garante autonomia por ser uma instituição de Estado.

Confira a seguir as duas cartas endereçadas ao governador. A primeira, elaborada e assinada em conjunto por 18 ex-presidentes do Conselho Estadual de Cultura. A segunda, assinada por 21 entidades culturais atuantes no RS.

Carta dos ex-presidentes enviada ao governador Eduardo Leite

Ao Excelentíssimo Senhor Governador do Estado do Rio Grande do Sul

Nós abaixo assinados, 18 (dezoito) ex-presidentes do Conselho Estadual de Cultura do Rio Grande do Sul, vimos por meio desta solicitar uma audiência com Vossa Excelência para tratarmos sobre a retirada do Regime de Urgência do Projeto de Lei 418/2021, conhecido como PL do CEC. Tal pedido se dá em apoio à decisão do Conselho, no mesmo sentido, conforme Ofício 072/2021 – CEC/RS (em anexo), encaminhado à Assembleia Legislativa.

O projeto em questão altera profundamente a estrutura do Conselho Estadual de Cultura e não foi devidamente debatido com a comunidade cultural do Rio Grande do Sul, tampouco com o próprio Conselho.

Além disso, a Justificativa enviada pelo governo à Assembleia Legislativa não expressa a realidade, pois, dentre outras informações incorretas, dá a entender que atendeu às sugestões enviadas pelo Pleno do Conselho, induzindo os parlamentares a concluir que o CEC/RS esteja de acordo com o PL apresentado, o que não corresponde à verdade.

Certos da sua compreensão, reiteramos a necessidade de que seja retirado o caráter de urgência na votação do Projeto de Lei 418/2021 e que sejamos recebidos por Vossa Excelência com a maior brevidade possível.

Atenciosamente:

Airton Ortiz, Antônio Carlos Cortes, Cícero Alvarez, Dael Rodrigues, Dilan Camargo, Fernando Otávio Miranda O'Donnell, Gilberto Herschdorfer, Guilherme Castro, Ivo Benfatto, José Edil de Lima Alves, Loma Berenice Gomes Pereira, Luiz Paulo Faccioli, Marco Aurélio Alves, Maria Valesca Santos de Assis Brasil, Mariangela Grando, Maturino da Luz, Neidmar Roger Charão Alves e Paulo Flávio Ledur.

Porto Alegre, 24 de novembro de 2021

 

Carta das entidades enviada ao governador Eduardo Leite

Tendo em vista o envio do PL 418/2021 PL do CEC, que tramita em regime de urgência na Assembleia Legislativa RS, as entidades da sociedade civil vêm a público manifestar a sua perplexidade diante do fato consumado e sem qualquer possibilidade de discussão com a comunidade cultural do Rio Grande do Sul.

Diante da gravidade e da urgência do assunto, seguem algumas considerações introdutórias sobre o documento produzido pelo Governo do Estado através da Secretaria Estadual da Cultura - SEDAC. Posto que matéria complexa e de grande repercussão, carece ainda de amplo debate e não da forma açodada como tramita, no apagar das luzes do ano Legislativo.

O pedido de urgência para a alteração na Lei nº 11.289/1998, atualizada pela Lei n.º 14.471, de 21 de janeiro de 2014, não encontra fundamento para tal tratamento. O Projeto de Lei 418/2021 foi elaborado de forma unilateral, pela Secretaria de Estado do Rio Grande do Sul (SEDAC), impedindo a participação daqueles que criaram a lei a ser alterada, e de sequer argumentar, ponderar, emitir pareceres contrários ou colaborativos a proposta.

O ofício do Governador à ALERGS, requerendo urgência de tramitação, indica que "a justificativa que acompanha o expediente evidencia as razões e a finalidade da presente proposta". Assim, na justificativa, encontra-se, como motivação, a necessidade de ampliar a participação regional, das entidades e a da representatividade, mas, na prática, a propositura afasta-se dessa intenção, uma vez que não houve a efetiva participação da comunidade cultural na elaboração do PL.

A ideia de alteração da lei que "dispõe sobre a organização, funcionamento e atribuições do Conselho Estadual de Cultura" (CEC) veio à tona em março deste ano. Desde então, os conselheiros e membros dos colegiados procuraram saber quais as modificações a ser propostas pela SEDAC, mas não obtiveram êxito. O CEC, mesmo ante controvérsias internas e questionamentos de representantes da comunidade cultural, elaborou Minuta de PL, a qual foi encaminhada à Sedac. Não houve em momento algum uma devolutiva por parte da Sedac; apenas um Ofício ao CEC afirmando que o debate se daria diretamente na Assembleia Legislativa, o que fica deveras comprometido em função do Regime de Urgência dado ao PL.

Da mesma forma, a comunidade cultural requereu à ALERGS uma audiência pública com a secretária Beatriz Araújo, que ocorreu em 9 de julho de 2021, para tratar do tema e estabelecer o diálogo. A secretária participou no início da reunião e, apesar de não apresentar o teor do PL, afirmou que só enviaria o "texto legal para Assembleia depois de consultas e de ouvir o atual Conselho", o que não ocorreu.

Portanto, a retirada do pedido de regime de urgência do PL 418/2021 é indispensável, para que um assunto tão importante seja tratado com transparência e de forma democrática, assim como, com a colaboração dos diretamente interessados. Resumidamente, estes são os pontos que fundamentam este pedido:

1. O momento inoportuno para alteração da Lei do CEC, posto que a classe artística está preocupada em buscar sua subsistência, visto ser um dos setores mais afetados pela pandemia – o que foi manifestado por representações da comunidade tanto ao Conselho Estadual de Cultura, quanto em Audiência Pública realizada pela Assembleia Legislativa (supracitada)

2. A indisponibilidade de acesso ao teor do PL antes de ter sido enviado à ALRS, impedindo a instrumentalização dos agentes culturais no debate;

3. Solicitação de ampliação do prazo feito por vários segmentos culturais, ao longo do processo de elaboração de forma unilateral do PL e, mais uma vez, agora;

4. Implementação do Sistema Estadual de Cultura, que tem no CEC e Colegiados, órgãos de articulação, pactuação e deliberação (conforme a Lei. n.° 14.310/2013);

5. O PL altera as competências do CEC, reduzindo seu poder de fiscalização e retirando parcela da autonomia que lhe é assegurada pela Constituição Estadual, como por exemplo, construir o regulamento eleitoral dos membros da sociedade civil, bem como o cadastro e habilitação das entidades aptas a participar das eleições;

6. Diferenciação na possibilidade de recondução ao mandato para indicados do governo (sem fixação de impedimento de reeleição) e da sociedade civil (não podendo ser reeleitos);

7. A justificativa para a PL indica a regionalização do CEC. No entanto, não se apresenta uma definição de como seriam eleitos os representantes regionais, nem quais segmentos estão inseridos. Ante ao exposto, e sem prejuízo de outros motivos, a retirada do regime de urgência vai possibilitar que se debata, de fato, as mudanças propostas pela SEDAC, no sentido de resguardar a participação popular e a transparência do processo, de forma a fortalecer as instituições, o Sistema Estadual de Cultura, a cadeia cultural e, é claro, a cultura do Rio Grande do Sul.

Cordialmente:

ARL - Academia Rio-Grandense de Letras, AGES - Associação Gaúcha de Escritores, IAB – RS Instituto dos Arquitetos do Brasil, SAERGS - Sindicato dos Arquitetos no RS, Siav - Sindicato da Industria Audiovisual do Estado do Rio Grande do Sul, APTC - Associação Profissional dos Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul, Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado do Rio Grande Do Sul – SATED/RS, Associação de Circo do Rio Grande do Sul, Associação Gaúcha de Dança- ASGADAN, Associação Pró-Dança, Associação Cultura Articula Dança RS, Associação dos Músicos da Cidade Baixa - AssoM-CB, Associação Rio-grandense de Artes Plásticas Francisco Lisboa, Associação Artística e Cultural da Periferia ARB, Associação Rio-grandense de Bibliotecários,  Instituto Zoravia Bettiol, Rede de Bibliotecas Comunitárias – Beabah, Instituto da Pessoa, Reinações, Ong Cirandar (CMLL) e CRB-10 -Conselho Regional de Biblioteconomia.

Porto Alegre, 26 de novembro de 2021


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Edição: Marcelo Ferreira