Paraná

Entrevista

Nena Inoue: "A gente sabe nadar contra a corrente"

Em entrevista ao BdF-PR, a atriz fala das dificuldades de ser artista de teatro nestes difíceis anos da pandemia

Curitiba (PR) |
"Ser artista de teatro neste país é um ato de coragem", afirma a atriz - Foto: Annelize Tozetto

Nesta quinta (17), o Brasil de Fato Paraná lançou sua última edição de 2021: uma retrospectiva do ano. Na página de Cultura, a atriz Nena Inoue falou sobre os desafios enfrentados pela classe artística em mais um ano pandêmico, com pouco incentivo governamental para amenizar a crise que se alastrou no setor. 

Confira a entrevista completa:

Brasil de Fato Paraná - Como foi 2021 para os artistas, como você, que trabalham no teatro? 

Nena Inoue - Foi difícil, porque a gente é do presencial, é aglomerador por natureza, a gente não conseguiu exercer nosso trabalho, levar para o público presencialmente... Mas a gente se reinventou, vem se reinventando desde sempre. A gente continua sendo persona non grata neste governo, que a primeira coisa que fez foi extinguir o Ministério da Cultura, e aqui no Paraná a gente teve a extinção da Secretaria da Cultura.

Esses negacionistas de hoje sempre existiram. A gente sempre nadou contra a corrente. Às vezes a favor, mas a gente sabe nadar contra a corrente. Não nos intimidamos e fomos à luta. Nosso trabalho, que é presencial, virou online, alguns ao vivo, outros não. E fomos dizendo que estávamos aqui presentes. Mais importante que ficar discutindo se teatro é só presencial ou não, se online não é teatro, é dizer que a gente está aqui. Porque é um governo que não nos quer, e temos de dizer que a gente está aqui, estamos trabalhando.

Como sobreviver em tempos tão duros? Com quase dois anos sem público?

Continuei fazendo meus espetáculos dentro das limitações, fiz pro Sesc ao vivo, fiz pros festivais, fui fazendo... Fiz agora, no mês passado, para a prefeitura de Pinhais, abrindo o festival.

A gente foi se virando, que é o que a gente faz sempre. Ser artista de teatro neste país é um ato de coragem. E coragem a gente tem. Mas os grandes prejudicados foram, em especial, os técnicos. Quem lidava com audiovisual acabou tendo trabalho, mas os outros, não. Operador de luz, operador de som, contrarregra, maquinista, a gente da carpintaria teatral, figurinistas, cenógrafos, coreógrafos, que não conseguiram exercer seus trabalhos.

Houve editais, como da Lei Aldir Blanc, que apesar de um erro atrás do outro, da obtusidade, do negacionismo e ignorância das instituições, aqui em especial da superintendência de cultura, a gente conseguiu trabalhar com alguns editais. E a Aldir Blanc é o maior dinheiro que a cultura já recebeu na história deste país, e que foi uma conquista dos trabalhadores da cultura, com políticos como a Benedita (Da Silva, PT), Jandira Feghali (PCdoB), que encamparam essa bandeira. Com todos os erros dos governos... Mesmo liberando o dinheiro, eles dão um jeito de dificultar, porque eles não nos querem, mas a gente existe independente deles.

Então, os artistas de teatro continuaram a fazer o seu trabalho, com uma outra linguagem, outro meio, outra ferramenta, que foi a câmera.

Quais são as perspectivas a partir de agora?

Para o ano que vem, é continuar de onde estamos, não de onde parou no começo da pandemia. É seguir e entender que essa pandemia trouxe muita coisa, muita morte, muito negacionismo, muito de tudo. Mas que a gente não é mais o mesmo, nesses dois anos, mudou, porque ou a gente muda ou morre.

A perspectiva é que se tenha um pouco mais de consciência coletiva, de consciência sobre a terra, sobre os seres, a flora, a fauna, nosso território, nosso lar. É impressionante que, no Brasil, a cada dia se caminha para trás, ainda mais com este governo.

A perspectiva é que as pessoas se vacinem, que não se aglomerem neste final de ano, no Natal, Réveillon, Carnaval, pra que a gente consiga manter o que o SUS vem fazendo, que a gente continue fazendo o que a gente faz, que é levar nossa arte para todos. Porque a arte salva, é necessária.

Nesta pandemia ficou clara a função da arte na vida das pessoas, na vida do dia a dia, e que a gente tenha um olhar um pouco mais coletivo e generoso, especialmente com esse planeta, que a gente tem destruído.

Edição: Lia Bianchini