Rio Grande do Sul

Coluna

RS será o último estado do país a vacinar crianças contra a covid-19

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Indígena Davi Seremramiwe Xavante, de 8 anos, foi a primeira criança vacinada contra a covid-19 no Brasil, no dia 14, em São Paulo - Foto: Governo de São Paulo
Trata-se de um atestado de incompetência e de falta de priorização das crianças e da educação

Ontem fez um ano que iniciou a vacinação contra a covid-19 no Brasil, ao passo que as crianças de 5 a 11 anos, somente agora, depois de mais de um mês da autorização da Anvisa, começam a ser vacinadas nos estados, por conta de flagrante boicote do governo federal à ciência e à vacinação pediátrica, em especial. No RS, é ainda mais grave, pois a vacinação só começará na quarta (19), uma semana depois do início em vários estados, sendo o RS o último a vacinar as crianças nessa faixa etária, mesmo com as evidências de sequelas e mortalidade da doença, também para esse público, entre os não vacinados, e da importância desse grupo se vacinar para proteger também a coletividade.

A cada dois dias pelo menos uma criança de 5 a 11 anos foi vítima letal da covid-19 no Brasil. No RS, são 13 vidas perdidas nessa faixa etária. Os efeitos negativos poderiam ter sido ainda piores se não houvesse a quarentena da educação, sobretudo no pior momento da pandemia – em março e abril de 2021, quando a Associação Mães e Pais pela Democracia (AMPD) ingressou com a Ação Civil garantindo liminar pelo Poder Judiciário que suspendeu as aulas em bandeira preta em todo o estado.

Milhões de crianças nos últimos dois anos estão afastadas das escolas e do convívio social, justamente aguardando a almejada e necessária vacinação. E, no mês que vem, as aulas recomeçam novamente sem a vacinação da maioria delas, como já havia anunciado a Secretária de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul antes da chegada das vacinas. Trata-se de um atestado de incompetência e de falta de priorização das crianças e da educação gaúchas, que vai de encontro ao discurso midiático do governo estadual, também nessa área.

Crianças com deficiência e com comorbidade, quilombolas e indígenas deverão ser as primeiras brasileiras a serem vacinadas. São 40 milhões de doses necessárias para imunizá-las no país e só há 30 milhões de doses para o primeiro trimestre do ano. Davi Xavante, indígena de oito anos, foi a primeira criança brasileira a ser vacinada na sexta-feira, dia 14, em São Paulo. Viva a vacina e viva o SUS!

É impressionante que haja toda essa lentidão, mesmo quando 68% da população brasileira aderiu à vacinação e está com imunização completa até agora, e com 79% dos brasileiros favoráveis à vacinação de crianças de 5 a 11 anos, conforme pesquisa realizada pelo Datafolha com 2.023 pessoas na quarta passada, publicada domingo (16) na Folha de S. Paulo. Não se justifica tamanha morosidade para vacinar esse público, sobretudo quando a Anvisa aprovou a vacina em 16 de dezembro de 2021 e as crianças gozam de proteção integral aos seus direitos pela Constituição Federal, Convenção Internacional do Direito das Crianças e Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Não é por acaso, portanto, que, ainda segundo essa pesquisa, 58% dos brasileiros declaram saber que Bolsonaro está mais para atrapalhar do que para ajudar a vacinação infantil. Tanto quanto um crime de responsabilidade, mais um, diga-se de passagem, praticado pelo presidente, está-se diante de responsabilidade de ordem administrativa, prevista no art. 249 do ECA, a exigir uma atuação firme e proativa dos Conselhos Tutelares, Polícias e Ministério Público pró-vacinação das crianças por suas famílias e responsáveis.

Como entende a maioria dos brasileiros na pesquisa, o governo federal atrapalhou, porque perdeu tempo ao não fazer a compra dos imunizantes, promovendo uma audiência pública intempestiva e imprópria junto ao Senado, já que as principais entidades da área, como a Sociedade Brasileira de Pediatria, já haviam manifestado apoio à vacina da covid-19 para crianças como medida profilática para prevenir a covid longa, a Síndrome Inflamatória Multistêmica e a mortalidade. A audiência foi um desserviço, atrasou-se em 29 dias a vacinação de crianças no Brasil (no RS será superior a um mês) e rendeu a difusão de fake news pelo famigerado movimento antivacina (infantil) no país. Como se não bastasse, fez uma consulta pública enviesada para tentar dificultar à vacinação em massa das crianças e das mais pobres com a exigência da prescrição médica à vacinação, questão esta que foi rejeitada na consulta, sendo aprovada a vacinação infantil pela ampla maioria dos seus participantes – sem essa exigência. Apesar dessa derrota, que fez com que o governo declinasse da obrigatoriedade da prescrição médica da vacina, o presidente e o ministro da Saúde saíram vitoriosos (sic!), ao atrasar o processo de vacinação, ganhando força junto a esses grupos antivacina e negacionistas de toda a espécie, lamentavelmente.

Foi somente na última quinta (13) que as vacinas pediátricas da Pfizer chegaram no Brasil, em um contexto de crescimento expressivo de casos ativos em todo o país por conta da variante ômicron - com recordes diários no mundo. Isso porque as hospitalizações e mortes decorrentes da covid-19 na atual fase no Brasil se devem em 90% àqueles(as) que não se vacinaram ou têm vacinação incompleta (sic!). Ademais, não é possível controlar a pandemia sem a testagem em massa da população. Todavia, o que se tem verificado, contraditoriamente ao que apontam as melhores práticas e evidências científicas, é uma brutal redução da política dos testes RT-PCR, com o racionamento de testes e a testagem somente para casos graves, pasmem!

Para dificultar ainda mais, o segundo lote de vacinas para crianças, que chegou aos estados nesta segunda-feira, estava aparentemente mal acondicionado. Vacinas espalhadas em caixas de papelão, soltas no gelo, em uma distribuição realizada por uma empresa contratada de forma emergencial, com dispensa de licitação pelo Ministério da Saúde, sem expertise em logística e com um contrato vultoso, que chegará até o final do ano a R$ 62,2 milhões. Absurdo! Isso é boicote à vacinação! É um atentado contra a vida das crianças, contra nossas filhas e filhos!

É urgente que as crianças, uma vez vacinadas, retornem à escola e aos diferentes espaços de socialização! E possam estar protegidas de surtos e de novas variantes da covid na pandemia, como a ômicron! #vacinaparacriancasja #apressavacinaparacriancas

* Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira