Rio Grande do Sul

Meio Ambiente

Empresa que já teve estudo ambiental considerado ‘falso e omisso’ ganha nova licitação

Prefeitura de Porto Alegre diz que empresa é apta a participar da licitação

Sul 21 |
Inquérito da Polícia Civil apontou irregularidades no Estudo de Impacto Ambiental feito para projeto na Fazenda do Arado - Foto: Luciano Pandolfo/Smamus PMPA

A empresa Profill Engenharia e Ambiente S.A venceu mais uma licitação da Prefeitura de Porto Alegre para atuar na área ambiental. Contratada como consultoria especializada pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), a empresa irá elaborar o mapeamento e a caracterização das Áreas de Preservação Permanente (APP) da Capital.

Segundo a Smamus, o estudo permitirá a criação de um sistema integrado de gestão, incluindo mapeamento, categorização, fiscalização, recuperação e monitoramento. A secretaria estima que os resultados do trabalho poderão ser integrados ao processo de revisão do Plano Diretor de Porto Alegre. O valor total do contrato é de R$ 634 mil.

Em novembro do ano passado, a Profill Engenharia e Ambiente S.A também foi contratada pelo governo do prefeito Sebastião Melo (MDB) para elaborar o Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica. Para esse trabalho, o contrato entre a Smamus e a empresa tem vigência de 12 meses, no valor de R$ 605 mil.

Apesar de obter contratos para a execução de trabalhos importantes na área ambiental na Capital, a empresa teve seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) feito para subsidiar o projeto imobiliário na Fazenda do Arado, em Belém Novo, declarado em parte como “falso/enganoso/omisso” em laudo do Instituto Geral de Perícias (IGP), em inquérito da Polícia Civil concluído em maio de 2021. Na conclusão do inquérito, a Polícia Civil afirma ter havido alteração nos mapas geológicos da área, omissões sobre a existência de fauna ameaçada de extinção, entre outras falhas técnicas.

O EIA/RIMA feito pela Profill Engenharia e Ambiente S.A para subsidiar o projeto imobiliário na Fazenda do Arado foi produzido em 2012, como exigência do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental (PPDUA). Após a elaboração do estudo, entretanto, surgiram dúvidas com relação a diferentes aspectos técnicos. Como as explicações dos responsáveis pelo empreendimento não foram consideradas satisfatórias, o estudo ambiental virou assunto de polícia.

Entenda o caso

Em dezembro de 2018, um inquérito policial foi aberto e a Direção do Departamento de Criminalística enviou uma equipe de peritos ambientais à Fazenda do Arado, com o objetivo de apurar denúncia de irregularidades e omissões no EIA/RIMA elaborado pela empresa Profill Engenharia e Ambiente S.A.

Na ocasião, parecer do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) apontou irregularidades nos estudos sobre o estágio da Mata Atlântica na Ponta do Arado e sobre espécies ameaçadas, além da baixa altura do terreno nas áreas próximas ao Guaíba, em nível inferior ao estipulado pelo Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) para a construção de empreendimentos. A baixa altura exigiria um grande aterro dentro da Área de Preservação Permanente (APP).

Outra acusação, feita pelo Coletivo Ambiente Crítico, tratava da omissão do termo Sistema Barreira Laguna IV, o que reduziria a sensibilidade ambiental da área e, portanto, beneficiaria o empreendimento. O Coletivo também apontou alteração nas cores do mapa sobre os sistemas lagunares, não diferenciando as classes de terreno e, novamente, podendo favorecer o projeto imobiliário.

A conclusão do inquérito policial que investigou a prática de crime contra a administração ambiental ocorreu em maio de 2021. Nele, a Polícia Civil afirma ter havido alteração nos mapas geológicos da área, e que o EIA não explicou os critérios utilizados para diferenciação entre “áreas úmidas” e “banhados”. As áreas de banhado impactam na definição das Áreas de Preservação Permanente (APP).

No topo do Morro do Arado, o inquérito policial também concluiu que houve omissão nos mapas do EIA sobre a existência de Área de Preservação Permanente (APP). Conforme o plano do empreendimento, no local está prevista a construção de um hotel.

A Polícia Civil ainda concluiu ter havido omissões sobre a existência de fauna ameaçada de extinção, como o gato-maracajá, entre outras falhas do EIA em relação às exigências do Termo de Referência da Secretaria Municipal do Meio Ambiente.

Diante dos elementos apontados no laudo do Instituto Geral de Perícias (IGP), o inquérito policial concluiu que o Estudo de Impacto Ambiental do projeto imobiliário é “falso ou enganoso, inclusive por omissão”.

Outro lado

Em contato com a reportagem do Sul21, a Prefeitura explica que a empresa foi considerada apta a participar da licitação e, portanto, homologada como a vencedora.

“A Prefeitura de Porto Alegre, por meio da Diretoria de Licitações e Contratos da Secretaria Municipal de Administração e Patrimônio, procedeu processo de licitação para contratação de consultoria especializada para elaborar o mapeamento e a caracterização das Áreas de Preservação Permanente (APP) no Município de Porto Alegre/RS. O edital estabelece as condições para participação. A empresa foi considerada apta e homologada como a vencedora”, diz a nota da Prefeitura.

O Sul21 também fez contato com a empresa e, até o momento da publicação da reportagem, não recebeu retorno. O posicionamento da empresa será acrescentado tão logo ocorra.

Entre os objetos do estudo que deverão ser feitos pela empresa no mapeamento e caracterização das Áreas de Preservação Permanente (APP) da Capital estão: identificar e mapear os locais de incidência de APP em Porto Alegre; determinar a superfície total das microbacias hidrográficas das áreas em análise; determinar a área total das diferentes categorias de APPs (cursos d’água, nascentes, topos de morros); e determinar a área total de vegetação existente em APPs; assim como determinar quantas nascentes ocorrem nas microbacias hidrográficas das áreas em análise.

O trabalho também deverá categorizar as APPs conforme valor ecológico, estágio de conservação e grau de ameaça, indicando as áreas prioritárias para recuperação da vegetação nativa, assim como as ações preventivas ao desmatamento ou destruição dessas áreas; elaborar Mapa Cartográfico delimitando as APPs em seus diferentes graus de conservação ou ameaça; e, por fim, identificar quais as APPs estão mais aptas às ações de regularização fundiária de interesse social ou específico, conforme previsto nos artigos 64 e 65 da Lei Federal nº 12.651/2012, e quais as que devem ser objeto de reassentamento prioritários, balizados por aspectos ambientais, econômicos e sociais.

Edição: Sul 21