Rio Grande do Sul

Coluna

Dor, muita dor

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"Os tempos estão difíceis. Ainda bem que as mulheres, no seu dia, 8 de março, saíram às ruas aos milhares" - Foto: Jorge Leão
A dor não há de prevalecer. O ESPERANÇAR de Paulo Freire há de trazer luz e iluminar o horizonte

Quase não há mais palavras. Dor, muita dor, quanta dor todos os dias, todas as semanas. O mundo está doente.

Dias atrás foi a partida do José Carlos Zanetti da CESE, Coordenadora Ecumênica de Serviço, grande companheiro, conhecido e reconhecido como revolucionário amoroso.

Na minha comunidade, São Luiz de Santa Emília, Venâncio Aires, faz pouco foi a partida prematura da vizinha de casa Cleonice König e, dias antes, da sua mãe Agnes König.

Domingo passado, 06.03.2022, foi um dia do cão, no ditado popular. Primeiro, notícia de ameaça de AVC e hospitalização da amiga de muitos anos, Fátima Fischer, felizmente já em casa e em recuperação. Depois, fui fazer contato para acertar minha ida ao Sul da Ilha de Florianópolis, praias da Armação, Matadeiro, depois de dois anos de ausência. Fiz o contato com a amiga Denise. Depois de várias tentativas, conversei com seu filho Gui. E a notícia triste: “Mamãe acabou de falecer há alguns dias. Podes acertar tua vinda comigo.”

Lembro que na última conversa com Denise, início de 2020, no começo da pandemia, antes de voltar para o Rio Grande, eu lhe disse que, possivelmente, as aulas parariam e ela não poderia mais levar alunos para a escola todos os dias, uma de suas fontes de renda. Chegarei em Floripa nos próximos dias, e vou fazer as devidas homenagens para quem sempre cuidou de mim na ilha paradisíaca. Mas sem sua presença física, e sem suas boas conversas.

Para terminar o domingo, dia do cão, fiquei sem energia em casa do meio-dia até as 21h, por causa da chuva e do temporal em Porto Alegre. Fui ´obrigado´ a voltar a Santa Emília, anos 1950, e jantar à luz de velas! Pena que não tenho lampião das antigas no apê!!!

Que tempos! Mas tem mais, muito mais.

A guerra está lá longe, com seus bombardeios e suas mortes insuportáveis, de consequências imediatas e futuras imprevisíveis, o temor de uma guerra nuclear, a tristeza, os refugiados, etc., etc., em pleno século XXI.

Os atos de racismo acontecem todos os dias, Brasil afora, cada vez mais presentes, numa escalada sem fim. Muitas vezes atos e atitudes associadas ao machismo - nem preciso falar de Mamãe Falei e de tantos outros personagens -, as mortes e assassinatos em decorrência, a violência, especialmente contra mulheres negras e o povo pobre das periferias, o ódio e a intolerância que só crescem.

O neofascismo fica cada vez mais explícito cada dia. E aparecem grupos nazistas, organizados especialmente no Sul do Brasil, ameaçando a democracia e a paz.

E não poderiam faltar, neste contexto, e cada vez mais presentes, as brigas e a violência no futebol, em grau acelerado, mostrando que não há convivência pacífica e alegria, até no amado futebol.

Seca, tempestades, falta de água e luz em todos os lugares. No Rio Grande do Sul, onde quase não chove há meses, há uma seca braba, a maior em décadas. Mas quando vem a chuva, ela vem acompanhada de tempestades. E falta energia, e falta água, especialmente nas periferias, onde moram os pobres, com governos ineptos, que privatizaram quase tudo. As pessoas sofrem: estraga o pouco que ainda têm na geladeira, casas são destelhadas, o caos. O povo obrigado a viver com fornecimento de água dos caminhões-pipa por dias, semanas.

Porto Alegre e o Rio Grande do Sul estão em colapso. Isso mesmo, colapso! A capital da democracia em idos tempos, com o OP, o Orçamento Participativo, e o FSM, Fórum Social Mundial, ´um outro mundo possível´, caindo aos pedaços. Quando chove, Porto Alegre e o Rio Grande do Sul param: sinaleiras inativas, desabamentos por todos os lados, falta de água, falta de luz. Dor, muita dor!

E ainda há os acontecimentos de Santa Maria, onde a Irmã Lourdes Dill foi transferida para o Maranhão, de uma hora pra outra, sem aviso prévio e sem transição, depois de décadas de dedicação às causas populares. O esforço e a luta é manter as ações e inciativas da Economia Solidária, o Feirão que acontece todos os sábados com dezenas de feirantes na cidade, e garantir a FEICOOP, Feira Internacional de Cooperação, tudo ameaçado por quem não tem prática de solidariedade, visão de futuro e compromisso com uma sociedade mais justa.

Os tempos estão difíceis. Ainda bem que as mulheres, no seu dia, 8 de março, saíram às ruas aos milhares. Ainda bem que o Papa Francisco, no cuidado com a Casa Comum, anuncia teto, trabalho e terra como prioridades máximas. Ainda bem que logo ali na frente haverá eleições, possivelmente ´a eleição das nossas vidas´. E tentar recolocar o Brasil nos trilhos, com políticas públicas e participação popular, com enfrentamento da fome, da miséria e do desemprego, com democracia, com paz, com justiça e vida digna.

A dor não há de prevalecer. O ESPERANÇAR de Paulo Freire, no meio de tanta dor e sofrimento, na boa luta, com fé e coragem, há de trazer luz e iluminar o horizonte.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko