Distrito Federal

Meio ambiente

Produção sustentável marca assentamentos da reforma agrária no Distrito Federal

Além de alimentos orgânicos, plantio de agroflorestas tem ajudado a recuperar as bacias hidrográficas da região

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Alguns dos alimentos produzidos pelos assentados do DF e vendidos na Feira da Ponta Norte, no Plano Piloto, região central de Brasília - Rafaela Caroline/Divulgação

Enquanto o Brasil vive um processo desenfreado de desmatamento florestal, que tende a piorar a crise climática já vivenciada frequentemente pela população, experiências da reforma agrária mostram que é possível conciliar produção agrícola sustentável com preservação e até recuperação ambiental.

O dia 17 de abril, celebrado este último domingo, marca a data nacional de luta pela reforma agrária. A data é uma homenagem aos 19 trabalhadores sem-terra assassinados em ação da Polícia Militar, ocorrido em Eldorado dos Carajás (PA), no ano 1996, justamente quando protestavam pelo acesso a terra.

:: Em tempos de alta de conflitos por terra, Massacre de Eldorado do Carajás completa 26 anos ::

Para lembrar a memória da luta desses trabalhadores, o Brasil de Fato traz exemplos de como a redistribuição de terra a pequenos agricultores é um passo importante para mudar a lógica da produção agrária no país.

No Distrito Federal, os principais assentamentos ao redor da capital abastecem feiras e distribuem cestas de alimentos orgânicos diretamente para centenas de famílias.  

Alimentos saudáveis

Fundado em 2010, na zona rural de Planaltina, o assentamento Pequeno Willian tem 22 famílias, cada uma dona de uma área de cerca de cinco hectares. A produção é livre de agrotóxicos e oferece uma variedade alimentos. Além disso, tudo que é colhido é direcionado para a Ceasa-DF e programas sociais dos governo federal e distrital.  


Variedade de alimentos saudáveis oriundos da reforma agrária e que chegam na mesa das famílias brasilienses por meio de feiras e venda direta / Rafaela Caroline/Divulgação

"Nossa produção é exclusivamente orgânica, com folhas, hortaliças, tubérculos, como batata, mandioca, abóbora, criação de pequenos animais, panificação e artesanato. Essa é a nossa base. Toda a nossa produção é voltada para feira, Ceasa, PNAE [Programa Nacional de Alimentação Escolas], PAPA [Programa de Aquisição de Produtos Agrícolas, do GDF] e PAA [Programa de Aquisição de Alimentos]", explica Antônio Dias, um dos assentados na comunidade rural.

No maior assentamento rural do DF, o Oziel Alves, também na zona rural de Planaltina, a agricultora Ana Quitéria destaca os itens mais produzidos pelas cerca de 168 famílias da comunidade.

"Plantamos hortaliças, tubérculos e legumes, além de milho, feijão, mandioca e batata doce. Já temos um produtor com produção em grande escala de batata yacon [um tipo de tubérculo rico em fibras]. Também temos criação de galinha e produção de ovos caipiras orgânicos em larga escala", descreve. Grande parte da produção é vendida na Feira Permanente de Planaltina, e também em feiras do Plano Piloto, na região central de Brasília.  

Uma outra área onde agricultores familiares produzem alimentos saudáveis é o Acampamento 8 de Março, que ainda não foi transformado em assentamento regular da reforma agrária, mas abriga algumas centenas de famílias.

Em uma área coletiva de cerca de 14 hectares cedidas para que essas famílias acampadas possam viver, há uma farta variedade agrícola produzida de forma 100% orgânica: hortaliças, frutas e legumes. Ali, alguns alimentos são até processados e se transformam em sorvetes, compostas de pimenta e frutas, além de pães de mandioca. 

:: Em Planaltina, famílias Sem Terra comemoram 10 anos de resistência em acampamento ::

"Uma parte da produção que a gente envia pras cestas solidárias, que é uma campanha permanente do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), de prestar solidariedade às famílias vulneráveis. Essa cesta sai de duas a três vezes por semana semana. A gente entrega também diretamente a consumidores no no Plano Piloto", relata Marcio Heleno, uma das lideranças do acampamento.

Agricultoras e agricultores do 8 de Março também têm parceria com outras organizações sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), na viabilização da cozinha solidária para famílias sem moradia.  

Recuperação ambiental

Na região de Brazlândia, o assentamento Canaã, um dos mais recentes criados no DF, já possui 45 agroflorestas implantadas nas parcelas das famílias agricultoras. Quase todos os meses, um novo mutirão é realizado entre os moradores da comunidade rural para desenvolver um novo projeto de agrofloresta.

:: Vozes Populares | Agrofloresta respeita ciclos da natureza e pensa as questões sociais do campo ::

A técnica consiste na plantação de diferentes espécies, combinando diferentes culturas agrícolas com extensa cobertura vegetal. Por meio de podas e adubação natural, as áreas verdes se adensam no chamado manejo sustentável, sem o uso de qualquer tipo de agrotóxico ou adubação química. 


Mutirões de agricultores do assentamento Canaã, em Brazlândia, ajudam a consolidar a implantação de agroflorestas na região / MST-DF/Divulgação

O resultado vai muito além da produção agrícola saudável, que no Canaã é marcada principalmente pela colheita de hortaliças, frutas e legumes.

O trabalho de implantação de agroflorestas ajuda a regenerar e manter o cerrado de pé e contribui de forma inestimável para ajudar na recuperação da Bacia do Rio Descoberto, uma das mais importantes do DF, que corta grande parte da região oeste da capital. É a partir deste manancial que se abastece o lago do Descoberto, uma das principais fontes de água para o abastecimento urbano de Brasília. 

Situação similar ocorre no cinturão dos assentamentos em Planaltina, como Oziel Alves, Pequeno Willian, Roseli Nunes e Acampamento 8 de março. Todos eles se localizam na Bacia do Rio São Bartolomeu, que corta a região norte do DF, passando por Planaltina, Sobradinho, Paranoá e São Sebastião. Dessas cidades, infelizmente, o rio recebe esgoto não tratado.

A contaminação por agrotóxicos e o assoreamento causado pela retirada da vegetação e a extração ilegal de areia são outros problemas crônicos. A presença de comunidades agrícolas que adotam práticas alternativas de produção ajuda a mitigar os efeitos da poluição. 

:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::

Edição: Flávia Quirino