Bahia

ARTISTAS

Falta de fomento e apoio financeiro são barreiras para o setor cultural no interior da Bahia

Permanência do veto às leis Aldir Blanc 2 e Paulo Gustavo pode piorar ainda mais o cenário

Brasil de Fato | Salvador (BA) |
Ninha foi premiada no 28º Prêmio Braskem de Teatro, na categoria revelação, pelo espetáculo “O salto”. - Divulgação

A Lei Aldir Blanc, aprovada e regulamentada em 2020, permitiu o auxílio financeiro ao setor cultural, garantindo aos profissionais da área que foram impactados com as medidas sanitárias devido à pandemia de covid-19, apoio para atenuar as consequências financeiras da suspensão das atividades presenciais. Nas últimas semanas foram vetados, pela presidência da república, outros dois projetos de Lei que tinham como objetivo o apoio ao setor cultural: a Lei Aldir Blanc 2 e a Lei Paulo Gustavo, os vetos irão ser apreciados pelo Congresso. O cenário coloca uma reflexão: quais são as dificuldades e desafios para o setor da cultura? E quando falamos das cidades do interior?

Aristanan Pinto, conselheiro estadual de cultura da Bahia, explica que ,mesmo com uma riqueza de manifestações culturais nas cidades do interior, a não existência de fomento e de apoio financeiro são grandes barreiras para os fazedores e fazedoras de cultura. "Outra questão que é muito relevante em falar que é a deficiência de políticas públicas nesses interiores, o interesse dos gestores públicos em investir na cultura de fato. E isso causa grandes impactos no cenário cultural do interior da Bahia, não só na produção cultural, mas em todas as linguagens e multilinguagens que envolvem a cultura”, comenta.

A artista circense e atriz, Ninha Almeida, do Vale do Capão, fala sobre sua experiência enquanto artista no interior do estado. “Quem sente realmente a arte dentro do coração, quem gosta de estar se comunicando, sensibilizando as pessoas no trabalho de educação através da arte, faz por amor. Porque é muito difícil, e começa pelos comércios locais. Eu percebo no Capão, como é um lugar turístico, percebo sempre quando tem festival grande, quando tem eventos que envolvem produção de fora, os comerciantes se juntam e apoiam, trabalhando assim, com esse patrocínio. Mas nós que somos da terra, que somos locais, temos muita dificuldade de tocar nossa arte, porque não é reconhecida. É como se as coisas de dentro, produzidas no no local não tivessem valor”, observa. 

Premiada no 28º Prêmio Braskem de Teatro na categoria revelação, pelo espetáculo “O salto”, Ninha diz que sentiu muita alegria ao receber o prêmio. “Saber que meu trabalho estava sendo visto e reconhecido após 24 anos em meio a esse período todo nesse sentimento de ser desassistida, veio esse prêmio a nível estadual, uau, nossa foi, sem palavras, foi muito gratificante”, afirma.

Entre os desafios para quem produz arte, Ninha ressalta que o mais difícil é o artista não ser remunerado pela pesquisa e pelo tempo de criação. “E para você desprender essa energia, você precisa muito de tempo, e hoje para você pegar o seu tempo e ir na criação, pesquisa, você tem que ter certeza que aquilo vai te dar um lucro ou não. Por isso que a galera aqui do interior fala, a galera faz arte no amor, porque a gente faz a pesquisa, faz todo laboratório e não temos a certeza do retorno. Muitas vezes nós sacrificamos o cuidado da nossa casa, com os nossos filhos, e até mesmo sacrificar trabalhos que poderiam nos fornecer o pagamento de contas mensais. E não, a gente investe na arte, porque acreditamos nesse poder transformador. A arte nos transforma, nos fortalece como artistas e também leva o mesmo para as pessoas que estão assistindo”, diz.

Aristanan explica que a Lei Aldir Blanc veio para diminuir os impactos causados pela pandemia, e trouxe outro olhar de organização dos sistemas municipais de cultura, para novos meios de fomento e financiamento de cultura no interior. “A Lei Aldir Blanc fortaleceu de que forma? Artistas que nunca tinham tido nenhum financiamento na sua atuação no interior, passaram a fazer sua produção cultural, tiveram a chance de saber como elaborar um projeto, como apresentar um projeto, como fazer uma prestação de conta e de como é o financiamento da cultura como um todo. Causando um impacto positivo dentro da economia da cultura”. 

Em relação às leis Aldir Blanc 2 e Paulo Gustavo, Aristanan acredita que são dois movimentos importantes no fomento e no financiamento da cultura no Brasil. “Uma pelo reforço da potencialidade do financiamento que é a Lei Paulo Gustavo, para diminuir os impactos da pandemia. E a Lei Aldir Blanc 2 que é uma lei contínua, permanente, de financiamento da cultura. Muitos municípios que não tinham dinheiro para cultura hoje tem para financiar a cultura e os agentes chegarem até a base de financiamento. Só que o grande problema é ter um presidente que não acredita na cultura, e aconteceu o veto", reflete. 

O conselheiro diz ter esperanças na derrubada dos vetos, a partir do movimento da cultura, e da articulação com os legisladores que acreditam na cultura e na sua importância para a população. ”Acreditando que investir na cultura é importante para a diminuição da vulnerabilidade, potencialidade da produção cultural no interior, tanto na Bahia quanto no Brasil. E isso fortalece nosso caminho para um sistema de cultura, de investimento na cultura, o sonho de todos os artistas, de todos os fazedores e fazedoras de cultura”, conclui.
 

Edição: Elen Carvalho