Rio Grande do Sul

Ensino em risco

FURG debate os impactos do bloqueio orçamentário ao MEC promovido pelo governo

Gestores da universidade federal apresentaram o cenário atual e debateram as perspectivas futuras

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"Se nós seguirmos neste cenário, em dois anos, talvez seja necessário o orçamento integral de um exercício para quitar o ano anterior, e ainda faltariam recursos”,afirma o pró-reitor da FURG - Marcelo Camargo / Agência Brasil

Com o tema “Cenário Orçamentário e Perspectivas”, o reitor Danilo Giroldo e o pró-reitor de planejamento e administração Diego Rosa, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), debateram, na última quinta-feira (2), os impactos do bloqueio orçamentário imposto ao Ministério da Educação (MEC). Anunciado pelo governo Bolsonaro na última sexta-feira (27), o corte sobre a pasta é de R$ 3,23 bilhões. De acordo com os reitores, na FURG, o montante - que representa 14,5% da dotação orçamentária disponível do ministério - representa mais de R$ 8 milhões represados.

“É lamentável que tenhamos que vir aqui para comentar este tema, gostaríamos de estar falando sobre nossos projetos, nossos programas de graduação, grupos de pesquisa, extensão, mas infelizmente a gente precisa mais uma vez falar sobre a falta de compromisso com o financiamento da educação pública no nosso país”, destacou o reitor Danilo, na abertura do debate. Ele pontuou ainda que a situação não diz respeito exclusivamente à FURG e seu quadro de funcionários e colaboradores, mas sim das condições que o ensino, a pesquisa e a extensão precisam para seu pleno funcionamento.

“Estamos falando do que é necessário para que possamos cumprir nossa missão social e contribuir com a sociedade brasileira com toda plenitude, como ocorre nos países que conseguiram se desenvolver com justiça social. Não existe justiça social sem acesso à educação”, frisou.

Efeitos do teto de gastos

Para o reitor, diferente de outros anos, a motivação do bloqueio não reside em uma questão específica de superávit, mas no impacto causado pela Emenda Constitucional 95, que define o teto de gastos sobre os recursos orçamentários federais.

De acordo com Danilo, já no primeiro quadrimestre de 2022, o planejamento orçamentário excedeu o permitido pelo teto de gastos. Dessa forma, o mecanismo causa grande preocupação já que ele estabelece um limite independente da capacidade de arrecadação e superávit do governo, o que torna o processo bastante complexo como um todo.

Diante do cenário posto, o governo federal promoveu um bloqueio orçamentário, e para isso, escolheu nominalmente os órgãos cujos recursos receberiam a restrição. O Ministério da Educação teve cerca de R$ 3,2 bilhões bloqueados, seguido pelo Ministério da Saúde, com R$ 2,6 bilhões.

Cenário na FURG e perspectivas de futuro

De acordo com o reitor, na FURG, a Pró-reitoria de Planejamento e Administração (Proplad) busca, já com antecedência, planejar o orçamento anual tendo em vista a situação restrita e delicada. Com o atual contexto, o patamar orçamentário na instituição retrocede para antes de 2010 em níveis nominais, o que demanda adaptação. “Considerando o que já havíamos calculado para o ano, promovemos empenhos, com limites liberados pelo próprio governo, e agora, estes empenhos foram bloqueados”, adicionou Danilo.

O pró-reitor Diego Rosa fez apresentação técnica acerca dos impactos do bloqueio orçamentário. O gestor apresentou três principais grupos de despesa que compõe o orçamento da FURG: pessoal, custeio e capital. O primeiro engloba recursos destinados ao pagamento de servidores em exercício, aposentados, pensionistas e sentenças judiciais; o segundo grupo contempla ainda algumas despesas ligadas à folha de pagamento, mas principalmente se refere às despesas discricionárias que envolvem água, energia elétrica, serviços terceirizados, assistência estudantil, dentre outras; e, por fim, o terceiro grupo representa a dotação disponível para investimentos como obras, equipamentos e mobiliário.

Mostrando um gráfico em barras com valores percentuais de 2007 a 2022, Diego demonstrou o quanto a dotação orçamentária da FURG se aproxima a valores nominais de quase duas décadas atrás. “Todo esse cenário acontece com uma série de limitadores. Nós, historicamente trabalhamos com alguns limitadores orçamentários como o contingenciamento, os limites de empenho, as liberações de financeiro muito abaixo do total de despesa liquidada, mas nos últimos anos estamos encontrando novos desafios”, explicou o pró-reitor.

Na prática, o bloqueio impede que o orçamento seja executado, inviabilizando o pagamento de despesas essenciais para o funcionamento diário da universidade, afetando também as despesas relacionadas à assistência estudantil. Na FURG, o montante bloqueado corresponde a R$ 8.493.337,00, representado cerca de 15% das dotações discricionárias da instituição.

Comparação com anos anteriores

Em 2019, a FURG teve 36% de seu custeio e 30% do seu capital bloqueados. Na época, a universidade recebia algumas parcelas do equivalente a 40% do orçamento anual para desenvolvimento de atividades até o momento do bloqueio. O congelamento perdurou de abril a setembro, quando 12% do valor bloqueado em custeio foi liberado. Apenas em novembro a liberação de toda dotação congelada aconteceu.

Em 2021, o corte aconteceu diretamente na Lei Orçamentária Anual (LOA), mecanismo responsável por ditar a dotação orçamentária para o exercício vigente. Este corte incidiu sobre as dotações de funcionamento – recursos específicos usados para gerenciar o dia a dia da universidade -, e no Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes), totalizando 20%. “O orçamento naquele momento tinha outra figura com 60% condicionado ao congresso para aprovação. Quando a LOA foi aprovada - já com o corte previsto de 20% -, recebemos apenas 40% do total. Apenas em maio aconteceu a liberação total do valor condicionado”, recordou Diego.

Em 2022, no projeto da LOA, a instituição trabalhava com a expectativa de uma recomposição ao patamar em valores nominais de 2019. No entanto, quando da aprovação final do orçamento, houve cortes de 5,6% na ação orçamentária de funcionamento, 6% no Pnaes e 6% na dotação de capital. Não bastando esses cortes, com o decreto 11.086/2022, houve ainda o bloqueio de 14,5% nas dotações discricionárias. “Somando esses cortes, põem-se uma situação muito mais delicada do que a que vivíamos nos anos anteriores, que já foram bastante complicadas”, afirmou Diego.

Comparando a perda percentual de 2015 até 2022, no que tange a dotação disponível para funcionamento da universidade, antes do bloqueio em questão, trabalhava-se com uma variação de -12,30%, após o decreto, essa variação aumenta para -32,18% em relação a 2015, sendo que no mesmo período a inflação acumulada foi de 51,56%. Para os recursos de capital, a variação atinge quase -85% dos valores disponíveis em 2015. Na prática, a instituição tem um recurso menor do que 2015 para pagar as despesas no cenário atual. 

“Anualmente, todo contrato sofre algum tipo de reajuste, a gente luta, negocia e vem fazendo um trabalho muito forte na redução dos contratos, tencionando-os ao limite; mas todos contratos sofrem algum tipo de variação, e a gente precisa lidar com o cenário econômico atual, com um orçamento inferior a oito anos atrás”, explicou o pró-reitor.

Sobre os próximos anos

De acordo com Diego, para 2022, mesmo antes do decreto, a FURG já teria dificuldade em cumprir com os seus compromissos financeiros a partir de outubro. Novembro e dezembro se tornariam o que é chamado de Despesas de Exercício Anterior, que nada mais é do que um déficit que a instituição carrega para o ano seguinte. Com o bloqueio, o panorama encurta ainda mais, fazendo com que a universidade consiga cumprir com suas despesas até agosto.

Em razão de levar para o ano de 2023 um déficit relativo a quatro meses, a FURG teria condições de arcar com suas despesas até meados de agosto. Depois do bloqueio, essa condição passa para meados de junho de 2023.

“Se nós seguirmos neste cenário, em dois anos, talvez seja necessário o orçamento integral de um exercício para quitar o ano anterior, e ainda faltariam recursos”, completou o pró-reitor.

*Com informações de Hiago Reisdoerfer - Assessoria de Comunicação da FURG


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Edição: Marcelo Ferreira