Rio Grande do Sul

Pandemia no RS

Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid-19 lança relatório nesta quarta (10)

Evento, em formato híbrido, acontece às 18 horas na sala Adão Pretto, da Assembleia Legislativa do RS

Brasil de Fato | Porto Alegre |
O relatório da Frente é resultado de audiências públicas realizadas nas sete cidades que são os polos regionais das Macrorregiões de Saúde - Foto: Paulo Garcia - Alergs

Instalada no dia 27 de abril de 2022, com o objetivo de compreender os impactos da pandemia na vida das pessoas e da sociedade gaúcha, a Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid-19 divulgará, na tarde desta quarta-feira (10), seu primeiro relatório. Evento, em formato híbrido, acontecerá na sala Adão Pretto, da Assembleia Legislativa, às 18 horas.

O Brasil de Fato RS, conversou com o presidente da Frente, o deputado estadual Pepe Vargas, sobre o lançamento e a realidade das vítimas da pandemia no estado. Na entrevista, o parlamentar que também é médico fala da invisibilidade das pessoas vítimas da covid e que convivem com sequelas da doença. Resultado da debilidade de uma política que atenda essa população. 

“A maior demonstração de que não há uma política articulada em torno da atenção integral à saúde dessas pessoas, é o fato de que não há uma estatística que possa mensurar quantas são as pessoas que tiveram covid e estão com sequelas, e quantas são as pessoas que estão com sintomas da chamada covid longa. Então a primeira questão importante a ser discutida é essa, que se passe a ter um reconhecimento da necessidade de que isso tenha uma devida notificação, uma mensuração, para que o poder público, o Estado, o SUS, enfim, possa desenvolver uma política de cuidados a essas pessoas”, destaca. 

O relatório da Frente é resultado de audiências públicas realizadas nas sete cidades que são os polos regionais das macrorregiões de Saúde. "Visibilizar as vítimas da covid-19, sejam elas vítimas diretas ou indiretas, é recordar que ainda são necessárias respostas do Estado. Na dimensão sanitária, existem demandas relacionadas à atenção à saúde da população que apresenta danos, permanentes ou temporários, causados pela doença, que implica na ampliação da oferta dos serviços existentes e possíveis novos arranjos assistenciais no Sistema Único de Saúde”, destaca o texto a ser disponibilizado após o evento desta quarta. 

Abaixo a entrevista completa: 

Brasil de Fato RS - A Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid-19 lançará nesta quarta-feira (10) o primeiro relatório. Que pode nos adiantar da situação dessas pessoas no estado?

Pepe Vargas - A Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid-19 foi constituída a partir de uma solicitação do Comitê Estadual em Defesa das Vítimas da Covid-19, formada por várias entidades da sociedade civil organizada que perceberam a situação de uma certa invisibilidade das vítimas da covid no âmbito do nosso estado. Isso não é uma exclusividade do Rio Grande do Sul, diga-se de passagem, já que até o presente momento o Ministério da Saúde não estabeleceu nenhuma política coordenada em relação a essa parcela da população. 

É importante dizer que se passa a ideia de que quem teve um quadro agudo de covid e não foi a óbito, estaria recuperado. É inclusive o que vemos nos painéis de controle, seja os painéis do Ministério da Saúde, ou das secretarias estaduais e municipais de saúde, seja naquele do consórcio dos veículos de imprensa que diariamente são divulgados à população. Diz-se lá que tem tantas pessoas que tiveram covid, tantas foram a óbito, e quem não foi a óbito é apresentado como se estivesse recuperado, e infelizmente isso não corresponde exatamente à realidade.

Se passa a ideia de que quem teve um quadro agudo de covid e não foi a óbito, estaria recuperado

Aquela parcela das pessoas que não vão a óbito, mas ficam com sequelas graves, e agora há também aquilo que está se chamando de covid longa, pessoas que depois de várias semanas do desaparecimento do quadro agudo da covid-19, passam a ter persistência de alguns sintomas ou inclusive surgimento de sintomas novos que nunca tinham tido antes da covid-19. É essa invisibilidade que precisa ser superada, e esse é o objetivo central da frente parlamentar, portanto as perspectivas na situação da saúde dessas pessoas, hoje a gente pode dizer que não há uma ação coordenada para o enfrentamento desta situação.


"Não dá pra baixar a guarda, porque enfim, nós ainda enfrentamos essa situação e ainda há um número muito grande de pessoas que se infectam e podem ter sequelas ou os sintomas da covid-19", afirma Pepe Vargas / Foto: Jorge Leão

BdFRS - A Frente conseguiu contabilizar as vítimas que vivem com sequelas no estado? 

Pepe Vargas - A maior demonstração de que não há uma política articulada em torno da atenção integral à saúde dessas pessoas, é o fato de que não há uma estatística que possa mensurar quantas são as pessoas que tiveram covid e estão com sequelas, e quantas são as pessoas que estão com sintomas da chamada covid longa. Então a primeira questão importante a ser discutida é essa, que se passe a ter um reconhecimento da necessidade de que isso tenha uma devida notificação, uma mensuração, para que o poder público, o Estado, o SUS, enfim, possa desenvolver uma política de cuidados a essas pessoas. 

Para tanto, é importante que os painéis de monitoramento para acompanhamento da situação da covid-19, que são disponibilizadas pelos governos, na medida que novas evidências científicas surjam, incorporem essas novas categorias, por exemplo, ao invés de uma categoria genérica como recuperadas, que são informadas nos sites das secretarias de saúde. No caso específico, estou falando da Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul, que se informe o número de pessoas que se encontram em reabilitação, como as que apresentam sequelas graves e os sintomas descritos como da covid longa. 

BdFRS - Qual o diagnóstico que a Frente faz da situação da pandemia no estado?

Pepe Vargas - Após realizarmos sete audiências públicas, nas sete cidades que são os polos regionais das Macrorregiões de Saúde, vamos apresentar um primeiro relatório, onde constarão algumas recomendações aos órgãos públicos responsáveis pela saúde da população. Nesse sentido, a primeira grande recomendação é que se mantenham, se reforcem mais do que se mantenham, porque hoje isso tá muito fragilizado, as campanhas de vacinação. Nós temos ainda uma parcela significativa da população que não se imunizou. Temos 60% da população acima de cinco anos que tem o esquema vacinal completo, significa que 4% da população não tem o esquema vacinal completo. 

Se formos pensar nas crianças acima de cinco anos, até os 11 anos, menos da metade está com o esquema vacinal completo. As campanhas de vacinação são, ainda, extremamente importantes, e eu diria que não só em relação a covid-19, mas também a outras doenças infectocontagiosas que tem apresentado uma cobertura vacinal muito baixa aqui no estado do Rio Grande do Sul e no Brasil como um todo. 

A primeira grande recomendação é que se mantenham, se reforcem mais do que se mantenham, as campanhas de vacinação

As campanhas de vacinação e também o reforço dos protocolos não farmacológicos para a prevenção da covid-19, são extremamente importantes de serem reforçados. A orientação sobre as pessoas continuarem a manter os cuidados de higienização das mãos, a importância da orientação do uso de máscaras em ambientes com aglomeração ou em ambientes com pouca ventilação, tudo isso é muito importante. Assim como é muito importante que os estados, os municípios, mantenham os comitês de acompanhamento e monitoramento da covid-19. 

Não dá pra baixar a guarda, porque enfim, nós ainda enfrentamos essa situação e ainda há um número muito grande de pessoas que se infectam e podem ter sequelas ou os sintomas da covid-19.


Evento de instalação da Frente presidida pelo deputado Pepe Vargas (PT) reuniu representantes de entidades ligadas à área da saúde locais e nacionais / Foto: Paulo Garcia

BdFRS - Que perspectivas o senhor vê para o sistema de saúde pós contexto da pandemia?

Pepe Vargas - Dentre as recomendações, uma primeira que salta os olhos, é a necessidade do Ministério da Saúde, ou no caso da omissão do Ministério da Saúde, que a Secretaria Estadual da Saúde (SES) construa juntamente com as instâncias de pactuação e do controle social, os protocolos da rede de cuidado às vítimas da covid- 19 e seus familiares. É importante dizer que o Conselho Nacional de Saúde e o Conselho Estadual de Saúde têm resoluções que inclusive colocam essa necessidade, e que lamentavelmente, até o presente momento, nem o Ministério da Saúde e nem a SES tomaram providências para o estabelecimento de um protocolo dessa natureza.

Além do protocolo, é preciso estruturar essa rede de cuidados às vítimas da covid-19, através de um atendimento integral e multidisciplinar, que passa necessariamente pelo fortalecimento da atenção básica à saúde, como a coordenadora dessas ações da rede de cuidados às vítimas da covid. Para tanto, é necessário um orçamento adequado. Esse orçamento, ele implica no caso do Rio Grande do Sul, que o estado definitivamente assuma a necessidade de aplicar os 12% da receita corrente líquida de impostos e transferências em ações e serviços públicos de saúde.

O estado do RS não vem aplicando esse percentual, ele aplica aproximadamente 9% da sua receita corrente líquida de impostos e transferências em ações e serviços públicos de saúde, vale dizer no Sistema Único de Saúde. No caso do RS, é fundamental que isso se estabeleça, é importante que os municípios também reforcem os seus orçamentos, e no que diz respeito ao governo nacional, é importante revogar a emenda do teto de gastos, a emenda constitucional 95, essa emenda subtraiu do orçamento do Sistema Único de Saúde, de 2018 até 2022, R$ 36,9 bilhões.

O estado deve definitivamente assumir a necessidade de aplicar os 12% da receita corrente líquida de impostos e transferências em ações e serviços públicos de saúde

Quer dizer, em um momento que temos a necessidade de fortalecer os orçamentos da saúde, a emenda do teto de gastos está subtraindo recursos do Ministério da Saúde, não só para as questões da covid, mas pra todas as ações de saúde necessárias à população brasileira. É importante também dizer que houve um grande represamento de consultas especializadas, cirurgias eletivas, exames especializados. Esse orçamento também deve dar conta para superarmos esse represamento decorrente, que já existia uma fila de espera antes da pandemia, e com a pandemia essa fila de espera aumentou de forma bastante significativa.

Uma outra recomendação importante é que as secretarias de saúde, o Ministério da Saúde, façam parcerias com instituições acadêmicas para execução de projetos de pesquisa multidisciplinares sobre a covid longa. Como a covid-19 é uma doença relativamente nova, e só mais recentemente estudos começaram a apontar existência disso que está se chamando no momento de covid longa. Então é muito importante que haja um orçamento adequado também para ampliação das pesquisas para definição clara disso, porque elas depois poderão orientar as equipes de saúde para o atendimento à população.

Para além das questões relativas à saúde propriamente dita, tem outras questões que são fundamentais e recomendações necessárias. Vou dar exemplos: é fundamental uma política estadual de proteção social às crianças e adolescentes em situação de orfandade. Isso até o presente momento não foi estabelecido, há inclusive um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa, de iniciativa parlamentar, buscando o estabelecimento de uma política estadual de proteção social às crianças e adolescentes. É também fundamental que haja uma política, e as secretarias de educação, seja do estado, seja dos municípios, tenham estratégias para recuperar os prejuízos pedagógicos e psicossociais decorrentes do período da pandemia, na medida em que foi profundamente desigual o acesso à educação nesse período. 

É preciso também que as políticas de Seguridade Social e de direitos sociais sejam fortalecidas, na medida que houve pessoas que perderam o emprego, teve pessoas que tiveram seus pequenos negócios que faliram, principalmente daqueles setores que tiveram restrições de funcionamento durante a pandemia.

Da mesma forma é importante que seja mantida a política que impede remoções e despejos, tem famílias que estão em enorme dificuldade econômica financeira, e correm o risco de serem despejadas no momento em que for revogado, ou que deixar de ter vigência aquela decisão do Supremo Tribunal Federal, que estabeleceu até o final de outubro pelo menos, essa questão da proibição das remoções e despejos. São milhares e milhares de famílias que correm risco de despejo, que não tiveram condições de pagar aluguel. 

É preciso que as políticas de Seguridade Social e de direitos sociais sejam fortalecidas

E por fim, é fundamental também que seja formulada e executada uma política de proteção aos trabalhadores que experienciam as sequelas da covid-19, da covid longa. Conforme já indicam estudos, esses sintomas podem acarretar alterações físicas, psicológicas, neurológicas que interferem na capacidade de execução do trabalho. Em havendo estabelecimento nexo causal da infecção pela covid-19 com o ambiente do trabalho, é também importante que sejam reconhecidos os direitos trabalhistas decorrentes dessa situação. Tem havido uma negativa do reconhecimento do nexo causal das pessoas que contraíram a covid do ambiente de trabalho. Esse também é um problema muito sério que precisa ser enfrentado. Mas há pessoas também que não contraíram a covid no ambiente de trabalho, mas devido as sequelas estão tendo enormes dificuldades para executar o trabalho no momento em que retornam às suas atividades, e a Seguridade Social ou o INSS em especial, precisam reconhecer isso e dar um tempo adequado para recuperação à essas pessoas. 

Quando eu falo de situação de orfandade, nós estamos falando é dos órfãos da covid, ou seja, crianças e adolescentes que tiveram a perda do pai e da mãe, ou já tinham só o pai ou só a mãe e foi a óbito. Então é disso que a gente está falando. 


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Edição: Katia Marko