Rio Grande do Sul

ASSISTA AO VÍDEO

Enchente não impediu vantagem de Melo no primeiro turno em Porto Alegre

Impactos da tragédia no resultado da eleição geram uma série de análises no segundo turno da capital gaúcha

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
"Quem está na frente da máquina, da administração, sai com vantagem", avalia cientista política - Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Mesmo não tendo realizado a manutenção do sistema de proteção contra cheias de Porto Alegre, o que agravou a inundação na cidade, o atual prefeito e candidato à reeleição Sebastião Melo (MDB), ficou com 49,72% dos votos. Ele vai disputar o segundo turno com Maria do Rosário, do PT, que ficou com 26,28%.

Fato que gerou uma série de debates sobre o cenário político e o desafio da oposição em virar o jogo no segundo turno. Apesar do resultado, para Leonardo Maggi, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o processo das enchentes marcou presença no processo eleitoral.

“Seja no debate, seja nas propostas, e mesmo do ponto de vista eleitoral. Muito provavelmente o governo, o candidato Melo, poderia ter ganhado no primeiro turno, se não fosse essa série de contradições que as enchentes revelaram”, avalia. Ele pontua também a insatisfação da população com a piora na qualidade dos serviços públicos, mas destaca a alta abstenção como outro “reflexo desse processo”.

Maggi lembra que, por conta da situação de calamidade, as prefeituras, inclusive Porto Alegre, receberam muito recurso da União. “Foram R$ 98 bilhões que o governo federal disponibilizou para o processo de reconstrução do Rio Grande do Sul. Qualquer prefeito com uma inundação, com essa quantidade enorme de valores, teria condição muito favorável para conquistar uma eleição, uma reeleição.”

Confira a reportagem em vídeo:


A cientista política e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Silvana Krause, entende que, num primeiro momento, a tragédia refletiu na imagem do atual prefeito. O que foi revertido no momento pós-tragédia.

“Claro que quem está na frente da máquina, da administração, sai com vantagem, porque ele tem condições de usar mais para dar a tal da assistência, e dar a sensação de que está presente. Eu não estou falando de qualidade da presença do poder Executivo, do incumbente, eu estou falando que tem a presença e, aí, a sensação de que não estamos abandonados”, afirma.

A estratégia de marketing da campanha do atual prefeito também é uma questão que merece análise. “Quando ele usa ‘água não tem ideologia’, ele está pegando um eleitor de Porto Alegre que é de centro. Porto Alegre é uma cidade de centro-esquerda, as pesquisas mostram isso.”

Ela destaca que, no primeiro turno, foi desafio para as campanhas de Melo e de suas principais concorrentes, Rosário e Juliana Brizola (PDT), trazer esse eleitor de centro. “O prefeito sabia disso muito claramente e, mesmo ele tendo uma candidata do PL de carreira militar [como vice], ele não cola Bolsonaro na campanha em Porto Alegre. Tanto que na eleição de 2022 é o Lula que ganha aqui em Porto Alegre.”

Entender a abstenção

Porto Alegre foi a capital com maior índice de abstenção, com 31,51%. Rosário aposta nesses eleitores para superar Melo no segundo turno. Para Silvana, é importante entender quem é esse eleitor, quando os dados estiverem disponíveis.

“Se a gente olhar a eleição de 2020, que foi uma eleição municipal, a eleição de 2022 foi uma eleição nacional, a gente percebe o seguinte: gênero. Mulheres predominam nas diferentes faixas de escolaridade. E onde elas mais predominam na abstenção? Nas baixas faixas de escolaridade. Os homens, o comparecimento é maior, ou seja, a participação é maior de homens. E olhando a escolaridade de homens e mulheres e abstenção, mulheres, quanto mais baixa a escolaridade, menor o comparecimento”, analisa.

"Uma nova eleição"

O dirigente do MAB afirma que o movimento entende que “o segundo turno é uma nova eleição”, mas ressalta o desafio em reverter os votos para a vitória de Maria do Rosário. “Temos que reconhecer que houve um avanço, eleitoralmente falando, das forças mais conservadoras no Rio Grande do Sul. Nominalmente falando, eles aumentaram muito a quantidade de massa de eleitores que confiaram num projeto mais conservador.”

Segundo ele, esse é o desafio dos movimentos populares e da esquerda. “Mobilizar a cidade, mostrar quem são os responsáveis, mostrar quem são os culpados realmente por esse abandono, tanta destruição. É muito triste caminhar pela cidade e ainda ver, como uma cicatriz, a marca da lama nas paredes das casas, na parede dos comércios.”

Maggi recorda que mesmo o sistema de bombeamento da água da chuva “está ainda totalmente destruído”, ao lembrar que ruas voltaram a alagar em um dia de chuva na semana antes da eleição. Para ele, “essa política de destruição é que está nas urnas” e cabe aos movimentos sociais e partidos dialogar com a população.


Edição: Vivian Virissimo