Disputa

MPF recomenda a general Heleno que evite remoção de quilombolas de Alcântara (MA)

Instituição concedeu prazo de 10 dias para que governo informe sobre cumprimento da orientação e medidas adotadas

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Centro de Lançamento Espacial de Alcântara (CLA), no Maranhão - Valter Campanato/Agência Brasil

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, general Augusto Heleno, que a União se abstenha de deslocar “quaisquer comunidades quilombolas” do município de Alcântara (MA), especialmente durante o estado de calamidade provocado pela covid-19.

Os procuradores concederam prazo de 10 dias para que o governo informe sobre o cumprimento da orientação e as medidas eventualmente adotadas.

O plano de remoção das famílias consta em uma resolução assinada por Augusto Heleno na última sexta-feira (27) e tem intensificado a apreensão dos moradores da ilha, que vivem um duro embate com o governo Bolsonaro por conta do projeto de expansão do Centro de Lançamento Espacial de Alcântara (CLA), que abrangeria uma área de 12 mil hectares.  

Criado no final da ditadura militar no Brasil, o equipamento provocou, na época, a remoção de 312 famílias. Desta vez, lideranças comunitárias locais apontam que o deslocamento previsto tende a afetar 800 famílias.

Na recomendação do MPF, que foi assinada na quarta-feira (1) pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais, os procuradores citam a existência de “risco de dano irreparável às comunidades quilombolas” por conta do projeto.

A instituição menciona, entre outras coisas, as restrições no acesso ao mar e no trânsito das pessoas pela região. Nesta semana, 161 entidades civis soltaram nota repudiando a iniciativa e apontando que a medida seria ilegal.

Entre outras coisas, as associações e lideranças de Alcântara têm denunciado frequentemente que não teriam sido ouvidas pelo governo Bolsonaro, conforme mostrou o Brasil de Fato em diversas reportagens.

Por conta disso, no documento enviado ao GSI, os procuradores fazem referência à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê a escuta dos povos tradicionais diante de obras ou outras medidas que possam lhes afetar diretamente.

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O MPF pede ainda, na recomendação, que o governo disponibilize na internet todo o conteúdo relacionado aos estudos e deliberações produzidos pelo Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro (CDPEB), de forma a dar transparência ao caso.

Segundo informações da página da Procuradoria, o documento também foi encaminhado aos Ministérios da Defesa e Agricultura (Mapa) e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

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O caso também motivou uma outra recomendação, esta assinada recentemente pela Defensoria Pública da União (DPU), que pediu a revogação de trechos da resolução de Augusto Heleno.

A medida do GSI é alvo de questionamentos ainda na Câmara dos Deputados, onde a oposição tem feito coro contra a expansão do CLA e a remoção das famílias.

A bancada do Psol, por exemplo, protocolou, na terça-feira (31), um projeto de decreto legislativo pedindo a  invalidação da resolução do governo.

Edição: Leandro Melito