Rio Grande do Sul

FRENTE DE ESQUERDA

Movimentos sociais promovem debate com partidos cobrando unidade em Porto Alegre

Avaliação é de que a unidade para as eleições municipais deve ser construída em diálogo com a comunidade

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Atividade foi realizada no sábado (1º), no Memorial Luiz Carlos Prestes - Foto: Blog Esquina Democrática

A construção da unidade política para defender a democracia e retomar a cidade como um espaço de construção coletiva, tendo em vista às eleições municipais de 2020, passa não somente por um acordo entre os partidos de esquerda. Principalmente, requer a construção de um programa que dialogue com a população, com quem vive nas periferias e com os movimentos comunitários e sociais. Foi nessa linha que se desenvolveu a plenária dos movimentos sociais pela unidade das forças populares em Porto Alegre.

Realizado no último sábado (1º), no Memorial Luiz Carlos Prestes, o debate reuniu centenas de pessoas, entre representantes de diversas entidades, líderes comunitários, militantes e dirigentes políticos da esquerda da capital. Foi coordenado pelo conselheiro da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) e conselho internacional do Fórum Social Mundial, Mauri Cruz.

“Nossa intenção não é se sobrepor a nenhum partido nem dizer o que eles têm que fazer, mas que a nossa voz seja ouvida no processo de definição das candidaturas”, aponta o professor Benedito Tadeu César, do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado de Direito. “Compete a nós, enquanto movimentos sociais, ter algum tipo de ação para mudar essa realidade. O que temos visto nas últimas eleições é que os partidos políticos decidiram muitas vezes sem consultar a comunidade”, destaca.

A presidente da Associação Mães e Pais pela Democracia, Aline Kerber, disse estar muito preocupada com a dificuldade da solidificação da unidade política dos partidos progressistas para as eleições em Porto Alegre. “É fundamental não desistir dessa unidade, mas enxergamos as dificuldades e nos colocamos a disposição para fazer algumas pontes, já que somos um movimento suprapartidário, que dialoga com vários campos”.

Para Aline, o Congresso do Povo é um espaço importante para debater temas que ainda são tabus para a esquerda como a segurança pública. “Acho que esse tema em especial pode fazer virar o jogo e garantir que, para além de debate da construção de um programa no Congresso do Povo, se ganhe a agenda também das mídias e redes sociais, para garantir irmos ao segundo turno e derrotar o fascismo”, avalia.

O advogado e ex-deputado constituinte Mario Madureira, também do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado de Direito e da AJURD, entende que não é mais momento de se fazer o que sempre se fez, mas de grandeza, de fazer o incomum. “Nós não temos chance de vencer essa eleição se não houver a unidade das forças progressistas de esquerda e até setores que a gente hoje ainda não cogita. Os números mostram que nós perdemos a metade dos votos que tínhamos há duas décadas e não conseguimos sequer chegar ao segundo turno quando não estivemos unidos”.

Por outro lado, para Mario, a consolidação do neoliberalismo, da fascistização da vida e do modo de governar e fazer política é algo que se pode admitir. “Os movimentos sociais estão aqui para dizer o seguinte: ‘Ok, os partidos é que lançam os candidatos, mas não podem mais ignorar os movimentos sociais e nem simplesmente dizer somente que venham no dia da eleição votar. Não há movimento mágico, a população tem que enxergar que os partidos políticos a reconhecem e acolhem”, afirma.

O dirigente do Movimento Nacional de Luta pela Moradia, Ezequiel Moraes, destacou a necessidade dos partidos políticos inverterem a lógica da construção das candidaturas e primeiro discutir com os movimentos de rua, com a questão ambiental, ir para a comunidade. “Nossa estratégia é construir o poder popular, fortalecer as comunidades, retomar de fato a questão de como a gente se reconhece de novo. Um dos patamares foi o que deu eco no Fórum Social das Resistências. Lá se disse que as mulheres negras são prioridade agora na América Latina, que os indígenas são prioridade, e todas as comunidades vulneráveis”, destaca.

Presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Francisco Milanez, ressaltou que Porto Alegre é uma cidade muito crítica e com uma população bastante amadurecida politicamente. “Nesse momento temos que ser propositivos positivamente e nada melhor que o pensamento ambientalista, que reconecta as pessoas com a vida e com a própria espécie, contra a violência, a favor do amor, da relação, da solidariedade, da qualidade de vida, alimentação de qualidade”, afirma, lembrando que a cidade “não quer saber do lixo político que a gente quer combater, mas sim das nossas propostas”.

Na opinião de Milanez, é necessário um desenvolvimento para todos, e não desenvolvimentismo, algo que a esquerda, as vezes, cai um pouco. “Hoje, nesse momento, o pensamento ambiental pode ser uma base espetacular para vencer em Porto Alegre”, afirma. Ele destaca ainda que, em tempos de crise, os candidatos e partidos devem superar os sonhos pessoais e construir a união para uma cidade melhor. “Nós temos uma grande oportunidade, temos a sociedade do nosso lado, a alegria dos artistas, dos intelectuais e professores, das populações de base das comunidades. É isso que temos que botar, o sorriso no rosto”.

Ex-deputado e membro do PCdoB, Raul Carrion destacou a responsabilidade dos partidos em construir a unidade com o povo de Porto Alegre. “Temos que retomar a cidade para a população e interesse da comunidade. E temos a responsabilidade frente ao quadro que vivemos no pais, de destruição da nação, de direitos, de ataque à democracia. Essa luta se dá nessa eleição com toda a certeza. Se o bolsonarismo vencer de cabo a rabo no Brasil, o povo vai estar legitimando a retirada de direitos, a entrega do país e o fim da democracia”, avalia.

A ex-deputada Manuela D’Ávila estava presente na atividade, mas preferiu só ouvir, não se manifestou. Raul Carrion destacou que, apesar do nome dela estar liderando as pesquisas para a prefeitura porto-alegrense, o PCdoB não condiciona a unidade à sua escolha. “O PCdoB colocou seu nome a disposição da companheirada. O PSOL lançou nome de Fernanda Melchionna, o PT pensa em lançar um nome, mas entendemos que não é essa a discussão central no momento, mas sim construir um programa comum, não só dos partidos, mas construído com a cidade de Porto Alegre, e não só construir o programa, mas pactuar o processo”.

O ex-deputado e membro do PSOL Pedro Ruas destacou que seu partido, o PT e o PCdoB têm estado unidos em muitas lutas. “Na maior parte, na Assembleia Legislativa, nas câmaras de vereadores, na Câmara Federal. Vejam agora com o pacote do inferno do Eduardo Leite, nós estávamos juntos ali”. Porém, destacou que é política, não é tão simples e requer esforço. “A nossa posição, do PSOL, é de previas, posição tirada ano passado, quando havia dificuldades sim e precisávamos de um critério que achávamos adequado e justo para escolha de candidaturas”, afirma.

Pedro Ruas assinalou a necessidade de se ter critérios ou negociações para a composição da chapa, ou ambos, e de que nada adianta esperar o segundo turno para compor uma unidade entre os partidos. “Aquilo que baliza a vontade de todos, a ideia de unidade, é exatamente o que também nos motiva. E essa unidade eu quero no primeiro turno. A nossa luta é uma luta de primeiro turno”.

A deputada federal e dirigente nacional do PT, Maria do Rosário, afirmou que o PT não vai sair da mesa que busca unidade e que essa é a posição nacional do partido. Destacou que a tentativa de construção da frente na cidade está ecoando pelo Brasil, centrada nos três partidos, PSOL, PT e PCdoB, uma unidade construída na luta real. “Quem está enfrentando o desmonte do Estado, o ataque à soberania nacional, o desmonte da educação? Somos só nós, por isso é importante que os partidos estejam aqui tomando uma aula com os movimentos sociais, é preciso humildade pra dizer que não só partidos tomam decisões”, aponta.

Maria do Rosário disse ainda que a unidade deve ser construída no meio do povo, e não ficar entre os grupos presentes. “É preciso alargar os partidos também em direção aos bairros. Se essa unidade é com os bairros e vilas, com o lado de fora, então é para vencer. Os partidos precisam se reunir, e pensar propostas”, avalia. Ela destacou ainda que o PT quer estar na chapa não somente pela história do partido, mas porque a avaliação é que podem contribuir para uma chapa mais forte para vencer. “Achamos legítimo o que vem dos outros partidos, mas queremos analisar, verificar a base política, porque precisamos de uma unidade para vencer e não apenas para disputar”, conclui.

Ao final do debate, Benedito Tadeu César avaliou que o encontro foi um avanço para demonstrar à sociedade e aos partidos políticos que os movimentos sociais querem ser ouvidos e que é urgente a construção de uma frente unitária. “Vamos ver como os partidos políticos reagem depois desse encontro, que foi muito além do que esperávamos. No dia 15 de fevereiro, vamos nos reunir de novo aqui e vamos esperar que, nesse meio tempo, os partidos se manifestem oficialmente sobre os encaminhamentos”.

Assista à transmissão do debate pela Rede Soberania:

Edição: Katia Marko