Rio Grande do Sul

Linha de Frente

“Neste momento, cuidar de si é cuidar do outro”, afirma a presidenta do Coren/RS

Neste 7 de Abril, Dia Mundial da Saúde, o Brasil de Fato RS conversa com a enfermeira Rosangela Gomes Schneider

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Enfermeira há 32 anos e ferrenha defensora do Sistema Único de Saúde, Rosangela Schneider afirma que o momento é crítico, principalmente em relação ao desmonte do SUS - Divulgação/Coren-RS

Criado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1948, o Dia Mundial da Saúde, celebrado nesta quarta-feira (7), tem como objetivo conscientizar as pessoas sobre a importância da preservação da saúde para ter uma melhor qualidade de vida.

Em tempos de pandemia a data vem para ressaltar isso, e reforçar ainda mais a importância daqueles que estão na linha de frente em combate ao coronavírus, os profissionais da saúde. Entre eles aqueles que se dedicam à Enfermagem, composta por auxiliares, técnicas (os) de enfermagem e enfermeiras (os).

Trabalhando para além da exaustão física, mental, emocional, a categoria tem se redobrado nos cuidados consigo e com o próximo, e diante do cenário drástico pedem: além dos aplausos e das homenagens, ajuda para sensibilizar os políticos acerca da urgência da melhoria das condições de trabalho da Enfermagem. 

A covid que já vitimou 337 mil vidas e infectou mais de 13 milhões de brasileiros, levou a óbito 743 profissionais da área de Enfermagem e infectou mais de 51 mil, sendo a maioria mulheres. 

Nessa entrevista ao Brasil de Fato RS, a presidenta do Conselho Regional de Enfermagem do Rio Grande do Sul (Coren/RS), Rosangela Gomes Schneider, comenta sobre o cenário atual.

Enfermeira há 32 anos e ferrenha defensora do Sistema Único de Saúde, Rosangela afirma que o momento é crítico, principalmente em relação ao desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS). “O SUS é uma conquista e um patrimônio do povo brasileiro. Esse tema é caro para mim, pois participei desde o início, fazendo parte, enquanto acadêmica de Enfermagem, da Constituinte que assegurou a saúde como um direito de todas e todos no Brasil”, afirma. 

Abaixo a entrevista completa

Brasil de Fato RS – De acordo com o Observatório de Enfermagem do Conselho Federal de Enfermagem até o momento o país tem 51.643 profissionais infectados, e 743 óbitos, sendo que a maioria dos casos de mulheres. Na linha de frente, esses profissionais estão na vitrine do combate à pandemia. Por vezes, durante a pandemia são aplaudidos. Que sentimentos lhe traz essas homenagens? O que a senhora gostaria que fosse feito para além desses aplausos? 

Rosangela Schneider – O meu sentimento é, sobretudo, de reconhecimento e de agradecimento em relação ao trabalho da Enfermagem. A população diretamente atendida pela Enfermagem já está familiarizada com a atuação da nossa categoria e o quanto ela é essencial. Nós pedimos ajuda para ir além dos aplausos e das homenagens: para sensibilizar os políticos acerca da urgência da melhoria das condições de trabalho da Enfermagem. E isso pode acontecer de forma mais efetiva apenas por meio da aprovação dos Projetos de Lei (PLs) de interesse da Enfermagem, que estão parados no Congresso Nacional: jornada de trabalho semanal de 30 horas; piso salarial nacional; e repouso digno. Esses projetos precisam ser votados e aprovados o quanto antes [para saber detalhes sobre todos os PLs de interesse da Enfermagem, acesse aqui.]

Sobre os números de profissionais da Enfermagem infectadas(os) e mortas(os) em decorrência da covid-19, o Observatório da Enfermagem, sistema que reúne dados do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), juntamente com os Conselhos Regionais, aponta que 27.619 casos do novo coronavírus (covid-19) foram registrados entre profissionais da categoria. Deste total, 743 faleceram em decorrência da doença. Há, ainda, 16.692 casos suspeitos e 37 mortes não confirmadas pelas autoridades sanitárias se foi ou não em função da patologia. Os dados foram atualizados no dia 5 de abril e podem ser acessados aqui.

No Rio Grande do Sul, o Observatório aponta 3.410 profissionais com diagnóstico confirmado da doença e outros 1.294 com suspeita. O estado registra 24 mortes em decorrência do novo coronavírus.

BdFRS – Após mais de 30 anos dedicado à enfermagem, em especial ligada ao SUS, como analisa esse momento? Como vê esse um ano de pandemia no país?

Rosangela –  É um momento crítico, principalmente em relação ao desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS). Antes da pandemia do novo coronavírus, a Emenda Constitucional (EC) 95, que prevê o congelamento dos gastos da União com a saúde por 20 anos, já estava trazendo prejuízos a essa área. A pandemia veio evidenciar a importância do SUS. Mesmo com os cortes de verbas, é o SUS que está proporcionando tratamento, cuidado e vacinação para toda a população. 

Vale ressaltar a importância da defesa incondicional do SUS, que é uma conquista e um patrimônio do povo brasileiro. Esse tema é caro para mim, pois participei desde o início, fazendo parte, enquanto acadêmica de Enfermagem, da Constituinte que assegurou a saúde como um direito de todas e todos no Brasil. 

BdFRS – As enfermeiras e enfermeiros, assim como outros profissionais que estão na linha de frente, têm relatado a exaustão e o esgotamento físico, emocional, diante da situação que estamos vivendo. Além disso temos visto relatos desses profissionais que se compadecem pelo crescente número de jovens que estão sendo internados. Como tem sido o acompanhamento do Conselho em relação a esses profissionais?

Rosangela – Desde o início da pandemia, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), em conjunto com os Conselhos Regionais, estruturou o programa Enfermagem Solidária, um canal de apoio em saúde mental para as (os) profissionais de Enfermagem que funciona sete dias por semana, 24 horas por dia, via site do Cofen

Além disso, o Coren/RS tem realizado mais inspeções fiscalizatórias, com ampliação da escuta das (os) profissionais de Enfermagem. O Conselho tem acolhido e se manifestado em relação a demandas diversas, que por questões éticas não podemos elencar aqui. 

O Coren/RS também tem se posicionado institucionalmente em defesa da Enfermagem, inclusive combatendo fake news, denúncias sem comprovação e atitudes antiéticas. O Conselho se manifesta no sentido de dirimir dúvidas e proteger a população. É importante frisar que a Enfermagem presta uma assistência de qualidade e segurança, amparada legalmente.

E independente da idade das (os) pacientes, a Enfermagem preza pela vida e lamenta toda e qualquer perda dessa pandemia. A categoria da Enfermagem é composta por auxiliares, técnicas(os) de Enfermagem e enfermeiras(os).

BdFRS – Como é estar à frente de uma entidade representante de uma das mais importantes categorias da saúde neste momento?

Rosangela – É uma honra e um desafio muito grandes. Sou enfermeira há 32 anos e sempre estive na defesa da categoria e do SUS. Como a Enfermagem ainda tem muitas conquistas pela frente e tenho disponibilidade, ânimo e motivação para persistir na luta, aceitei essa missão de estar à frente do Coren/RS. Amo minha profissão e, mesmo não estando mais na linha de frente da assistência, pois já sou aposentada, sigo em busca de mais visibilidade e mais valorização para o trabalho feito pela Enfermagem!

BdFRS – Como a senhora analisa a volta da cogestão e abertura de comércios e serviços nesse atual momento de superlotação de leitos?

Rosangela – Encaro como uma posição temerosa [volta da cogestão e abertura de comércios e serviços] frente à situação caótica da pandemia. Saúde e economia não são antagônicas, mas a responsabilidade com a vida das pessoas é maior. Para haver economia, é preciso que as pessoas sigam vivas. 

Também sou favorável ao acesso à renda básica e a auxílios emergenciais, enquanto a pandemia persistir, pois ela fragilizou ainda mais a população. Milhões de pessoas perderam seus empregos e suas rendas e não têm o que comer – o que acaba as deixando ainda mais vulneráveis, com a imunidade baixa, isso sem falar nas condições precárias de moradia e higiene. 


Coren/RS se posicionou contra ataques à categoria e denunciando fake news / Divulgação

BdFRS – Recentemente o presidente Jair Bolsonaro ligou para uma rádio e defendeu a nebulização de cloroquina em paciente com covid-19. Sendo profissionais que primam pela ciência, como a categoria vê a defesa de algo que não tem comprovação cientifica no combate à covid-19?

Rosangela – Eu inclusive escutei a fala do presidente, pois ela antecedeu a minha fala na mesma rádio, na qual eu defendi o procedimento correto adotado pelas (os) profissionais de Enfermagem de Camaquã. Elas (es), respaldadas (os) pela lei nº 7.498/86, que regulamenta o exercício profissional da Enfermagem, defenderam a segurança do paciente. A Enfermagem é uma ciência e uma arte que preza pela autonomia da (o) profissional e por uma assistência baseada em evidências. As (Os) pacientes não são cobaias. Inclusive lançamos uma Nota Técnica do Coren/RS sobre o caso.

BdFRS – Na sua avaliação qual deveria ser o papel da imprensa nesse momento que vivemos?

Rosangela – A imprensa, nesse momento, tem o papel de informar de forma respeitosa, ética e responsável, combatendo especialmente as fake news. Um exemplo disso é a questão das vacinas – têm circulado vídeos sem procedência, que se quer mostram a identificação de profissional ou de um local. Reiteramos que não concordamos com procedimentos inadequados e temos o dever de agir em defesa da população.  

BdFRS – Que mensagem gostaria de deixar aos profissionais da enfermagem e à população?

Rosangela – Em primeiro lugar, uma mensagem de alerta em relação à importância do cuidado individual: siga usando máscara; praticando o distanciamento social; higienizando as mãos com frequência; e ficando em casa, se possível. Neste momento, cuidar de si é cuidar do outro. Que tenhamos sabedoria para enfrentar o dia de hoje e que o amanhã nos traga a certeza de dias melhores. 

E lembrando: #VemVacinaParaTodasETodos  #AbraceAEnfermagem


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Edição: Katia Marko