Rio Grande do Sul

ELEIÇÕES 2022

Luciana Genro vai continuar na luta para eleger Lula e derrotar a extrema direita

Mulher mais votada da Assembleia gaúcha, deputada do PSOL faz uma análise do cenário eleitoral e projeta desafios

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Luciana Genro votando em companhia de seu companheiro de partido Roberto Robaina - Samir de Oliveira

Corajosa e combativa, a deputada estadual reeleita Luciana Genro (PSOL) tem 37 anos de militância. Começou no movimento estudantil aos 14 anos. Foi deputada estadual e federal. Em 6 de junho de 2004, juntamente com Heloísa Helena, João Batista "Babá" e João Fontes, fundou o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Disputou por duas vezes a prefeitura de Porto Alegre.

Foi professora de inglês, é advogada com pós-graduação em Direito Penal e mestra em Filosofia do Direito na USP. Em 2010 fundou o Emancipa, cursinho gratuito preparatório para o ENEM voltado a jovens de baixa renda e, em 2017, a escola Emancipa Mulher, que tem percorrido o Rio Grande do Sul promovendo cursos gratuitos de formação feminista e antirracista.

Em 2014 foi candidata à Presidência da República pelo PSOL, conquistando 1.612.186 votos. Atualmente exerce seu terceiro mandato como deputada estadual, retornando à Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul 24 anos após sua primeira eleição, tendo conquistado 73.865 votos em 2018. Em 2022 reelegeu-se deputada estadual com 111.126 votos, sendo a mulher mais votada e a segunda deputada mais votada para a Assembleia Legislativa.

Para ela, na atualidade, a prioridade das prioridades é eleger para a Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT), derrotando Bolsonaro. “Depois teremos que continuar a luta para terminar com o bolsonarismo, que é o movimento de extrema direita no Brasil”, afirma ela em entrevista ao Brasil de Fato RS. Diz também não se conformar com a derrota sofrida por Olívio Dutra (PT) na disputa pela vaga no Senado, quando se elegeu o general Hamilton Mourão (Republicanos).

Nesta entrevista, Luciana Genro faz uma análise da situação latino-americana, brasileira e do Rio Grande do Sul.

Veja a entrevista na íntegra.

Brasil de Fato RS – Como te sentes por ter sido a mulher mais votada para a Assembleia Legislativa? Qual o significado que isso tem para você?

Luciana Genro –Primeiro me sinto com uma responsabilidade enorme, porque uma votação tão gigantesca também aumenta a expectativa e a obrigação de corresponder a cada um desses votos. Acho que a votação foi resultado de um trabalho coletivo que meu mandato desenvolveu ao longo desses quatro anos e também ao trabalho ao longo de minha vida inteira dedicada à militância política, desde os 14 anos de idade que estou batalhando politicamente.

Em 2010 fiquei oito anos sem mandato e voltei em 2018 e desde então estou na Assembleia Legislativa fazendo um esforço para corresponder à confiança que tenho recebido. E agora, temos a tarefa de colocar o nosso mandato na trincheira da luta para enfrentar o Bolsonaro e o bolsonarismo. O trabalho não terminou e a gente vai voltar para as ruas nos próximos dias para buscar os votos para eleger o Lula presidente.

BdF RS – Que análise fazes desse segundo turno das eleições? Aqui no estado teu partido e a federação apoiariam o Eduardo Leite (PSDB) contra o Onyx (PL)?

Luciana – Olha, primeiro temos que dizer que é um desastre este segundo turno. Porque foi por muito pouco que não conseguimos colocar o Edegar Pretto (PT) para fazer esta disputa. A votação expressiva do Edegar demonstrou o acerto político do PSOL no Rio Grande do Sul em fazer a aliança abrindo mão de sua candidatura para compor esta chapa junto com o Edegar Pretto e com o Olívio Dutra com a presença do Robaina na primeira suplência.

Infelizmente a força do bolsonarismo aqui no estado ainda é muito grande e não conseguimos derrotá-los e emplacar o Olívio como senador e o Edegar no segundo turno. Agora vamos debater. Nem o PSOL, nem a Rede fizeram qualquer discussão. Ainda estamos digerindo todo esse processo, analisando a situação, aguardando as movimentações dos demais partidos e vamos tomar uma decisão nos próximos dias.

Não basta ser mulher, tem que defender os interesses das mulheres

BdF RS – Qual é a tua avaliação da nova configuração da Assembleia? Estes anos teremos 11 mulheres, o que corresponde a 20%, ainda falta muito para se chegar a um espelho da realidade social.

Luciana – Eu acho que aumentar o número de mulheres é sempre um avanço civilizatório porque demonstra que as mulheres estão ocupando seu espaço político, que é um espaço que nós já ocupamos na sociedade como maioria, ou pelo menos de igual para igual com os homens em termos numéricos. Estamos ocupando em várias profissões que haviam sido relegadas somente aos homens. Mas ainda sofremos muitos empecilhos e o maior é a cultura de que cabe à mulher o cuidado com os filhos, com a casa, o machismo, o controle dos homens sobre as mulheres. Isto ainda nos dificulta bastante.

Por outro lado, a gente sabe que o mero aumento do número de mulheres não assegura que as pautas de interesse das mulheres sejam, de fato, fortalecidas. Temos aí a eleição da Damares (Republicanos), ao Senado pelo DF, que como ministra é um desastre para as mulheres. Temos mulheres que se elegem que não têm compromisso de levar adiante pautas feministas.

Não basta ser mulher, tem que defender os interesses das mulheres, especialmente as da classe trabalhadora, daquelas que mais precisam de políticas públicas voltadas para os nossos interesses. Então, é bom, é um avanço, mas ainda insuficiente. Ainda temos muito que lutar para que os interesses das mulheres e daquelas mulheres mais pobres, das mulheres negras, das mulheres trans, sejam de fato valorizados no Parlamento.

Brasil de Fato RS – Que avanços, no teu entender, tiveram o PSOL e a esquerda nesta eleição no Rio Grande do Sul e no Brasil?

Luciana – É difícil falar em avanço da esquerda numa conjuntura tão dura como a que estamos vivendo. O fato de não termos conseguido ganhar com o Lula no primeiro turno demonstra as dificuldades da esquerda no Brasil. Isto tem a ver com um conjunto de fatores que não cabe aqui agora a gente analisar mais detidamente, mas tem a ver também com os erros que o PT cometeu no governo quando esteve, durante 13 anos, governando o Brasil.

Por outro lado, o PSOL cresceu significativamente. Aumentamos a nossa bancada federal. Aqui no Rio Grande do Sul aumentamos a bancada estadual. A chegada do Matheus é muito importante porque traz também esta representação da juventude negra pra dentro da Assembleia e nós acertamos muito na nossa política enquanto partido, estando com o Lula e também aqui compondo a frente junto com o Edegar Pretto.

Isto, obviamente, nos traz um fortalecimento político frente a uma ampla gama de ativistas que atua nos movimentos sociais e que sabe que pode contar com o PSOL e que, ao mesmo tempo, o PSOL tem a sua independência política. Não é um partido que está a reboque do PT ou de qualquer outro partido. Tem a sua personalidade própria. Tem as independências, tem as suas lideranças e assim nós pretendemos continuar.

É preciso ter a consciência de que a luta contra a extrema direita vai ter um fôlego longo

Brasil de Fato RS – Qual é a importância desta eleição no Brasil para o cenário latino-americano e mundial?

Luciana – Sem dúvida uma importância gigantesca, porque a América Latina inteira olha para o Brasil neste momento na expectativa de derrotar a extrema direita. Já temos sinais positivos vindos de outros países como o Chile, como a Colômbia. Mas ainda falta muita coisa na América Latina para que a gente possa dizer que há uma situação favorável parra os interesses da maioria do povo. Obviamente a eleição do Lula ajuda bastante nesta mudança da conjuntura latino-americana, sabendo que a mera eleição do Lula não vai resolver os problemas.

É preciso ter a consciência de que a luta contra a extrema direita vai ter um fôlego longo e para isto é preciso uma esquerda consequente, uma esquerda que não se alia com a burguesia, que não capitula para os interesses da velha política, das oligarquias políticas, do capital financeiro. Uma esquerda independente para poder capitalizar o descontentamento que vai seguir com a política, com os políticos em geral, que foi um dos elementos que alimentou o bolsonarismo. Fortalecer o PSOL, ao mesmo tempo que se luta pela eleição de Lula, é fundamental no médio e no longo prazo para não deixar a extrema direita crescer novamente.

São muitas lutas, este foi meu slogan dentro do mandato

Brasil de Fato RS – E quais são os teus principais projetos para este novo mandato?

Luciana – Tenho em primeiro lugar uma luta muito firme pelos direitos das mulheres. Sou autora da única política pública que existe no Rio Grande do Sul de abrigamento para mulheres vítimas da violência. Partiu de uma emenda parlamentar minha. Também tenho uma luta muito forte ao lado da comunidade LGBT, fui autora da comissão especial e do relatório que apontou um conjunto de políticas necessárias para enfrentar a violência contra a população LGBT. Também sou coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos de Matriz Africana. E fiz uma defesa muito veemente do povo de axé, do povo de religião que sofre discriminação, que sofre intolerância e racismo religioso.

Também tenho uma luta muito forte ao lado das ocupações, a luta pela moradia digna, criei a Frente Paramentar em Defesa da Moradia Digna. Foi a primeira frente que criei aqui na Assembleia. E a educação e os direitos humanos como um todo. A educação que está sucateada, as escolas em petição de miséria, a gente vai lutar para melhorar a qualidade da educação no Rio Grande do Sul. Pelos servidores públicos como um todo, que têm sido massacrados pelo governo Leite, e isso não vai mudar sendo Onyx ou sendo Leite. Os servidores continuarão sendo alvo da sanha de enxugamento do Estado.

E os direitos humanos do povo em geral. Os direitos humanos dos policiais, que têm sido também muito humilhados e super explorados dentro da Brigada Militar. Eu tive muito apoio dentro da polícia por defender os direitos dos brigadianos, ao mesmo tempo eu defendo e luto pelas câmeras nos uniformes. Esta luta vai continuar porque a gente não pode tolerar a violência policial, temos que defender os bons policiais, mas também limpar aqueles que se comportam de forma violenta e criminosa.

São muitas lutas, este foi meu slogan dentro do mandato: “Um mandato de muitas lutas porque são muitas as demandas”. Agora, felizmente, terei mais um deputado do PSOL para compartilhar comigo todas essas batalhas cotidianas que a gente trava.


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Edição: Marcelo Ferreira