Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | Hora de garantir a democracia

Precisamos apoiar à frente ampla que derrotou eleitoralmente o fascismo

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"Muitos brasileiros que aprovaram o governo Lula em 2010 hoje votaram contra ele, e esta é a parcela que a esquerda precisa reconquistar sob pena de perdermos milhões de consciências" - Giorgia Prates

Dois dias depois da derrota eleitoral um Bolsonaro sorridente falou. Econômico, usou menos de dois minutos para declarar-se líder de 58 milhões de brasileiros, seguidor da Constituição, agradeceu votos e minimizou os protestos de seus seguidores. Incluiu o chavão fascista Deus, pátria, família e queixou-se de desfavorecimento durante a campanha, que tumultos são práticas da esquerda e fim.

Encerrou o pronunciamento sem responder perguntas de jornalistas presentes e saiu. Em seguida, Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil, informou estar autorizado pelo presidente a iniciar o processo de transição e que Geraldo Alckmin fará a coordenação do trabalho. Também não respondeu nenhuma pergunta.

Bolsonaro demorou dois dias após o resultado ser oficialmente anunciado pelo TSE. Para os 50,9% de eleitores que optaram pela democracia este silêncio foi bom, desgaste para ideias fascistas da extrema direita tupiniquim. Certo que o bolsonarismo desnudou a concordância com a truculência representada pela família Bolsonaro.

Apesar disto, não temos 49,1% de brasileiros corruptos e fascistas. Muitos eleitores dele votaram induzidos por fake news disseminadas pelas redes, seguiram a recomendação de líderes religiosos tendenciosos, foram cooptados por difamações da mídia hegemônica ou convencidos por inconformados com as pautas sociais e identitárias.

O uso da máquina pública com fins eleitorais e demais aberrações do governo foi relativizado e/ou rendeu votos para o governo, porém a cumplicidade de parte da Polícia Rodoviária Federal abala a segurança e à ordem estabelecida, pois atinge igualmente eleitores de um ou outro projeto.

Brasileiros conservadores detestam e temem mudanças. E a mudança do paradigma de uma polícia defendendo família e propriedade torna-se por demais ameaçadora. É a subversão da ordem estabelecida.

A demora de Bolsonaro em reconhecer a derrota foi relativizada pela extrema direita, mas não para um grande contingente de eleitores dele, por quem lhe deu seu voto considerado Lula um risco ainda maior. Este grupo de temerosos da balbúrdia, apavorado com a perspectiva do desabastecimento, começa a entender a ameaça representada pelo fascismo. E traz a possibilidade do início da pacificação do país.

Não podemos esquecer que ao término de seu segundo mandato Lula recebeu quase 90% de aprovação. Ou seja, muitos brasileiros que aprovaram o governo Lula em 2010 hoje votaram contra ele, e esta é a parcela que a esquerda precisa reconquistar sob pena de perdermos milhões de consciências. Precisamos apoiar à frente ampla que derrotou eleitoralmente o fascismo. Principalmente, temos como tarefa principal afastar esta ameaça.

O velho e árduo trabalho de formiguinha, casa a casa, colega a colega, molde da conquista de consciências, como fez a esquerda militante nos anos 1980/90 prática abandonada em função da institucionalização da esquerda nos sucessivos governos populares.

Aproveitar os tumultos provocados por extremistas e o medo de uma convulsão social, brecha necessária ao diálogo capaz de ampliar o debate e a aceitação de pautas necessárias. Se voltamos ao corpo à corpo para conquistar a vitória nas urnas, sigamos, agora para garantir a democracia.

* Regina Abrahão é educadora no NAR Fatini - FPERGS. Integra o Fórum Interreligioso e Ecumênico do RS e a Associação Movimento Brasil Laico.

** Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko