Rio Grande do Sul

OPERAÇÃO SEPTICEMIA

PF realiza operação para combater organização que desvia recursos públicos da saúde no RS

Terceirizada da área da saúde é investigada por fraude em contratos, em diversos municípios, que chegam a R$ 220 milhões

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Foram cumpridos quatro mandados de prisão e bloqueios de bens e valores, além de 52 mandados de busca e apreensão - Foto: Polícia Federal / Divulgação

A Polícia Federal (PF) deflagrou, nesta quarta-feira (7), com o apoio da Controladoria-Geral da União (CGU), a Operação Septicemia para reprimir atividades de uma organização criminosa que estaria voltada à fraude em licitações e desvio de recursos públicos em contratos de saúde em municípios do Rio Grande do Sul. Foram cumpridos quatro mandados de prisão e bloqueios de bens e valores, além de 52 mandados de busca e apreensão.

Estão mobilizados na força-tarefa 200 agentes da PF e 10 servidores da CGU. Dentre os mandados de prisão, três foram em São Leopoldo e um em Porto Alegre. Os mandados de busca e apreensão foram nos municípios de Porto Alegre (18), São Leopoldo (12), Canoas (5), Rio Grande (3), Dois Irmãos (2), Nova Prata (2), São José do Norte (2), São Lourenço do Sul (2), Caxias do Sul (1), Esteio (1), Piratini (1), Sapucaia do Sul (1) e Brasília-DF (2).

Segundo a PF, a Operação Septicemia teve início com a análise de extenso material apreendido na Operação Autoclave (2019), que apurou irregularidades na prestação de serviço pela Organização da Sociedade Civil (OSC) investigada, em contrato firmado para atuação em uma Unidade de Pronto Atendimento no município de São Leopoldo. Com o avanço das investigações, constatou-se que a OSC expandiu sua abrangência nos últimos anos, com a prestação do serviço para diversas prefeituras gaúchas, em contratos que somam aproximadamente R$ 220 milhões.

A Operação Septicemia apura os crimes de organização criminosa, corrupção ativa e passiva, fraude em licitação, fraude em prorrogação e aditivos de contratos, advocacia administrativa, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, entre outros possíveis.

Uma coletiva de imprensa foi concedida na manhã desta quarta, trazendo mais informações sobre a investigação em curso. Participaram o superintendente regional da PF no RS, Aldronei Rodrigues, o superintendente da Controladoria Regional da União do RS, Fábio Santiago Braga, o delegado regional de Investigação e Combate ao Crime Organizado, Tiago Machado Delabary, e o delegado da Polícia Federal Eduardo Dalmolin Bollis, responsável pela investigação.

Conluios em contratos e editais

Conforme explicou o delegado Eduardo Dalmolin Bollis, a partir da investigação de 2019, foram analisados diversos documentos que apontam que a OSC não era sem fins lucrativos, como exigem os processos de participação em editais junto à Administração Pública. “Nos chamou a atenção termos encontrado, desde o início, documento com menção a tabelas onde estavam diluídos na conta dos orçamentos a palavra ‘lucro’. Outro ponto interessante foi a questão da presença de determinados interlocutores que faziam a aproximação entre essa organização e a alta cúpula das prefeituras municipais, especialmente as secretarias municipais de Saúde, em determinado momento nos chamou a atenção a questão de fazerem menção a expressão ‘comissões’, ponto que diz respeito à entidade sem fins lucrativos trabalhando com ideia de comissionamento de pessoas fazendo a aproximação dessas prefeituras.”

Foram encontradas “uma gama de problemas bastante substanciais”, disse o delegado, como licitações com simulações de concorrência que levaram a OSC investigada a vencer os certames e outros documentos que apontam que a instituição estava inserida dentro dos processos seletivos. “Todas essas questões fizeram com que acabássemos encontrando a importância de analisar como estavam sendo feitas as negociações no âmbito desses contratos”, complementou.

Ainda segundo Bollis, há indicativos de possíveis irregularidades numa gama muito maior de municípios do que os que aparecem na investigação deflagrada hoje. “Teremos análise caso a caso das prefeituras em relação a estar sendo ou não feita a prestação de serviços. Em algumas cidades a comunidade não sabe o quanto o município despende naquele contrato e o município acaba gastando muito mais com essas entidades do que elas realmente propiciam nos serviços contratados”, comentou.

O superintendente regional da PF, Aldronei Rodrigues, disse que foram identificados possíveis conluios entre agentes públicos pertencentes ou ligados à organização social. “A Controladoria Geral da União fez o levantamento, a Polícia processou e vamos seguir processando para evidenciar cometimento de mais crimes e apontando outros agentes. O trabalho de hoje vai dar sequência a diversas outra etapas da investigação”, afirmou.

Terceirização é “campo fértil a fraudes”

O delegado Tiago Machado Delabary apontou que a investigação se debruça em terreno “muito fértil a fraudes”. Comentou que o país tem 5.570 municípios destinatários de recursos federais e que muitos optam pelo modelo de saúde terceirizado. “Isso acabou dando ensejo, nacionalmente falando, a um mercado em que organizações não governamentais se apresentam como solução, e muitas vezes são, com base legal, com incentivos tributários para o que o município justifique essa terceirização, mas na verdade são empresas disfarçadas”, afirmou.

Segundo ele, a PF está muito atenta a esse tipo de crimes, pois esse mercado alimenta relações ilícitas de direcionamento que vão de encontro a necessidade de economicidade do município, com contratos eficientes e propostas vantajosas. “Todo esse contexto acaba, como é bem comum, dando vazão a pagamentos ilícitos de todo esse contexto que se aplica ao que está sendo amputado, com o início dessa fase ostensiva da investigação, que pode suscitar deflagração de fases subsequentes.”

O superintendente da Controladoria Regional da União Fábio Santiago Braga reforça que a legislação permite a contratação de organizações civis para prestar serviços de características públicas em interesse da comunidade. “Só que essa legislação possibilita a contratação diante de alguns condicionantes, um deles que a entidade tem que ser de interesse público e sem finalidade lucrativa. Essas entidades na verdade se convertem como empresas comerciais que buscam lucros em diversos municípios”, ponderou.

Afirmou ainda que essa nova etapa da operação corrobora com o que foi encontrado em 2019: “fraude no processo licitatório, favorecimento de pessoas, pagamentos indevidos a gestores, uma diversa gama de irregularidade, contratos com superfaturamento. A ação de hoje traz novas provas para conseguir, ao final, corroborar os indícios coletados até o momento”, finalizou.

Prefeitura de São Leopoldo lança nota oficial

Na tarde desta quarta-feira (7), a Prefeitura de São Leopoldo lançou uma nota oficial sobre a operação e os mandados de busca e apreensão de documentos.

"Sobre a operação da Polícia Federal e da Controladoria Geral da União (CGU) denominada de Septicemia, que investiga uma organização social que presta serviço em saúde, realizada na manhã desta quarta-feira, 7 de dezembro, em diversas cidades gaúchas, no DF, entre elas São Leopoldo, a Prefeitura informa:

A relação com a organização social alvo da operação é uma prestação de serviço, oriunda de um devido processo licitatório tipo pregão, realizado em 2017, para a gestão da UPA 24h Zona Norte.

A contratação referida, garantiu ainda a ampliação no atendimento prestado à população com a redução dos custos para o Município.

Tendo em vista o encerramento do prazo contratual, um novo edital está em andamento para a seleção de organização social que fará a gestão da UPA 24h Zona Norte.

Seguimos sempre todas as determinações e sugestões apontadas pelos órgãos de fiscalização e controle, no sentido de garantir a transparência e legalidade de todas as ações desenvolvidas pela nossa Gestão.

No dia de hoje foram cumpridos os mandados de busca e apreensão de documentos e a Administração Municipal acompanhou e colaborou, prestando todas as informações e documentos solicitados."


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Edição: Katia Marko