Rio Grande do Sul

Direito indígena

Em dossiê entidade aponta irregularidades em pedido de reintegração de posse

Em outubro deste ano, indígenas Kaingang e Xokleng retomaram a área de um terreno abandonado no Morro Santana

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Atualmente a maioria dos que habitam a área são mulheres e crianças, 56 no total - Foto: Alass Derivas | @derivajornalismo

No dia 18 de outubro de 2022, indígenas Kaingang e Xokleng retomaram a área de um terreno abandonado no Morro Santana, que pertenceria formalmente à Maisonnave Companhia de Participações, reivindicando o espaço como de uso tradicional kaingang e xokleng e denominando o território como Retomada Gãh Ré.

No início deste mês a Justiça Federal determinou a reintegração de posse do terreno no Morro Santana. A Federação Anarquista Gaúcha (FAG), organização que compõe o grupo de apoio a Retomada, elaborou dossiê que aponta irregularidades da reintegração movida pela empresa. 

Um pré laudo antropológico feito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) aponta que no último século o Morro Santana tem sido território de moradia de famílias Kaingang e Xokleng, cujos mais velhos nasceram nas Terras Indígenas de Borboleta, Serra Grande, Ventarra, Nonoai, Guarita, Votouro e São Francisco de Paula. 

“É possível afirmar que o Morro Santana se configura como um território de uso tradicional Kaingang cuja memória ancestral se enraíza na relação com determinados usos do território (manejo florestal, colheita de ervas, raízes, plantas) que possuem uma relação espiritual e política. Essa afirmação também se embasa na persistência dos Kaingang reivindicarem esse local como o espaço destinado para as futuras gerações crescerem reproduzindo o modo de vida dos kofá, dos antigos”, destaca o relatório. 

Contudo, pela decisão da juíza Clarides Rahmeier, da 9ª Vara Federal, os indígenas têm até segunda-feira, 19 de dezembro, para deixar voluntariamente o local. Caso não deixem o local, Rahmeier autorizou “execução forçada com apoio de força pública”. A Maisonnave Companhia de Participações, proprietária do terreno, planeja construir um loteamento, já aprovado pela prefeitura, com 11 torres, 714 apartamentos e 865 vagas de estacionamentos. 

Atualmente a maioria dos que habitam a área são mulheres e crianças, 56 no total.

Dossiê destaca irregularidades 

De acordo com o dossiê elaborado pela Federação Anarquista Gaúcha (FAG), há uma série de irregularidades, fraudes e crimes envolvendo o Grupo Maisonnave. 

Conforme aponta o texto, a empresa Maisonnave Companhia de Participações ajuizou pedido de reintegração de posse, distorcendo fatos e empregando uma narrativa caluniosa contra os povos indígenas, alegando, dentre outras acusações, que “a invasão foi planejada por uma legítima organização criminosa”.

No material a Federação destaca ainda a ligação da família Maisonnave com o mercado financeiro que atravessa gerações. “É antiga a aliança entre o capital e o Estado. Entre banqueiros, empresários, militares, políticos e setores do Judiciário, o caso dos Maisonnave evidencia mais uma vez que as classes dominantes, na medida de suas necessidades, se unem em torno de um projeto unificado de poder. (...) Diante de todas essas questões, relativas tanto aos crimes ambientais cometidos por seu ex-proprietário José Asmuz e a mineradora Depósito Guaporense, quanto aos crimes contra o sistema financeiro nacional, cometidos pelos atuais proprietários da Maisonnave Companhia de Participações, é preocupante que o grupo tenha recebido Licença Prévia para construir um grande condomínio no local”, expõe. 

Na reportagem publicada pela Matinal, a cacica Iracema Gã thé Nascimento resume o sentimento da comunidade diante da decisão da juíza. “Nós não estamos roubando nada de ninguém, não queremos todas as terras do Brasil. Queremos um pedaço que nos foi roubado para conservar a vida”, disse ela, com a voz embargada. “Esse senhor (referindo-se à família Maisonnave) já tem o suficiente para viver. Nós só queremos preservar o mato que dá oxigênio para as pessoas, para esses condomínios”. 

Veja aqui o Dossiê completo.


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Edição: Katia Marko