Uma visão popular do Brasil

Uma performance incrível, à capela, da Mãe Bia, mulher negra representada no mural do DAER, no dia da sua inauguração, próximo ao Centro Administrativo do estado, interpretando o “Canto das três raças”, rodeada de manifestantes, é o início que faz vibrar fibra à fibra da alma! Segue o belíssimo poema “Defender a alegria”... como uma trincheira... a evocar o uruguaio Mário Benedetti, com narrativa em off que costura o encadeamento de um conjunto de filmagens e registros fotográficos no emocionante vídeo produzido pela equipe do Brasil de Fato RS (veja abaixo); uma forma de agradecer o apoio dos milhares de leitores/as, colaboradoras/es e apoiadores, amigos e amigas, ao final do 2022.  Ao mesmo tempo é, declaradamente, uma exortação ao “amor por princípio” e que por isso mesmo é ontologicamente solidário e revolucionário – na busca de “um pais mais justo, mais democrático, mais plural”. Pois, como diz o texto: “Não há ordem e progresso sem amor”.

 

Como muitos leitores e eventual colaborador do Jornal Brasil de Fato RS, não deixo de me emocionar, agradecer pelo espaço e apoio, sobretudo às lutas das/dos trabalhadoras/es da escola pública. E reconhecer a grandeza deste mais-do-que-Jornal, que completou quatro anos aqui no RS, em julho, e que em 2023 chega a duas décadas em nível nacional. Vida longa ao Brasil de Fato RS! 

Oxalá que 2023 nossas esperanças possam se reenergizar para vencer o medo que teima em sobreviver, e que a promessa de reconstrução do país se cumpra, o que todos desejamos, por certo. Que a periferia seja o centro – da economia, da política, do orçamento, das prioridades, sobretudo beneficiando o povo empobrecido e trabalhador.

A periferia é o centro!

Este é o título de um Ensaio Fotográfico, na forma de lambe-lambes, produzido por estudantes dos nonos anos da escola pública EMEF Saint Hilaire, localizada no limite de Porto Alegre com Viamão, ao leste, à beira do Parque Saint´Hilaire. Em imagens em grande formato, coloridas, cada estudante teve uma foto selecionada para compor este que é o último trabalho participação na escola, já que são concluintes do Ensino Fundamental.

Lambe-lambes são um meio de socializar a arte na rua. Com baixo custo, consta da fixação de painéis de papel em paredes, tapumes e objetos visíveis aos transeuntes. Democrático, pode ser instalado concomitante em muitos locais e chama a atenção para a necessidade da produção sair para fora dos muros e paredes dos espaços de exposição clássicos. Uma forma de resistência estética e política muito eficaz!

Livro, Oficina e Ensaio fotográfico

A partir de uma cobertura jornalística sobre o trabalho pedagógico em torno das eleições e do voto dos jovens a partir dos 16 anos, desenvolvido nas aulas de História na EJA (Educação de Jovens e Adultos), que se seguiu ao lançamento do livro "E se a periferia fosse o centro?" Escrito por dezenas de estudantes da escola, nasceu uma proposta de Oficina de Fotografia, organizada pela premiada fotojornalista Camila Hermes, destinada a estudantes concluintes do Ensino Fundamental e que contou com a colaboração do fotógrafo Guilherme Kindermann.

Capa do livreo "E se a periferia fosse o centro?" / Foto: Divulgação

De uma série de encontros, entre outubro e dezembro de 2022, com participação de cerca de 15 alunas e alunos, nasce a exposição, que reafirma o direito à cidade e à educação pública, desde os olhares e percepções de jovens da periferia de Porto Alegre. No link ela pode ser apreciada no formato online em https://gkindermann.com/a-periferia-e-o-centro.

Locais para visitação e apoios

A exposição pode ser vista em três espaços: na escola, no bairro e no Centro Histórico da cidade.

Na EMEF Saint Hilaire, está na parede frontal externa (Rua Gervazio Braga Pinheiro, 427, Vila Panorama, Bairro Lomba do Pinheiro) e no lançamento feito registro em vídeo.

Exposição pode ser visitada em comércio na Lomba do Pinheiro / Foto: Divulgação

Também pode ser visitada na Cafeteria e Lancheria Recheadinhos (Instagram: @recheadinhos), na Av. João de Oliveira Remião, 6634 (na porta de entrada do Supermercado Zanella), espaço de grande circulação e congraçamento da comunidade. Nosso agradecimento muito especial à gentileza de Thaiane Zanela e Luiz Ricardo Frozi, sócios-proprietários do Recheadinhos, pela acolhida, pelo incentivo e pela cedência do espaço para exposição – a demonstrar o muito que a periferia merece e precisa ter. Confira aqui o vídeo.

Nos próximos dias também pode ser visitada no Centro Histórico da cidade, próximo à Secretaria Municipal de Educação.

Veja, aprecie, divulgue! A esperança reside em boa medida nessa moçada que com seus olhares, percepções, sensibilidade e criatividade sonha e se movimenta para que dias melhores povoem nosso cotidiano! Valeu gente! Erika Eduarda Farias, Fabíula Leiria Barbosa, Heloisa Monique Silva do Nascimento, Jullia Justo Bueno, Kamilla de Souza Menezes, Louise Kipp Rodrigues, Maria Clara Santos, Matheus Soares e Thomas da Silva Dalferth.

Água é vida

Ao terminar a colagem dos lambes na Lomba do Pinheiro, já com a noite avançada, me dirijo a uma bica para lavar as mãos e o material, impregnado do “grude”, cola caseira. Eis que da torneira nada sai. Mais uma vez falta água, desta vez próximo às festas de Natal, em dia particularmente quente e abafado, assim como no Extremo Sul, Restinga, região Leste e parte da zona Sul.

Foto integrante do Ensaio Fotográfico / Reprodução

Penso e falo para meu neto, Benjamim, de 11 anos, que me acompanha na empreitada: não poderia ser mais atual essa exposição! A periferia é o centro da vida da classe trabalhadora – ela irriga a cidade com seu trabalho, como dissemos na abertura do livro (link para acesso e download), mas nela falta até mesmo a água!

Governantes de perfil neoliberal como o prefeito Sebastião Melo (MDB), dando sequência à política nefasta de Nelson Marchezan Jr. (PSDB), mantém a obstinação de desmontar e sucatear o DMAE (Dpto. Municipal de Águas e Esgoto) com o objetivo de entregar a concessão e privatização da água e do saneamento público. O escândalo recente em relação ao oportunismo de Eduardo Leite (PSDB), no apagar das luzes, com a venda arranjada da Corsan é revelador que se trata de mais uma falácia para beneficiar, mais uma vez, os donos do capital e precarizar a vida de nossa classe – que deveria ser o centro da preocupação dos gestores. Serviços de água estão sendo reestatizados no mundo todo devido aos valores cobrados, piora dos serviços e desrespeito à legislação ambiental!

Água não é mercadoria. Água é vida!

Obrigado, Brasil de Fato RS! Sem vocês a luta seria muito mais difícil, mais dura e com menos poesia. Para nós sempre foi e continuará atual a máxima: A periferia é o centro!

* Marco Mello é professor de História e Filosofia da Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre, na EMEF Saint Hilaire

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira