Rio Grande do Sul

CIDADE PARA QUEM?

Artigo | As reformas autoritárias contra a natureza e o convívio das pessoas

Nosso Centro Histórico de Porto Alegre perde sua característica e traz forte prejuízo operacional à sua população

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Viaduto Otávio Rocha, conhecido como viaduto da Borges, e arredores, passa por reformas - Foto: Pedro Piegas / PMPA

Em uma quadra da avenida Borges de Medeiros, anterior à cinemateca Capitólio, entre as ruas Demétrio Ribeiro e Fernando Machado, tivemos um conjunto de corte de árvores que, somados aos realizados em outros momentos, fez uma perda em que das dezoito árvores originais restem agora somente oito. Além disso, outras atividades como o deslocamento de quatro paradas de ônibus para uma calçada direcionado à Restinga, na zona Sul, altera totalmente as funções urbanas e traz graves problemas de trabalho, negócios de pequenas e médias empresas e, inclusive, dificuldade nas atividades de relacionamentos com as pessoas.

Já está gerando um conjunto de dificuldades em questões de serviços locais como o recolhimento de lixos, estacionamentos de carros e ambulâncias, atravessar as avenidas e outros. Ali sempre tivemos encontros com amigas e amigos, saudações e trocas de conversas importantes e saudáveis. Da mesma forma é necessário demonstrar que a população que acessa aos ônibus teve um distanciamento maior, o que exige caminhadas maiores e cansativas.

Não é casual que em uma só quadra e de uma só calçada temos três restaurantes, três salões de corte e embelezamento de cabelo, três bares de agradáveis cafés com ótimos encontros de pessoas, uma farmácia, uma empresa tecnológica e duas lojas de produtos culturais caseiros.

Diversos são os motivos que historicamente conduziram a esta rica e bela relação urbana. O próprio projeto para sua construção foi realizado em 1928 entregue para a sociedade em 1935 quando as avenidas eram construídas no convívio das pessoas da sociedade. O objetivo não era simplesmente o automóvel, mas as pessoas. A própria arquitetura, no início em forte presença do estilo Art Decort, mas depois outros estilos foram se desenvolvendo como o próprio, por exemplo, o prédio de estilo de arquitetura moderna como aí próximo do Mercado Público que hoje é a Loja Lebes.

Ocorre que a vida se desenvolveu com a riqueza de um conjunto de atividade e expressões da população, por ali muitas vezes tínhamos o carnaval, os trajetos de verdadeiras passeatas para o futebol. Mas também a manifestação social de diversas características. Junto temos a maravilhosa Cinemateca Capitólio que inicialmente era o Cinema, desde 1928.

Junto também temos na praça Daltro Filho atividades de forte atração como as duas feiras que são desenvolvidas nos sábados de cada semana. Logo adiante na Demétrio Ribeiro temos uma feira de antiquários e na rua seguinte a feiras de artesanais.

Todas estas atividades são atraentes e de convívio. Elas devem ser preservadas e estimuladas com ações favoráveis. A Associação de Amigos da Cinemateca Capitólio, por exemplo, propôs uma das exposições na praça Daltro Filho, que foi aceita pela prefeitura e inaugurada com a presença do próprio prefeito. Atividades de estímulo com a população devem ser desenvolvidas e não as que dificultem e mesmo impeçam os valores desde a inauguração, e que a população aproveita e gosta e inclusive, continuando estes valores, já construiu outros novos.

Até agora não foi dito por que foram cortadas tantas árvores e qual a expectativa de soluções futuras. Da mesma forma não fomos informados da presença das paradas de ônibus. Menos ainda quais são as futuras atitudes com estas árvores, com as que restaram e principalmente qual será a programação de plantação de novas árvores.

É preciso ser claro que na nossa área, em que vivemos, ou por onde muitas pessoas participam, deve haver diálogo e muito respeito. Não são somente sobre os temas levantados é necessário estabelecer o debate e a participação. O autoritarismo só pode ser para quem assim gosta de ser e tem outras intenções aqui e nas demais áreas do Centro Histórico. Por exemplo a especulação imobiliária que deforma e prejudica para conseguir o lucro fácil.

* Urbanista e Historiador  

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira