Rio Grande do Sul

Coluna

Felicidade é ter 11 ministras mulheres

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"Finalmente, chegaram ao fim os mistérios para voltarmos a ter Ministérios. Isso é uma alegria só. Você também está sentindo essa emoção toda?" - Foto: Tânia Rego/Agência Brasil
Vocês notam como somos uma pluralidade de mulheres em movimento?

Eu sei que nunca vai ser tudo o que a gente quer, mas agora me sinto vivendo um sonho. E não quero acordar.

Penso em 11 e sinto como se agora sim, as mulheres, caminhássemos com as nossas duas pernas. Pra frente Brasil!, quero gritar. Pra frente mulheres brasileiras, protagonistas da nossa época!

Depois de 6 anos de retrocesso, de muito medo, raiva, violência. Ódio. Preconceito. Não aceito!

Nunca consegui chamar àqueles dois coisos de presidentes. Um dele dava medo, o outro, se achava um mito. E eu quero dar muitas gargalhadas.

Mas agora, até eu, que sou anarkista, sorrio pensando em Lula e Janja.

Como eu já disse, nunca será tudo que a gente quer, até porque é uma frente ampla que nos permitiu tirar o fascismo do poder e porque o mundo está em movimento, em constante mudança e os conflitos são inerentes à vida. Finalmente, chegaram ao fim os mistérios para voltarmos a ter Ministérios. Isso é uma alegria só. Você também está sentindo essa emoção toda?  

Termos um Ministério dos Povos Originários é inédito no Brasil e imagino que na maioria dos países de Abya Yala, nome que era dado pelos povos ao que passou a ser chamado de continente americano. E termos a Sônia Guajajara de ministra, é um sonho, um luxo, uma alegria!

Temos Ministério de Igualdade Racial, com Anielle Franco, gente, Marielle presente! Voltarmos a ter um Ministério de Mulheres que não esteja relacionado à família heterossexual como único modelo, com Cida Gonçalves; Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação! Num país cujo líder era negacionista!, agora temos a Luciana Santos; temos a Marina Silva no Ministério do Meio ambiente, com uma evidente mudança no nosso presidente; temos a Nísia Trindade, gente, presidenta da Fiocruz, no Ministério da Saúde, primeira vez que Brasil tem uma ministrA na saúde; Margareth Menezes no Ministério da Cultura. Que belezura!

Vocês notam que muitas das mulheres são negras, né? Era hora de que as mulheres brancas e urbanas tivessem a possibilidade de se reconhecer em mulheres negras, indígenas, lésbicas. Haverá alguma ministra lésbica? Assumida, acho que não, felizmente temos em Brasília algumas deputadas, como a nossa kerida Daiana Santos.

Vocês notam como somos uma pluralidade de mulheres em movimento?

Sou uma ativista da/s palavra/s. Penso que cada vez que falam em mulher, no singular, o cérebro vai na gaveta e procura o modelo, o único, a norma. Deixando a maioria de nós do lado de fora. Não cabemos no único conceito de MULHER branca, burguesa, heterossexual, monogâmica com um casal de filinhxs. Mas quando falamos no plural, as possibilidades se expandem e todas temos a nossa vez. Lembrando também que a diversidade é uma riqueza, é o oposto à monocultura aos estados totalitários que rendem culto a um modelo único. Nós, mais que modelos, queremos referências.


Sônia Guajajara e Anielle Franco tomaram posse em cerimônia lotada, com presença de Lula e Dilma / Foto: Ricardo Stuckert

Falemos daquele momento apoteótico que foi a posse conjunta de Sônia e Anielle. Quanto simbolismo aí. Sonhemos juntas um sonho coletivo! No seu discurso, a ministra dos Povos Originários disse que “O futuro é ancestral”. Essa frase é o título de um livro de Ailton Krenak no qual ele afirma: “Os rios, esses seres que sempre habitaram os mundos em diferentes formas, são quem me sugerem que, se há futuro a ser cogitado, esse futuro é ancestral, porque já estava aqui.” Lembra à frase “Exu matou um pássaro ontem com uma pedra que só jogou hoje”. É um antigo ditado ioruba. Penso que se Anielle, a irmã da então vereadora e ativista lésbica do complexo da Maré, está hoje tomando posse como ministra de Igualdade Racial, tem a ver com uma luta que já tinha começado, há tempos, por muitas outras pessoas, dentre elas, sua irmã Marielle Franco.

(Ver Anielle grudada num abraço com o ministro da Justiça e Segurança Pública, um abraço cheio de carinho e cumplicidade, no que ele promete não parar até encontrar quem mandou matar Marielle, é de arrepiar, minha gente! Esse é o mundo dos meus sonhos.)

As duas frases que citei, nos tiram da linearidade do tempo, nos oferecem outras visões às quais a educação branca europeia nos mal educou e fomos obrigadas a ter como pensamento único e a chamá-lo de nosso. Será que abrindo outras possibilidades não conseguimos também abrir mundos e abandonar o Universo para deslocarmos ao Pluriverso? Que poema de possibilidades.

* mariam pessah : ARTivista feminista, escritora e poeta, autora de “Em breve tudo se desacomodará”, 2022. Organizadora do Sarau das minas/Porto Alegre.

** Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko