Rio Grande do Sul

VIOLÊNCIA POLICIAL

Moradores da Bom Jesus organizam manifestação pela paz

A comunidade, que sofre hoje com o crescimento da violência policial, busca conservar os direitos de seus habitantes

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Moradores da comunidade estão usando as redes sociais para narrar cenário de guerra - Foto: Reprodução

Neste domingo (22), a manifestação A Bonja Quer Paz reunirá moradores da comunidade Bom Jesus de Porto Alegre. Será realizada uma caminhada pelas ruas do bairro para reivindicar o fim da violência e a garantia de direitos básicos.

O território da Bom Jesus é palco de rotineiras intervenções policiais que, segundo relatos dos habitantes, vêm mostrando-se abusivas e desrespeitosas. O ato é organizado por lideranças comunitárias de diferentes áreas de atuação e busca ser abrangente em suas pautas, mas possui como elemento central denunciar e condenar as ações opressoras do poder público.

O estopim para a preparação da passeata foi uma abordagem policial ocorrida no dia 11 de janeiro, onde um jovem que andava em sua motocicleta foi arremessado ao chão em frente aos filhos. "Eu chamei a prima dele e disse: a gente precisa fazer alguma coisa, ficar só compartilhando nas redes não vai nos dar uma solução”, afirmou Marina Schmitt, 25 anos, que trabalha na área de moda e comunicação. Marina destaca também o esforço dos manifestantes em engajar a população jovem na luta para fazerem seus direitos serem assegurados pelo Estado e respeitados pelos agentes públicos de segurança. “Os avanços da Bom Jesus nos últimos anos surgiram através do movimento comunitário, mas estas lideranças estão ficando mais velhas, algumas até faleceram. Se a juventude da geração atual não retomar esse movimento o cenário vai ser de piora.”

Os relatos de abuso de poder por parte das autoridades policiais são abundantes: circulam em redes sociais, por exemplo, imagens de casas danificadas por batidas policiais sem mandado. Além disso, moradores mencionam agressões verbais e atitudes constrangedoras como revista de celulares sem qualquer justificativa legal. “A polícia abordou meu guri de 12 anos e ameaçou levar ele [...] Não sei se tenho que ir na Corregedoria, onde que eu tenho que ir…,” expõe uma mãe em áudio. O ponto em comum entre todos os casos é a suspensão do direito de ir e vir de estudantes e trabalhadores da comunidade que estão receosos de serem constrangidos por policiais.


Relato de morador sobre ação da polícia em sua casa / Foto: Reprodução

Morte de policial acentuou presença da PM na região

A escalada das operações policiais na Bom Jesus iniciou a partir da morte do policial militar Lucas Jesus de Lima, soldado do 20º Batalhão da Polícia Militar de Porto Alegre. Natural de Salvador, Lucas faleceu após ser baleado em uma tentativa de assalto no Morro Santana, bairro fronteiriço à comunidade, enquanto trabalhava como motorista de aplicativo. Um dos dois assaltantes também veio a óbito na Unidade de Pronto Atendimento Bom Jesus.

Após o ocorrido, PMs do 11º e do 20º Batalhão da Polícia Militar, aliados ao Batalhão da Polícia de Choque, realizaram uma forte investida na Bom Jesus, ocupando com diversas viaturas o Campo Panamá. A partir daí, a polícia intensificou a abordagem de pessoas e veículos na região sob o pretexto de identificar outros indivíduos envolvidos no assalto que vitimou o soldado.

“Vivemos uma guerra que não é nossa”, diz Ana Regina Medeiros de Lima, conhecida como Maninha, uma das lideranças comunitárias da Bom Jesus. Com o patrulhamento constante da polícia no bairro, o número de conflitos entre brigadianos e residentes aumentou, como atesta a troca de tiros ocorrida na quinta-feira passada (12) entre policiais militares e três indivíduos. “A gente tinha uma relação com a Brigada Militar totalmente diferente do que a gente tem hoje, a gente tinha uma base da Brigada na vila. Os governos que vieram não se preocuparam com a realidade daqui”, conta Maninha.

Deputado busca formalizar reivindicações

A manifestação que irá acontecer no próximo domingo não é a primeira. Na terça-feira (17), moradores da Bom Jesus protestaram contra a violência policial. Nos cartazes, os manifestantes, em sua maioria mulheres, pediam paz e denunciavam as opressões cometidas pelas forças policiais. Em entrevista para a Record TV, o Comandante do 11º BPM, Tenente Coronel Daniel Araújo de Oliveira, defendeu a presença da polícia militar na comunidade como forma de combater e coibir crimes. Apesar do protesto não apresentar risco, caminhonetes e motos da PM, além de um número expressivo de policiais, estiveram presentes no local.

Como forma de institucionalizar as reclamações, um ofício contendo os relatos de abusos foi protocolado pelo deputado estadual Adão Pretto Filho (PT) na Casa Civil do Estado do Rio Grande do Sul. O deputado também esteve reunido com o secretário de Segurança Pública, Sandro Caron. Outra reunião com o Comando da Brigada Militar aconteceu hoje (19) às 16h. Segundo o documento, os atos de violência são perpetrados por policiais que omitem suas identificações, valendo-se de máscaras, capuzes e do não-uso de seus nomes na farda.


Reunião do deputado estadual Adão Pretto Filho com a Secretaria de Segurança Pública do Estado / Divulgação

A manifestação A Bonja Quer Paz tem início às 16h e parte da Escola Estadual de Ensino Médio Antão de Faria. Os participantes são instruídos a vestirem branco ou cores claras para simbolizar os pedidos pelo cessar da violência.


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Edição: Katia Marko