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Clima e saúde

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"Estamos claramente fomentando práticas que aceleram o aquecimento planetário e seus impactos sobre a saúde de tudo que respira nesta casa comum" - WikiCommons
A recuperação do sentido da existência está a exigir reaproximação (e respeito) com a natureza

Nesta semana em que o Robin perdeu a imunidade parlamentar, quando seu Batman ameaçou renunciar  e sumir de cena, e Collor tende a ser preso por mais de 30 anos, a Aliança Global pelo Clima e Saúde  promoveu seu primeiro “Dialogo estrategico de clima y salud en respuesta al reporte Lancet Countdown para Sudamérica”

Tratando-se de reação ao Relatório 2022 da Revista Lancet, onde são expostos (e analisados) indicadores de impactos das Mudanças Climáticas sobre a Saúde, na América Latina, esta notícia (que dá continuidade a conteúdos já avaliados em publicação anterior da Lancet) merece atenção e comentários.

Destaque-se que neste primeiro Diálogo Estratégico sobre Clima e Saúde (os organizadores afirmaram que ocorrerão outros) foram examinados apenas alguns dos aspectos trabalhados naquele documento. Um mínimo, mas o suficiente para alarmar qualquer cidadão não embotado pela síndrome do negacionimo. Afinal, trata-se de resultado de colaboração entre cientistas de 21 instituições acadêmicas e agências da ONU, onde as afirmativas, apesar de cautelosas, não deixam margem para dúvidas. Em verdade, e por desconhecimento ou complexo de avestruz, estamos ignorando uma realidade que já se impõe, transformando este planeta em território inadequado ao que entendemos por humanidade. 

Pior do que isso. Estamos claramente fomentando práticas que aceleram o aquecimento planetário e seus impactos sobre a saúde de tudo que respira nesta casa comum. Financiamos atividades que determinam a emergência descontrolada de incêndios florestais e inundações, que induzem ao surgimento e à expansão de doenças infecto contagiosas e que aceleram todas formas de agressividade, agravando a hostilidade do planeta à vida na terra.

As desigualdades se ampliam, os serviços ambientais se reduzem, as colheitas perdem produtividade, as fontes de água escasseiam, os desertos avançam. E tudo isso se reflete em evolução das taxas de mortalidade humana (foco nas pessoas com menos de 1 ano e mais de 65 anos) provocada pelo calor.  

O documento reclama a urgência de um tratado internacional sobre a não proliferação (e a eliminação progressiva) do uso de combustíveis fósseis. Aponta, entre outros aspectos, para a necessidade de remodelação nos sistemas de produção e nas formas de intervenção e acesso aos territórios.

Estes seriam apenas alguns dos instrumentos necessários ao enfrentamento imediato de dramas já consolidados e que, graças à estupidez e desinformação coletiva, continuam avançando. Vejam que isso, além de estender as dificuldades impostas ao governo Lula por representantes daquela coalizão entre as bancadas do ódio e os interesses das transnacionais da morte, também alimenta conflitos internos. Como o atual embate entre a ministra Marina Silva e o senador Randolfe sobre a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.

Ok, para entender o que de fato está rolando, e qual seria o caminho do mal menor, precisamos de informações. E o documento da Lancet reforça esta ideia. Seus autores apontam a necessidade de trabalhos voltados ao esclarecimento e à conscientização social, que ajudem a destravar a apatia e que animem a prática de ações conscientes em defesa da saúde planetária. 

No Brasil isso poderia ser ilustrado, por exemplo, com ativismos destinados a garantir apoio massivo, do povo e do governo, às proposições do Plano de Reforma Agraria Popular, do MST. Afinal, a coragem e a ousadia relacionadas ao cultivo de 100 milhões de árvores, à conversão de base agroecológica em áreas reformadas, aos processos educativos emancipatórios e a outros conteúdos ali expostos, que se enquadram no universo de ações urgentes, precisam ser estimulados. 

Tentativas de supressão a estas e a outras iniciativas de caráter similar devem ser desmascaradas como o que realmente são: mecanismos de apoio à continuidade da estupidez golpista que avança rumo ao fascismo (e agora até a Revista Lancet o afirma) ameaçando a vida em si. 

Como escreveu Luiz Marques, este é o decênio decisivo. Estamos diante de momento histórico em que nossas ações e omissões determinarão a realidade que será imposta aos que eventualmente consigam aqui estar, nos próximos milênios. 

A recuperação do sentido da existência está a exigir reaproximação (e respeito) da sociedade humana para com a natureza, seus potenciais e limites. No Diálogo Saúde e Ambiente, a professora Carolina Golçalvez reforça esta ideia defendendo, como metáfora, a essencialidade da Vitamina N (de Natureza) para recuperação da saúde física, mental e espiritual da humanidade.

Sua percepção é coerente com orientações filosóficas presentes em todas as religiões, conforme nos alertou o deputado ambientalista Jorge Brand/Goura, do PDT do Paraná. Para detalhes, assista sua manifestação na 61ª edição do programa Arte, Ciencia, Ética e Agroecologia.

Concluindo, vale estabelecer associação entre a máxima de Raquel Carson, “a obrigação de suportar nos dá o direito de saber”, à mensagem final do Relatório da Lancet: “Agora que sabemos, devemos agir”. 

A música da semana é o Xote Ecológico, composição de Aguinaldo Batista interpretada por Luiz Gonzaga.

 

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. 

Edição: Marcelo Ferreira