Rio Grande do Sul

ATENDIMENTO DEMORADO

Conselho cobra ações para redução das filas de espera para consultas especializadas

Tema foi debatido na audiência do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre realizado em 6 de julho

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Objetivo do encontro foi cobrar da gestão da SMS ações que efetivamente reduzam as filas de espera do Sistema de Regulação de Consultas Especializadas - Foto: CMS/POA

Durante a plenária do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre (CMS/POA), os conselheiros de Saúde trouxeram as dificuldades de acesso da população a consultas na Rede Especializada de Saúde da Capital. O objetivo do encontro realizado no dia 6 de julho foi cobrar da gestão da Secretara Municipal de Saude (SMS) ações que efetivamente reduzam as filas de espera do Sistema de Regulação de Consultas Especializadas (Gercon) do município.

Em maio deste ano, conforme aponta o CMS, a fila de espera total, que engloba especialidades médicas, odontológicas e outras especialidades como fisioterapia, nutrição e fonoaudiologia, era de 141.386 pessoas aguardando por atendimento especializado. A situação, que se agravou com os efeitos da pandemia, teve um acréscimo de 97% se comparado a 2020, quando a fila era de 72.459 pessoas. 


Foto: Reprodução

Entre o ranking das 20 piores situações estão as especialidades de fonoaudiologia pediátrica, as cirurgias vascular adulto, bariátrica e de pequeno porte, oftalmologia para glaucoma, ginecologia para ligadura tubária e neurocirurgia de coluna para adulto. Os dados levam em consideração os indicadores de fila de espera, conforme o PMS 2022/2025, que são oferta de consultas, demanda e tempo de resposta, que indicam a efetividade da agenda.


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A vice-coordenadora do CMS, Ana Paula de Lima, psicóloga da Rede Especializada e conselheira pela região Leste, defendeu a implantação de Centros de Especialidades nos territórios para que possam atuar de forma articulada com a Atenção Básica. Para ela, isso evitaria o encaminhamento dos usuários para ambulatórios hospitalares, que devem ser para maior complexidade, de forma inversa ao que ocorre atualmente.

"Na Bom Jesus nós tínhamos cardiologista, neurologista, fisioterapeuta e várias especialidades e é isso que precisamos dentro dos territórios, Centro de Especialidades de base para trabalhar junto e articulado com a Atenção Básica", destacou Ana Paula, referindo-se ao fechamento dos Centros Especializados que existiam na cidade e que provocaram um retrocesso na oferta de serviços de Saúde.

A conselheira também fez referência ao projeto que previa, no mínimo, oito Centros de Especialidades e que deveriam constar no PMS 2022/2025, porem constam apenas quatro. Ela destacou a importância deles para a retaguarda da Atenção Básica, que trabalha no modelo de Saúde da Família.

“A gente precisa investir, já que terceirizaram a Atenção Básica, pelo menos nos Centros de Especialidades próprios para que se avance na qualidade assistencial e se diminua o número de pessoas com sequelas que estão perdendo sua funcionalidade por falta de atendimento ou pela demora”, alertou a conselheira de Saúde.

O que diz a SMS

Entre as ações propostas pela SMS para redução das filas a curto prazo estão equilibrar as ofertas regionalizadas, trabalhar na redução das faltas às consultas, que são os absenteímos, reuniões de avaliação com prestadores, possibilidade de remanejar consultas de especialidades com menos filas. A médio prazo a proposta é aumentar a oferta para as situações mais graves, realizar mutirões e ampliar a teleconsultoria. A longo prazo, está a previsão de aumentar a oferta via inclusão nos contratos com os prestadores de serviço e por chamamento público.

O secretário de Saúde, Fernando Ritter, disse que a SMS está estudando a situação das filas de espera e que não é uma tarefa fácil, referindo-se ao quantitativo de especialidades que estão em situação crítica e com alto número de pessoas aguardando. “Não é uma tarefa fácil, a gente está estudando cada uma das filas de espera e óbvio que a solução é a gente corrigir processos, melhorar a distribuição e é fundamental a gente ampliar a oferta”, disse.

Ritter também falou sobre recursos financeiros. “Nós vamos nos debruçar em cada situação e, a partir dai, ver qual é a necessidade, avaliar o custo e da onde vai se tirar o recurso. Não vamos conseguir resolver todos os problemas, nós vamos focar naqueles que são mais graves e priorizar, dentre todas as filas, aquelas que podem causar um dano maior ao paciente”, destacou. 

Trabalhadores relatam dificuldades

Para a Agente Comunitária de Saúde (ACS) Josiane Juliete Garcia, representante do Conselho Distrital de Saúde Humaitá Navegantes Ilhas, o problema do absenteísmo, apresentado pela gestão como dificuldade, poderia ser minimizado caso houvesse a busca ativa dos pacientes nas Unidades de Saúde. “Em relação ao absenteísmo, não temos Agentes Comunitários de Saúde suficientes, eu sou sozinha lá (US Navegantes). E como isso impacta essa fila? Não é feito busca ativa”, denunciou Josiane.

Outro ponto questionado por Josiane foi o “mutirão” que historicamente nunca resolveu de forma efetiva e sim paliativa o problema das filas. “Eu gostaria de falar para o senhor (secretário), é o seguinte, se o senhor está me falando que o mutirão resolve, é simples, em vez de fazer o mutirão, pode ofertar esses serviços fixos, porque daí a demanda vai baixar”, falou.

Quando o Gercon foi implantado, em 2016, a meta era diminuir o absenteísmo de 40% para menos de 10%, o que não aconteceu. Além da redução da fila total de solicitações em espera, que também não ocorreu.

Israel dos Santos, Agentes de Combate às Endemias (ACE) da região Glória Cruzeiro Cristal, falou sobre a distância e dificuldade financeira para o deslocamento até o destino das consultas especializadas. “Onde estão as pessoas que não conseguem ir até a Restinga? Estão na ponta da vulnerabilidade social e não tem a passagem para ir até Restinga”, desabafou. Santos também defendeu a necessidade dos Centro de Especialidades nos territórios e diz que o deslocamento seria muito mais fácil para as pessoas.

"Nós não temos tempo para ter tempo, as pessoas estão morrendo", denunciou Tiana Brum de Jesus, coordenadora do CMS e assistente social da Atenção Básica. Tiana destacou a diferença que seria para a população se a ESF estivesse com equipes completas e oferecendo apoio matricial e multiprofissional com ACS e vínculos de trabalho que fixem os profissionais nos territórios.

Além disso, a coordenadora fez uma crítica ao secretário Fernando Ritter, que falou que não estava na plenária para discutir vínculos de trabalho dos profissionais da Saúde. “Este Conselho está aqui sim para discutir vínculo das equipes e territórios. É o vínculo que cura e que salva. A gente não vai abrir mão dessa pauta. A gente sabe que desmontar a Atenção Básica resulta nisso que estamos vivendo na Saúde”, denunciou Tiana referindo-se a terceirização de praticamente 100% da Atenção Básica.

Deliberações

Os conselheiros de Saúde deliberaram que a SMS apresente um plano concreto em relação à regionalização das redes especializadas também com base nas propostas aprovadas na 9ª Conferência de Saúde de Porto Alegre. “Precisamos também ter uma previsão sobre o que vai ser cumprido das propostas deliberadas na Conferência”, falou Tiana.

Sobre o transporte público para que a população possa se deslocar até as consultas e atendimentos, a plenária votou pela oferta de transporte público e sanitário adequados que garantam o acesso às consultas de acordo com as equidades e determinantes sociais.

Em relação às especialidades de Saúde Mental e de atenção a Pessoas com Deficiência, o plenário deliberou que seja priorizada a análise das ofertas de consultas de saúde mental e das reabilitações física, auditiva e intelectual, sendo que a última deve ser reorganizada por faixa etária. Além de alterações no fluxo atual para que seja garantido acesso direto pela Atenção Básica, com criação de uma agenda específica para Transtorno de Espectro Autista, separando da reabilitação intelectual e unificando o acesso ao Centro de Referência do Transtorno Autista (CERTA).
 
Na reunião, Tiana falou também sobre o caso da usuária da região Norte, Valéria Pereira Moreira, que faleceu no dia 2 de julho, no Pronto Atendimento Bom Jesus. Tiana pediu que o caso seja investigado como Sentinela, o que foi aprovado pelo plenário.

* Com informações do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre


Edição: Marcelo Ferreira