Rio Grande do Sul

Coluna

A coragem é a chave da mudança

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Por se constituir em esforço coletivo de leitura, decodificação e construção de interpretações da realidade, o Brasil de Fato recebeu justa homenagem da Assembleia Legislativa" - Foto: Joaquim Moura/Alergs
A batalha da comunicação definirá o que leremos no futuro sobre estes tempos

Voltando de férias, vou arriscar um excesso de liberdade no texto de hoje.

Confesso assim que estou feliz pelas férias, pelas lições do João Pedro Stédile, na CPI do MST, pelo reconhecimento e premiação legislativa ao jornal Brasil de Fato, no RS, mas também (e não é pouco) por este cheiro de merda no ventilador, que vem da CPMI e que ameaça acordar boa parte da zumbilândia.

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São muitos temas, mas em todos vale o registro e algum link para acesso a avaliações mais amplas.

De começo, vejamos o coronel Cid, o filho. Desviado de roteiro familiar onde a trote disciplinado alcançaria o generalato, acabou na cadeia. Orientado pelo general Cid, o pai, aceitou a função de capanga sem tino, capacho de família disposta a roubar desde joias e cinzeiros até moedas do laguinho das carpas, e ali está.

Flagrado e abandonado, agora precisa confessar aquilo que não é mais possível esconder.  Pode estar se imaginando como criança em confessionário de igreja: conta o que fez, reza uns salmos e estará perdoado. Quem sabe até acredite que alguém enxergue nisso uma espécie de punição moral, com extensão para outros militares da família e da vizinhança.

Mas não é assim. Pessoas que se propuseram ao papel que os Cid e tantos outros assumiram, não ligam a mínima para este papo de moralidades. E a sociedade precisa transformar a punição dos crimes deste bando em ação pedagógica, que desestimule a outros da tentação de fazer coisas parecidas.

Afinal, a nação foi desmoralizada. Até os relojoeiros que compraram as joias roubadas, ou que recusaram aquela palmeirinha “sem valor”, agora sabem que ali estão símbolos de nossa vergonha. Qual o preço da singularidade incorporada às coisicas que o inominável transformou em símbolos da desmoralização de um país com a importância geopolítica do Brasil? Num universo onde a moral não existe, a ausência de punições exemplares tende a transformar em joias raras até os móveis, talheres e pratos surrupiados ao Planalto.

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Enfim, o Cid filho está em cana pelo papel miúdo de auxiliar em crimes cometidos por alguém cuspido fora, por podre, daquele mesmo exército a que sua família devotou gerações. Neste sentido fica claro que o inominável desmontou pelo menos uma dinastia. Talvez mais de uma, considerando que um almirante fez papel de mula, a aeronáutica transportava cocaína e o 8 de janeiro ainda tem muito a revelar.

Para todos eles com certeza vale aquela frase do Hemingway sobre “Quem estará nas trincheiras ao teu lado?  (‐ E isso importa?)  ‐ Mais do que a própria guerra”.

Estes acontecimentos nos colocam diante da grandeza, da clareza, das lições de serenidade e da qualificação moral oferecidas ao Brasil pelo João Pedro Stédile, na CPI do MST. Foram tantos os exemplos neste campo, que não se para de sorrir, quando algo ou alguém nos lembra dos vários melhores momentos daquele dia memorável.

Se aplica na assimetria destes casos até mesmo a frase da ex-ministra da goiaba (aquela que insiste em ajudar no golpe contra a democracia), no momento em que se dedicava a ameaçar o hacker de Araraquara, na outra CPMI. “A justiça não é dos homens, é de Deus”. Ok, mas e o “aqui se faz, aqui se paga”, perdeu validade e fundamento? Creio que não. Até porque o hacker de Araraquara, assim como Cid, o filho, não entraram em cena apenas por sorteio divino.

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O Delgatti foi escalado pela companheira Zambelli, com Z de Zebra, com Z de zumbi, para ajudar a desmoralizar as urnas e a fraudar a democracia. Escolhido exatamente porque com ele haveria negócio, porque ele se entenderia bem com criminosos do alto comando, na linha do “se fez com ele vai fazer comigo”. Seria tão somente mais um da rede, a fechar o nariz e cumprir script pré-determinado. Aliás, e este ponto é o crucial: como eles, o marreco e o inominável, embora em algum degrau acima, também são peões de um jogo maior. Pessoas sem luzes, ocupando espaços para os quais foram selecionados por critérios de mesquinharia, oportunismo e imoralidade, a serviço de gestores que, na sombra, mexem os cordões.

Que jogo?

Veja no Jornal Brasil de Fato.

Ali esta história vem sendo desenhada passo a passo, pista a pista, há 20 anos.

Por esta razão, por se constituir em esforço coletivo de leitura, decodificação e construção de interpretações da realidade, o Jornal Brasil de Fato recebeu, em 17 de agosto, justa homenagem da Assembleia Legislativa gaúcha.

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Vale refletir. Neste momento em que avançam mecanismos de controle e alienação social, instrumentos de comunicação popular, como o JBdF, se revelam oportunidade para mobilização e construção de emancipação e cidadania, em oposição ao universo sob controle das grandes mídias. A batalha da comunicação que aí se desenha definirá o que leremos no futuro, sobre estes tempos e as pessoas essenciais para a construção de nossa história.

Uma coisa sabemos, e Stédile tem nos mostrado isso: a coragem é a chave da mudança.

Música do Zé Martins: Jornalismo de verdade

#Ficaadica!

Assista o Programa Arte, Ciência e Ética num Brasil de Fato com o jornalista do O Joio e O Trigo João Peres.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko