Rio Grande do Sul

Lilás/roxo

Artigo | A gosto de todas as manas

O mês de agosto (rosa/lilás) chega e tempera a luta das mulheres brasileiras!

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Instrutores de Jiu-jitsu orientam sobre como se defender das práticas mais comuns de agressões físicas às mulheres - Foto: Patrulha Ronda Maria da Penha Parintins

Os princípios masculino e feminino – antes polos complementares da mesma unidade – foram separados e colocados em ângulos opostos e antagônicos. Enalteceu-se o Pai, negou-se a mãe e usou-se o nome de Deus para justificar e promover o código patriarcal, a subjugação e a exploração da Terra e das Mulheres. (FAUR, Mirella. 2015)

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O mês de agosto (rosa/lilás) chega e tempera a luta das mulheres brasileiras! Tempera a gosto o despertar feminino à autolibertação, à autonomia, à autodefesa, ao autocuidado e mais... Nas sociedades matrifocais, 20.000 a.C., denominavam-se os meses, conforme os diálogos daquelas comunidades com as energias da Lua Cheia.

Reconhecia-se agosto como Lua da Colheita, Lua da Cevada, Lua do Milho, Lua das Disputas ou Mês da Vegetação. Paralelamente cultuavam-se várias Deusas, destacando-se Hécate (Rainha da Noite, Senhora do Mundo Subterrâneo e Guardiã das Encruzilhadas) e Nêmesis (da Justa Punição). Com a imposição do patriarcado, a tradição e a simbologia foram silenciadas e esquecidas.

Apesar do massacre mercantilista/patriarcal sobre memórias matrifocais, o mês de agosto ainda conserva sutis fragmentos como anúncios/denúncias em defesa das brasileiras: Maria da Penha Maia Fernandes, mulher, farmacêutica, cearense é um dos fragmentos/testemunhos contra a crueldade por que passam mulheres silenciadas e invisibilizadas tanto nos espaços domésticos quanto nos espaços institucionais, quando suas “ferras” são produzidas no analfabetismo e no empobrecimento.

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Vale lembrar: Maria da Penha gritou, pediu socorro, durante 19 anos e 6 meses para que os ecos alcançassem os Poderes Constituídos. Por fim, aos 7 de agosto de 2016, os gritos da cearense materializam-se na Lei 11.340. Na verdade, é um brado que retumba há 17 anos sobre o céu da Mátria Brasileira; ainda assim, nem sempre ouvido e atendido com Justiça e Imparcialidade!


Mulheres se unem em treinamento de defesa pessoal orientado por instrutores de jiu-jitsu, em Parintins – AM / Foto: Patrulha Ronda Maria da Penha

E segue agosto de mãos dadas com as mulheres: em fortalecimento à Lei Maria da Penha, entrou em vigor o Agosto Lilás - Mês de Proteção às Mulheres, sob a Lei, 14.448/22, com objetivo de sensibilizar/conscientizar a população pelo fim da violência contra as mulheres. Vale lembrar: em 2019, a Câmara Legislativa de São Francisco de Pádua (RGS), havia aprovado o Projeto de Lei 0011/Mês da Conscientização pelo Fim da Violência contra as Mulheres, sob propósito de divulgar a Lei Maria da Penha, como também desenvolver a sensibilização masculina com relação à vida das mulheres.

A abordagem traz reflexões sobre a simbologia das cores: a cor rosa é padronizada ao universo feminino, associando-o à beleza, à suavidade, à pureza, à fragilidade, à delicadeza e etc. Já as cores lilás/roxo identificam-se à luta. Sobre esse propósito, em 1911, numa fábrica têxtil de Nova York, 146 mulheres e 13 homens lutavam por jornadas dignas de trabalho e morreram queimados. Naquele momento, produziam lycra lilás - razão do lilás e roxo simbolizarem a luta das mulheres. Rosa e lilás são apenas simbologias, no entanto, a lógica patriarcal impõe às mulheres a cor rosa... É vantajoso para esse sistema produzir mulheres suaves, puras, frágeis, delicadas... ao contrário de mulheres lilases ou roxas: são autoconscientes, autônomas, destemidas e livres.

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Independentemente das figurações, o mês de agosto tem sido importantíssimo para toda a sociedade brasileira, no sentido do combate à violência estrutural e no desenvolvimento de valores dialógicos e de respeito às diversidades; enfim, oportunidade de se praticizar o Artigo 5º da Constituição Federal Brasileira em sua totalidade. Entre as brechas e brados que se impõem ao machismo estruturante, a Polícia Militar do Amazonas, 11º BPM, em consonância com a iniciativa nacional, Agosto Lilás, inaugura em Parintins/Amazonas a Ronda Maria da Penha, oferecendo às mulheres policiamento de excelência, fundamentado em servir, acompanhar e proteger: Violência contra a mulher, não tem desculpa. Tem Lei! Uma vida sem violência é direito das mulheres!  

O desafio ao 11º BPM é grande! Os padrões e patrões da violência se impõem há milênios e continuam determinando o atual sistema: patriarcal, machista, classista, excludente... A princípio e em princípio, atingem categorias vulnerabilizadas, desvalidas: as fêmeas indistintamente, LGBTQI+, grupos empobrecidos sem escolaridade, marginalizados e etc. Impossível não referendar a Mãe Terra - a fêmea mais violentada universalmente!

Gritos por socorro em seu nome são abafados nas artimanhas do sistema explorador. Na sabedoria do Nazareno, remendo novo em pano velho exige de seus protagonistas muita estratégia, empenho, amorosidade e, acima de tudo, empoderamento. Não é fácil, mas a determinação, a ética humana do 11º BPM, encontra respaldo na profecia do Educador Paulo Freire: A História como tempo de possibilidade pressupõe a capacidade do ser humano de observar, de conhecer, de comparar, de avaliar, de decidir, de romper, de ser responsável. De ser ético e de transgredir a própria ética. O futuro é dos Povos e não dos Impérios. (2002, p. 78)

Do que foi possível compartilhar, referendamos os apoios institucionais, ao mesmo tempo clamamos urgentemente por educação libertadora pontuando questões de gênero, de respeito às diversidades, ao meio ambiente - nossa Casa Comum. Ainda, casa de partos com orientações sobre controle da natalidade e combate à violência obstétrica. Outro clamor bem a gosto das manas: a efetivação do Projeto de Lei 6215/2016, já aprovado, em 13 de maio/2021, na Comissão de Direitos da Mulher na Câmara Federal que declara o 8 de Março - Dia Internacional das Mulheres-, Feriado Nacional!

:: Campanha Agosto Lilás e os 16 anos da Lei Maria da Penha ::

Que as vozes e os ensaios ativistas das Manas Brasileiras ecoem Brasil à fora, sejam acolhidos coletivamente e transformados em temperos bem A GOSTO das mulheres e da sociedade carente de Justiça Social! São adubos para que sementes boas, livres de toxidades se desenvolvam e deem frutos universalmente saudáveis. Por fim, cultivemos as lições da Mãe Terra: mesmo ferida e machucada, continua florindo e dando bons frutos!

* Maria de Fátima Guedes Araújo. Caboca das terras baixas da Amazônia. Educadora popular, pesquisadora de saberes popular/tradicionais da Amazônia. Fundadora da Associação de Mulheres de Parintins, da Articulação Parintins Cidadã, da TEIA de Educação Ambiental e Interação em Agrofloresta. Militante da Marcha Mundial das Mulheres (MMM) e Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular e Saúde (ANEPS). Autora das obras, Ensaio de Rebeldia, Algemas Silenciadas, Vestígios de Curandage e Organizadora do Dicionário - Falares Cabocos.

* Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.


Edição: Katia Marko