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DESPEDIDA

Artigo | “Se quiser falar de amor"... falamos com quem agora?!

Mano Teko Mc comenta a vida e a carreira de Mc Marcinho, o "Príncipe do Funk", que morreu no último sábado

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
mc marcinho
Príncipe do Funk, Mc Marcinho morreu no último sábado (26), aos 45 anos de idade - Divulgação

"Se quiser falar de amor", falamos com quem agora? Esse verso é de um dos mais famosos Funk, de Marcio André Nepomuceno Garcia, o MC Marcinho! No último sábado (26) foi anunciado oficialmente pela família o seu falecimento. Marcinho, um dos maiores nomes do movimento funk nacional, surgiu na década de noventa, momento de maior pluralidade do gênero. Ainda sem as muitas subdivisões de hoje (funk consciente, funk proibidão, funk putaria...), os bailes eram marcados pela violência entre galeras rivais, baile de corredor!

Mc's surgiram aos montes representando suas galeras. Cidinho e Doca da Cidade de Deus, William e Duda do Borel, Garrincha e Julinho de Santa Cruz, eu e meu parceiro Buzunga no Irajá, entre vários outros nomes. Quase sempre pedindo "Paz nos Bailes" ou cantando sobre
problema social.

O Volt Mix, batida instrumental clássica da época, também serviu de base para um timbre de voz diferenciada, mas dessa vez para os versos românticos do Mc vindo de Caxias, na Baixada Fluminense, com o "Rap do Solitário".

Ainda que naquele período o entendimento era um só Funk. Ele, junto a Claudinho e Buchecha, são pra mim os maiores nomes que “furaram a bolha”, responsáveis por consolidar a ramificação\linguagem Funk Melody, um funk que saiu do beat cru, cada vez mais preocupado com a melodia, com a poesia, buscou melhores produções musicais, ampliando público, ampliando visão profissional do Movimento.

Falar hoje sobre letras românticas, que tanta gente diz sentir saudade, parece que foram só flores, né?! Muito pelo contrário! A criminalização ao Movimento, que hoje alguns dizem ser pelas letras de sexo explícito, letras que exaltam facções ou relatam a violência, cai por terra facilmente quando indagamos qualquer um da geração de noventa ou anterior como era o tratamento recebido do Estado, mídia ou sociedade.

Alguns romantizam e buscam serem “aceitos\tolerados”, renegando a própria história. De fato, eu não lembro do Marcinho se posicionando abertamente sobre essas questões, tanto de fora, quanto nas internas do Funk. Longe das exigências de uma dita militância, Marcinho foi Prática incansável! Foco total na Música! Lançou dupla romântica com a Mc Cacau, única mulher da nossa geração em atividade. Também gravou com outras mulheres, ampliando a visão sobre as minas em um meio dominado pelos homens.

Com seu sucesso desbravou muitos caminhos e fez questão de dividir com os seus cada informação obtida. Se para muitos Mcs no início era onda estar em cima do palco, não mais pagando entrada do baile, depois de duas, três apresentações serem reconhecidos era o suficiente. Ele chegou pra estes (me incluo):

“E aí, sabe quanto está seu cachê? O Escritório do seu empresário está bonitão, hein?!”, dizia, alertando aos demais que a brincadeira ficou séria e tinha alguém ganhando com isso. "E não são vocês!".

Depois de certo tempo, envolveu sua família para gerenciar sua carreira, tendo à frente seu irmão Mauro. Foi ele quem cuidou de tudo até seus últimos dias. Organizava seu futebol com churrasco em Bangu, na zona oeste do Rio, buscando não perder contato com seus antigos amigos. 

O tempo passou, muitas questões seguem sendo tabus no funk. Mas o cara tendo a música funk como bandeira, seguiu firme! Por vezes com letras mais voltadas pra dança, pra obter diálogo com outras gerações, mas perceptível sempre o cuidado nas palavras.

Recentemente lançou alguns feat´s (participações) com Babu Santana, Thiago Martins, Lourena, Preta Gil, Delacruz entre outros, que me lembraram mais do seu início de carreira.

Marcinho, nosso eterno "Príncipe do Funk", nos deixa muito cedo. Alertado pela jornalista Isabela Reis (@bela_reis) em um post no Twitter, esse irmão se junta a Catra (49), Sapão (40), pra citar só alguns que furaram a bolha, que morreram antes de completar 50 anos.

Sendo do Funk, já observava como os nossos têm partido, uma geração que rendeu muito dinheiro, tendo que fazer vaquinha nos últimos momentos de vida sem muito o que salvar e para enterro. Lembro com carinho da primeira vez que tive com esse cara, divisão de quarto numa viagem para Minas Gerais. Os mais acelerados com os mais acelerados. Eu e ele, mais tranquilos, acabamos caindo no mesmo quarto. É aí onde se conhece mais a pessoa, não só o artista. Pelo menos tirei dali um rascunho, que se confirmou com o passar dos anos.

O artista é incrível! Rompeu barreiras! E a pessoa, idem!!! Seguirá vivão em nossos corações. De zero a dez, Marcinho é mil!

* Mano Teko Mc
Proceder/ Sarau Divergente

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Eduardo Miranda