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As aparências enganam e você só aparenta?

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A “segurança” dos 100 metros foi imposta a todos os pés de milho cultivados no Brasil
A “segurança” dos 100 metros foi imposta a todos os pés de milho cultivados no Brasil - Cleverson Beje | FAEP
Praticamente não há mais milho não transgênico em nosso país

As pessoas se revelam em suas atitudes.

Afinal, o que seriam “o jeito, as convicções e o estilo” de cada um/a, se não um modo de ser ou ao menos uma tentativa de “se mostrar”, de “se colocar diante do mundo”?

Aparentemente passamos a vida ajustando nossos comportamentos em resposta ao acúmulo ponderado de tentativas, experiências, frustrações, castigos e recompensas. E talvez isso se consolide em compromissos de caráter que permitiriam, aos demais, saber o que esperar de nós: uma certa previsibilidade no padrão de respostas às provocações do mundo.

Mas como interpretar aquelas circunstâncias onde decisões claramente sem sentido são tomadas em grupo, por pessoas de quem não se esperaria tal comportamento?

O que pensar, por exemplo, daquelas situações onde não uma, mas várias pessoas se associam para sustentar algo que todos percebem como o claro oposto do óbvio?

Nestas ocasiões caberia acreditar em enganos coletivos? Desvios formatados pela agregação de pessoas que em determinado momento se permitem alienação de compromissos e honestidades intelectuais? Talvez? Pelo menos, se assim fosse, teríamos maior facilidade para lidar com amigos e parentes golpistas. Mas, mesmo assim, não seria relevante tentar entender o mecanismo que os iludiu, ao menos para evitar recorrências?

Vejam como exemplo a decisão de doutores reconhecidos pela consistência de seu saber, a respeito de uma condição biofísica simples: o caso do deslocamento natural de grãos de pólen entre plantas milho. As perguntas seriam: qual o peso e as possibilidades de deslocamento de um grão de pólen? A importância estaria no fato de que milhões de agricultores não plantam e, portanto, não querem colher milho transgênico contendo, digamos, toxinas inseticidas.

Para garantir respeito ao trabalho e aos interesses daqueles milhões de agricultores, atendendo ao mesmo tempo o direito de milhares de outros, interessados em plantar e colher milho transgênico, cientistas membros da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) estabeleceram normas técnicas que deveriam permitir a “convivência” dos dois tipos de lavoura. Examinando estudos majoritariamente fornecidos pelas empresas produtoras de milho transgênico, concluíram que um grão de pólen transgênico não deveria ir além de 100 metros de distância do pé de milho onde foi gerado. E o vento? E os insetos? Bobagens.

A “segurança” dos 100 metros foi imposta a todos os pés de milho cultivados no Brasil. Como resultado, praticamente não há mais milho não transgênico em nosso país. Aquela norma, e outras igualmente ou até mais escandalosas, não foram e aparentemente não serão revisadas. Até quando?

Sei lá. Mas com esta pergunta, voltamos à questão inicial. O que poderia levar cientistas renomados, escolhidos a dedo para garantia de controle do fluxo gênico indevido e outros aspectos de biossegurança relacionados a Organismos Geneticamente Modificados, a tomarem aquela atitude? Acreditariam honestamente na decisão e mantém as convicções originais, mesmo diante da realidade factual, consensual de sua inutilidade? Ou simplesmente não dão a mínima?

Na mesma linha de pensamento, o que teria levado a maioria dos membros do STF a assegurarem manutenção e validade à totalidade das decisões daquela comissão, mesmo diante de argumentos consistentes de seus próprios pares?

Talvez a nossa indiferença?

Isso tudo prospera porque aceitamos bem uma vida de mentiras?

Elas nos alimentam?

O que devemos pensar, neste caso, de nós mesmos?

Uma música triste?

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko