Rio Grande do Sul

DOAR SALVA VIDAS

Como lidar com familiares de doadores é tema de formação para profissionais da saúde

Encontro em Porto Alegre terá a participação da enfermeira Carmen Segovia, da Espanha, país líder em doações no mundo

Brasil de Fato | Porto Alegre |
1º Encontro dos Entrevistadores no Processo de Doação e Transplantes do RS reúne profissionais que já realizam o trabalho em diferentes hospitais do estado - Foto: Divulgação

O 1º Encontro dos Entrevistadores no Processo de Doação e Transplantes do Rio Grande do Sul ocorre neste sábado (2), das 9h às 17h, na Fundação Ecarta, em Porto Alegre. A atividade integra as atividades do Setembro Verde, alusivo a doação de órgãos, e vai abordar temas como comunicação de más notícias, importância do acolhimento familiar e como reverter a não autorização familiar.

Entre as palestrantes está a enfermeira e ex-coordenadora da Organização Nacional de Transplantes da Espanha (ONT) Carmen Segovia. Também participam as enfermeiras Neide Knihs, doutora em Ciências da Saúde e professora adjunta da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e Aline Pavei, pós-graduada em Enfermagem em doação e transplante de órgãos e Tecidos e enfermeira da Organização de Procura de Órgãos do Hospital Santa Isabel de Blumenau (SC).

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“Possibilitar que as equipes de profissionais que têm o papel de dialogar com as famílias possam trocar experiências, falar dos desafios de exercer este papel, criar um espaço de escuta é o objetivo central do encontro”, informa a coordenadora do projeto Cultura Doadora, Glaci Salusse Borges. A formação é presencial para 45 profissionais que já realizam esse trabalho em diferentes hospitais do estado com os palestrantes online. 

No Brasil, mais de 40% dos familiares de pacientes com morte encefálica não autoriza a doação de órgãos, mesmo com mais de 60 mil aguardando por transplante, sendo cerca de três mil no RS. Ampliar as autorizações das famílias é um dos grandes desafios para potencializar a doação.

Só podem doar múltiplos órgãos pacientes com morte encefálica, o que representa menos de 2% do total de óbitos. Um doador pode salvar até dez vidas.

Palestrante da Espanha, país que mais doa no mundo

“E não é culpa das famílias”, assegura a principal convidada da formação, Carmen Segovia. Conforme pontua a enfermeira espanhola, é fundamental humanizar a relação e a comunicação terapêutica.

“O principal objetivo não é obter a doação. É ajudar a família em luto, acolhê-la e respeitá-la. Trata-se de um tripé muito importante nessa relação: respeito, empatia e autenticidade. Quando crio esse vínculo, estou ajudando a família que inicia o luto. E, de maneira adequada, ofereço a possibilidade da doação”, destaca. “O problema está nos profissionais da saúde, que precisam aprender como transmitir as más notícias”, declarou em entrevista em uma das vezes que esteve no Brasil.


Carmen Segovia [e reconhecida pelo trabalho que asseguram à Espanha a posição de líder mundial em doadores de órgãos. / Foto: Divulgação

Para a especialista, que dará a formação online juntamente com as enfermeiras Neide Knihs e Aline Pavei, “a doação é o direito que temos de sermos generosos após a morte".

Carmen Segovia se notabilizou pelos resultados em seu país, reduzindo de 30 para 15% a não doação. A enfermeira assessora o cineasta Pedro Almodóvar, que a contratou para ser consultora em três filmes consagrados: “Tudo sobre minha mãe”, “Fale com ela” e “A flor do meu segredo”.

A Espanha é o país com maior número de doadores de órgãos do mundo em relação à quantidade de transplantes por milhão de habitantes, seguido por Bélgica, Malta, França, República Tcheca, Finlândia e Noruega.

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Santa Catarina e Paraná seguem o modelo espanhol e são os dois estados brasileiros com o maior índice de doadores. “A qualidade dessa abordagem de forma empática, sensível é a chave para transformar esse momento de dor em uma possibilidade de salvar muitas vidas”, confirma o coordenador da Central de Transplantes de Santa Catarina, Joel de Andrade, estado com a menor negativa, ficando na média de 25%.

Nos últimos anos, o estado vizinho tem enviado muitos órgãos captados para transplante ao RS, estado que já esteve em primeiro lugar em doações de órgãos até 2005 e agora ocupa a oitava posição.

Lista cresce e pacientes morrem aguardando

Todos os dias pacientes morrem na espera por uma doação. Só no primeiro trimestre deste ano faleceram 491 pacientes que aguardavam por um órgão no país, sendo 46 do RS, enquanto ingressaram em lista quase 10 mil pessoas.

A pandemia da covid-19 fez despencar o crescimento em doações verificado em 2019. Critérios ainda mais rígidos após o período, reduzem o potencial dos doadores. Conforme diretrizes do SUS, pessoas com diagnóstico de covid-19 com menos de 28 dias da regressão completa dos sintomas não podem doar.

A atividade é promovida pelo projeto Cultura Doadora da Fundação Ecarta e pela Organização de Procura de Órgãos, OPO1 da Santa Casa de Porto Alegre e dirigida a 45 profissionais da saúde que atuam nas Organizações de Procura de Órgãos (OPOs), Comissões Intra-hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes (Cihdotts), Emergências e UTIs.A Fundação Ecarta mantém o projeto educacional Cultura Doadora há 10 anos.

A iniciativa é voltada a estimular a doação de órgãos, identificar os empecilhos e contribuir para o aprimoramento dos profissionais e serviços públicos envolvidos no processo entre a doação e o transplante. Já realizou cerca de 500 atividades no período, entre palestras, painéis, formações, reuniões, entre outras ações.


Edição: Marcelo Ferreira