Rio Grande do Sul

HOSPITAIS EM RISCO

Secretária da Saúde do RS não comparece em audiência que debateu programa Assistir

Lideranças de municípios que sofrem com redução nas verbas de saúde apontam possível colapso do sistema de Saúde

Brasil de Fato | Porto Alegre |
“A secretária foi convidada, sugeriu as datas e nós nos adaptamos a elas. Infelizmente este respeito recíproco não apareceu e isso é grave", criticou o deputado Miguel Rossetto - Foto: Paulo Garcia / Agência ALRS

O Programa Assistir, lançado em 2021 pelo governo Eduardo Leite (PSDB) e que redistribui recursos aos hospitais que prestam serviço pelo Serviço Único de Saúde (SUS) em todo o RS, foi tema de audiência pública na Assembleia Legislativa do RS, nesta segunda-feira (4). A secretária da Saúde, Arita Bergmann, havia confirmado presença mas desistiu da participação, horas antes do início da audiência, frustrando os prefeitos, vereadores e gestores de hospitais, que estão preocupados com um possível colapso do sistema de Saúde em diferentes municípios.

A audiência foi realizada na Comissão de Saúde, proposta pelos deputados Miguel Rossetto (PT), Adão Pretto Filho (PT) e Neri, o Carteiro (PSDB). Justificando a atividade está a promessa do Programa Assistir de proporcionar acréscimo de recursos em 162 dos 218 hospitais que recebem incentivos. Contudo, o Assistir promoveu cortes orçamentários que levaram os hospitais a um quadro caótico.

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Como exemplo, o Hospital de Canoas recebia R$ 49 milhões por ano e vai receber somente R$ 6 milhões do governo do estado; o Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre (HPS) recebia R$ 35 milhões e passará a receber R$ 10 milhões; o Hospital Restinga e Extremo Sul perderá quase R$ 10 milhões dos R$ 13 milhões que recebe; o Hospital Materno Infantil Presidente Vargas perderá 50% dos recursos estaduais, caindo de R$ 10 milhões para R$ 5 milhões.

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O município de Montenegro já fechou a traumatologia; Viamão, fechou a maternidade, o setor de saúde mental, a obstetrícia e a traumatologia; Taquara fechou a maternidade. Além da população ficar desassistida, os cortes de recursos na Saúde acabaram sobrecarregando o atendimento no SUS.

Ausência da secretária é criticada

O deputado Miguel Rossetto lamentou a ausência da secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, que pela terceira vez acertou a presença e não compareceu. “A secretária foi convidada, sugeriu as datas e nós nos adaptamos a elas. Infelizmente este respeito recíproco não apareceu e isso é grave”, criticou. Segundo ele, a audiência, dá continuidade a outra realizada em 7 de agosto, na qual a secretária também não esteve presente.

Pepe Vargas lembrou que, na audiência antrior, a secretária não pode participar porque, segundo ela, estaria em uma reunião para justamente discutir o Assistir. De lá para cá, ressalta, a situação dos hospitais ficou ainda mais dramática. Não fosse a PEC da transição, observou, seriam R$ 59 bilhões a menos no orçamento da Saúde. pepe chamou a atenção ainda para o fato de que o estado não cumpre a Lei Complementar que determina que invista 12% da receita corrente líquida em saúde.

“Situação muito difícil”

Para Miguel Rossetto, o decreto que instituiu o Assistir estabeleceu duas questões: primeiro a manutenção de um calendário de adequação dos recursos estaduais à rede hospitalar gaúcha assistida por este programa, que estabelece uma continuidade da redução de recursos para hospitais desassistidos. O segundo tema é a constituição de um Grupo de Trabalho técnico para avaliar os resultados obtidos pelo Assistir.

Rossetto lembrou que a Assembleia está entrando no debate orçamentário para 2024, oportunidade para qualificar esse atendimento para o RS. “Se compararmos os orçamentos executados com variação do IPCA, verificaremos que há uma diferença de orçamento real na ordem de quase R$ 500 milhões. Ou seja, se pegarmos como referência o que o estado executou em 2014 e o que está executando em 2023, verificaremos uma defasagem de quase R$ 500 milhões”, afirmou. O deputado disse ainda que considerando os aumentos dos custos hospitalares o déficit chega a R$ 2,3 bilhões.

Pretto cobrou a responsabilidade das autoridades do Executivo. “O que está nas mãos do governador é o sangue da população gaúcha”, denunciou. “Eu escutei de alguns prefeitos, que só não estão aqui hoje porque são da base do governo, que eles também estão extremamente descontentes com a situação. Eu me somo aqui aos diretores dos hospitais, que estão numa situação muito difícil, com as instituições. Nós vamos pressionar o governo, de maneira muito responsável, para rever o Programa Assistir”.

Na avaliação da deputada Stela Farias, o programa não é transparente e tem critérios subjetivos, além de ter retirado recursos de hospitais da região Metropolitana que atendem média e alta complexidade e cobre quase 40% do total da população gaúcha. "Os prefeitos não foram ouvidos. O Assistir não deu certo, ele piorou e retirou o atendimento”, afirmou.

Posição da Secretaria da Saúde

A diretora técnica da Secretaria Estadual de Saúde, Lisiane Fagundes, apresentou dados técnicos para justificar os pontos levantados. Argumentou que a mudança nos repasses foi motivada pela falta de transparência na forma de distribuição de recursos, ausência de critérios técnicos para a definição de incentivos, dificuldade de monitoramento da aplicação do recurso aportado, falta de equidade na distribuição de recursos e hospitais incentivados com a entrega de serviços aquém da remuneração.

Segundo ela, 48,54% dos recursos estaduais eram repassados a 7,66% dos hospitais que atendem o SUS. “Temos hoje 301 hospitais. Os recursos estavam alocados em 21 hospitais, muitos da região Metropolitana (de Porto Alegre)”. A metodologia do Assistir, segundo a diretora, está embasada no “tipo de serviço, na unidade de incentivo hospitalar, no peso e na unidade de referência”, o que permitiria a atualização a qualquer momento.

Prefeitos cobram auditoria e diálogo

O prefeito de Canoas, Jairo Jorge (PSD), lembrou que até 2009 os gestores municipais da região Metropolitana compravam ambulâncias e mandavam os pacientes para Porto Alegre. Somente depois que o então governador Tarso Genro e o secretário da Saúde, Ciro Simoni, criaram uma rede de proteção na região, abriram leitos, com transparência e com compromisso de uma política de Estado, o problema se resolveu.

Jairo Jorge questionou o corte orçamentário que segundo ele vai fechar o Hospital Universitário e o Hospital de Pronto-Socorro de Canoas. O prefeito de Canoas cobrou auditoria nos números do Programa Assistir.

O prefeito de Nova Santa Rita, Rodrigo Batistella (PT), contou que o município não possui estrutura própria de Saúde e é atendido por Porto Alegre e Montenegro. Desde 2021, segundo o prefeito, a Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre (Grampal) vem tentado discutir os critérios técnicos, as perdas e readequações do Programa Assistir. Para ele não foram considerados os contratos que já existiam.

Batistella pediu a suspensão da retirada de valores dos hospitais da região Metropolitana. O prefeito criticou a falta de diálogo com os representantes da Secretaria Estadual da Saúde.

Qualificação do serviço hospitalar

O deputado Miguel Rossetto, nos encaminhamentos da audiência pública, cobrou a constituição do Grupo de Trabalho para qualificar o sistema de saúde hospitalar na região Metropolitana, que já está previsto há mais de dois meses e não se efetivou. “Nós estamos aqui defendendo todos os instrumentos de qualificação de oferta de um sistema de serviço hospitalar para todo o povo gaúcho.”

Rossetto defendeu ainda que a Assembleia Legislativa não assine o Plano Plurianual, diante da redução dos recursos estaduais para o sistema hospitalar do Rio Grande do Sul. “Nós estamos falando em R$ 500 milhões/ano de recursos do estado do RS estão sendo retirados. Será que somente com a eficiência desses recursos reduzidos, nós atenderemos a demanda da população gaúcha?”, questionou.

* Com informações da Bancada do PT na ALRS


Edição: Marcelo Ferreira